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A manhã cheirava a pão na chapa. E como todos os dias, acordei com um delicioso café da manhã na cama.

- Bom dia, mãe. – disse ao me despreguiçar.

- Bom dia, filha. – ela respondeu ao beijar minha testa. – Apresse-se ou vai se atrasar para o seu primeiro dia de trabalho. Que horas foi que você chegou ontem? Nem te escutei abrindo a porta.

- Hm.... – tentei recordar como havia chegado em casa e não consegui. – Eram umas duas horas da manhã mais ou menos. – menti.

Minha mãe acreditou em mim, nunca fui um tipo de garota que desse trabalho. Então não seria difícil mamãe acreditar em uma mentira boba como aquela.

Não precisava mentir, não fiz nada de errado. Mas eu não queria preocupar minha mãe com o acontecimento da noite anterior. Pessoas caídas no chão, tiros, morte. Até por que eu não sabia dizer se eu realmente vi aquilo, ou se eu imaginei ver. E também não sabia direito o que tinha acontecido e muito menos como eu tinha chegado em casa. Mas o importante é que cheguei, então nada mais importava.

Estava assustada, é claro. Já vi muitas coisas desse tipo acontecerem na televisão, mas na vida real foi a primeira vez. Poderia estar mais desesperada e traumatizada, mas acho que eu estava fora de mim demais para lembrar com exatidão o que aconteceu ou o que eu pensei ter acontecido. Então, eu estava bem. As imagens não estavam nítidas na minha cabeça.

E sem contar que eu sempre fui uma menina corajosa. Sei que essas coisas acontecem. Eu não precisava me desesperar. Só estava no lugar errado e na hora errada. A próxima vez era só eu me cuidar mais.

Em meio a todos os pensamentos eu terminei o meu café e vesti uma roupa para ir conhecer o meu emprego novo. A manhã de outono estava fria e tudo estava normal até o momento em que cheguei na cafeteria no centro de Paris. Eu apertava, distraída, o botão da cafeteira e observava o liquido preto que descia e se misturava com o leite na xícara em minhas mãos, quando de repente alguém chega de supetão.

- Quero um café expresso agora! – Me assustei e quase deixei a xícara cair ao escutar o tom esdruxulo do homem que acabara de chegar.

- Bom dia. Será que o senhor poderia se sentar? É que as garçonetes atendem na mesa. – disse, delicadamente.

- Não. Eu quero que o café seja entregue por você e que seja feito agora. – respondeu, grosseiro, misterioso, barbudo e lindo.

- Sim, senhor! Deseja mais alguma coisa? – Perguntei, assustada.

- Não!

Quando entreguei o café para o jovem rapaz, observei que ele não parava de me olhar. E enquanto tomava o café a única coisa que os penetrantes olhos dele miravam era o crucifixo no colo do meu seio.

Depois de tanto encarar o meu decote, percebi que ele se virou e foi embora sem dizer nada. Fiquei constrangida. Nunca vi alguém me olhar tão descaradamente. Sem contar que eu nem estava tão bonita. As olheiras de baixo dos meus olhos denunciavam a noite anterior.

Fiquei pensativa e virei para ligar a televisão antes de começar a preparar os outros pedidos. Estava meio distraída pensando nos olhos do rapaz quando escutei uma palavra que me chamou atenção.

- Um ataque repentino aconteceu ontem, domingo, por volta das onze horas da noite no centro de Paris, peço para todas as pessoas tomarem cuidado. Homens encapuzados deixaram três mortos de dois feridos perto de um pub bem movimentado da cidade. - disse o repórter na televisão.

- A polícia ainda não tem pistas sobre os suspeitos. Eles atiraram contra as pessoas que estavam passando na rua e fugiram. - continuou, em um alerta ainda maior.

- As autoridades ainda não descobriram o motivo dos homicídios, pois os bandidos não levaram nada de nenhuma das vítimas mortas... – desliguei a televisão.

Confesso que mesmo com toda a minha coragem, naquele momento me assustei um pouco, mas ao mesmo tempo fiquei aliviada, pois realmente eu não estava louca, realmente o que eu vi foi real. Eu não sabia que tinha presenciado uma carnificina. Poderia ter sido eu. Poderia estar morta agora. Mas graças ao meu bom Deus eu estava viva.

- Você não vai ter medo, Nicole. - pensei em vós alta. - Você sempre foi uma garota de muita coragem e fé. - completei ao segurar o meu crucifixo com força. - Obrigada meu Deus, por ter me livrado de uma morte repentina. - completei ao observar a borra de café.

A vigésima quinta lua (COMPLETO)Onde histórias criam vida. Descubra agora