Capítulo 2: A Revelação

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Acordar cedo nunca foi meu forte, mas é necessário. Como tenho super audição e sempre fui adiantada, levanto antes mesmo de ouvir o primeiro "beep-beep" do alarme no meu celular, que toca todos os dias às 05h45. Acendo a luz do quarto e começo a separar as roupas que vou usar após o banho. Pego um vestido preto que vai até a metade da coxa, um sutiã da mesma cor e uma calcinha vinho. Também separo meu perfume. Pego minha toalha lilás e entro no banheiro. Tiro meu pijama, todo amassado, e o coloco sobre a pia. Paro em frente ao espelho e observo meu corpo. Meus olhos logo se dirigem ao meu braço esquerdo, onde há a cicatriz do dia fatídico. Suspiro, um pouco frustrada, e vou para o chuveiro. Deixo a água cair sobre mim, fecho os olhos e me concentro nos sons ao meu redor.

Enquanto a água escorre pelo meu rosto, tento afastar os pensamentos sobre aquela tarde no laboratório. Às vezes, penso que, se eu não fosse sua filha, meu pai teria escolhido outra pessoa. Mas, em outras, sinto que ele não se importaria com quem fosse, desde que seus experimentos continuassem.

Saio do chuveiro já sentindo o familiar incômodo da cicatriz. Seco-me rapidamente e me visto, colocando perfume e botas favoritas. Enquanto ajeito o cabelo no espelho, percebo meu reflexo se transformar. Por um segundo, meu rosto não é o meu, mas o de uma garota desconhecida, pálida e sombria. Pisquei, e tudo voltou ao normal. Será que estou ficando paranoica?

Balanço a cabeça, espantando a ideia. Pego meu casaco de moletom e visto por cima do vestido. Ouço batidas na porta e o cheiro familiar da minha mãe invade o quarto. Sorrio antes de abrir a porta.

- Bom dia, mamãe! - falo, com um sorriso. Ela me observa de cima a baixo e sorri de volta.

- Bom dia, minha linda. Fiz café para evitar que você se atrase. Ah, hoje você está mais bonita que ontem! - Ela aperta minhas bochechas, e eu rio, corando.

- Mãe, para! - brinco, rindo um pouco, mas a verdade é que o carinho dela sempre me acalma.

Minha mãe é um poço de amor e fofura. Eu a chamo de "ursinha carinhosa". Ela diz que me dá tudo o que não pôde ter na infância, já que viveu em um orfanato até os 12 anos, quando foi adotada pela rica e caridosa família Monteiro. Eu já ouvi a história várias vezes, mas nunca canso de escutar como foi que Lincon e Soshi Monteiro a encontraram.

Descemos juntas para tomar café. A cozinha tem o cheiro familiar de café fresco e pão assado. Sento-me à mesa, enquanto minha mãe coloca meu prato na frente. O cheiro é irresistível, e eu sorrio para ela, grata por pequenos momentos como esse.

- Você vai sair à tarde com seu pai, né? - ela pergunta, casualmente.

- Vou, sim. Visita ao laboratório. - Tento não demonstrar muito, mas ela conhece meu tom de voz. Seu sorriso hesita por um segundo, e então ela coloca a mão sobre a minha.

- Vai ficar tudo bem. Você sabe que ele só quer o melhor para você, não sabe?

Aceno com a cabeça, mas algo dentro de mim sabe que essa "consulta" será mais do que uma simples verificação. Ele nunca deixa de me observar, me estudar, como se eu fosse um quebra-cabeça que ele ainda precisa resolver.

Após tomar o café, pego minha mochila, pronta para o dia. Quando estou prestes a sair, vejo meu pai descendo as escadas. Ele sorri para mim, e eu retribuo, com um sorriso mais fraco.

- Não vai nem me dar "bom dia"? - ele brinca, mas seu olhar é atento demais, avaliando cada movimento meu.

- Desculpe, pai! Achei que ainda estava dormindo. Vi que você chegou bem tarde ontem. - Ele se aproxima, beija minha testa e responde:

- Cheguei tarde, sim, mas sempre vou acordar para tomar café com as mulheres mais lindas do mundo! - Minha mãe sorri para ele e lhe dá um selinho rápido. Dou um sorriso forçado e caminho até a porta. Antes que eu saia, meu pai me chama novamente.

- Rolly, não se esqueça que vamos sair à tarde, ok? É importante. - Há um peso na última palavra, algo que ele não precisa explicar, mas que me faz engolir em seco.

Faço um gesto afirmativo com a cabeça e saio. O ar fresco da manhã bate no meu rosto, mas não consigo afastar a sensação de que estou sendo observada, mesmo aqui fora.

Depois de caminhar por 45 minutos, chego à universidade. À distância, vejo Mel, Thomás e George me esperando na entrada. O olhar de George, como sempre, é protetor demais. Sinto-me exposta, como se ele soubesse mais do que demonstra. Os três são meus amigos há mais de 5 anos, mas sempre que os vejo, há uma estranha energia no ar, como se estivessem esperando que eu revelasse algo que já sabem.

- Demorou hoje, hein? - diz George, se aproximando e me dando um beijo na testa, como faz todos os dias. Ele sempre me trata como se eu fosse uma boneca delicada.

- Ainda estou sem o carro - respondo.

- Devia ter me avisado, eu te buscaria - diz Mel, ajeitando o cabelo de Thomás. Eu rio, sabendo que os dois gostam um do outro, mas nunca admitem. Thomás, sempre calmo, apenas sorri para ela e olha para mim com aquela tranquilidade que sempre me conforta. Ele é como uma âncora.

O sinal toca, e me despeço deles, entrando no prédio do "Instituto de Psicologia". Sigo pelo corredor até a sala 106, mas há algo estranho. Um silêncio profundo, pesado.

- Rolly! - Ouço alguém me chamar em um sussurro. Olho para os lados, mas não vejo ninguém. Meu coração dispara. Meus sentidos aguçados não costumam falhar.

Dou mais alguns passos, e a voz chama de novo, dessa vez mais próxima. Respiro fundo, tentando manter a calma.

- Quem é? - pergunto, mas a única resposta é o som abafado dos passos dos outros alunos ao longe.

Quando entro na sala, sento-me no fundo, perto da porta. Pego meu caderno e folheio até uma página em branco. Olho para a professora, que já está diante do quadro. Ela sorri para mim, e eu devolvo um sorriso rápido, mas, ao olhar para o caderno de novo, vejo algo escrito que antes não estava lá:

"Eu sei o seu segredo, e ele está seguro comigo!"

Meu coração bate forte. Olho rapidamente para o quadro, depois de volta para a página. As palavras desapareceram. Respiro fundo, passo as mãos no rosto, tentando me acalmar.

Será que eu só estou cansada?

A Outra Face De Um ImortalOnde histórias criam vida. Descubra agora