Capítulo 6

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A segunda feira acordou cinzenta, quase parecia que o meu estado de espirito estava a adivinhar o tempo... Pouco descansei de noite, os gémeos pareciam ter sentido o que se tinha passado pois apesar de ontem terem capotado acordaram várias vezes de noite a chamar pelo pai. Levanto-me com alguma dificuldade, doi-me o corpo e a cabeça, mas tenho que me despachar pois daqui a menos de 1 hora tenho aqui a técnica da segurança social por causa da guarda dos gémeos. Assim que estou a sair do chuveiro oiço as crianças a falar no quarto, ontem a Selina trouxe-me um berço que tinha guardado em casa e tenho o Diogo sozinho no berço e a Maria com a Mia na caminha da Mia. A Stelle está na cozinha a preparar o pequeno almoço para nós, entro e ela abraça-me.

- Como estás filha?

- Cansada Stelle. Quando não eram os meus pesadelos, eram os gémeos. Vou ligar para o hospital para ver como está o Rui.- disse. Liguei e segundo a enfermeira de serviço á UTI, ele passou bem a noite apesar de manter o mesmo quadro de ontem. 

Demos o pequeno almoço ás crianças e enquanto eu fui preparar e iniciar o banho deles a Stelle foi ao andar de cima buscar roupa para eles. Logo estavam de banho tomado e no parquinho a olhar para os desenhos animados que passam na televisão. Tocam á porta e quando abro estão lá o comandante do Rui, a técnica e o Jaques. Mandei-os entrar e sentar enquanto a Stelle faz  um café. Quem começa a falar é mesmo o Comandante do Rui.

- Dra Rita, temos muito a agradecer-lhe. Salvou a vida do Rui 2 vezes. Ainda se responsabiliza pelos seus filhos, poucas pessoas fariam tanto como a dra.

- Por favor Senhor, não tem de agradecer. Para além de ser o meu trabalho, nunca viraria as costas a um conterrâneo ou a 2 crianças.

- Os pequenos estão bem ambientados aqui.

- Sim, a minha filha dá-se muito bem com eles e a Stelle adoptou-os, a eles e ao Rui, tal como fez comigo e com a Mia.- digo, a Stelle entra nessa hora com os cafés. Depois dele agradecer a ela também, convida-a para se sentar connosco uma vez que ela me vai ajudar a cuidar deles enquanto aqui estiverem. 

A Técnica começa então a fazer-nos algumas perguntas acerca dos meninos, os seus hábitos, as comidas que gostam... Algumas das perguntas não lhe conseguimos responder uma vez que apenas temos os meninos á 1 semana e antes disso não os conheciamos. Depois de mais de 2 horas de perguntas paramos para eu e a Stelle podermos dar o lanchinho aos meninos. O Jaque esteve este tempo todo a brincar com eles e devo admitir que ele até tem jeito...

Quando a Técnica dá a entrevista por terminado vamos ao posto camarário para autenticar os papéis da guarda provisória. Após a saída deles damos o almoço aos meninos e aproveito a sesta deles para dar um salto ao hospital para ir ver o Rui. Ele continua em coma induzido mas mesmo assim eu sento-me e falo com ele. Dizem que os doentes em coma conseguem ouvir e por vezes reagir.

- Tens de reagir Rui, os teus meninos precisam de ti... Não imaginas o susto que me deste ontem... Aquela louca é que devia ter levado esses tiros. Hoje recebi visitas em casa... Não te preocupes, até te recuperares os teus tesouros estarão á minha guarda. Prometo que trato deles como da Mia. Quando saires da UTI eu trago-os. Até lá só tens de te recuperar, em breve estarás com os teus meninos. Agora preciso ir mas amanhã eu volto... A Stelle mandou um beijo.

Dei-lhe um beijo na bochecha e sai do quarto. Ali á porta sentei-me e mais uma vez chorei, chorei pelo que aconteceu com o Rui mas também porque me retratei... O que aconteceu ao Rui é o que me poderia ter acontecido a mim Se eu não tivesse conseguido fugir para aqui. Limpo as lágrimas, levanto-me e saio do hospital. Combinei com a Stelle fazer as compras mas vou buscá-la a ela e aos meninos e vamos todos, liguei a avisá-la e logo segui para casa. Quando lá cheguei ela já tem os meninos prontos para sairmos. 

- Stelle, o que achas de pararmos primeiro para comprar um carrinho para os gémeos? O Rui não tinha nenhum e andar com 2 gorduchos ao colo torna-se complicado...- claro que ela aceitou de caras. Parámos num centro comercial e entrámos. Aproveitei e comprei mais umas roupas para os 3, brinquedos, reforcei o stock de fraldas e toalhitas. Saimos dali cheias de sacos e depois de os guardarmos no carro seguimos para terminar as compras. 

Passa uma semana e eu tenho de voltar hoje ao trabalho... O Rui ja foi retirado do coma induzido mas continua sem acordar... Os gémeos estão cada vez mais ambientados connosco e estão inseparáveis da Mia, continuam a perguntar pelo pai e nós a dizer que está a viajar. Levanto-me cedo e depois de com a Stelle ajeita-los sigo para o trabalho.

Assim que entro na sala de reuniões todos vêm falar comigo sobre o que aconteceu e dar o seu apoio, acho que pensam que eu tenho algo com o Rui. Verificamos o 1414 e assim que terminamos somos chamados para a primeira ocorrência. Depois de 8 horas de trabalho duro sem paragem nem para almoçar e após um belo duche quente, finalmente saio da base e encaminho-me para o hospital. 8 dias desde que o Rui foi alvejado e continua nesta cama de hospital sem dar sinal de querer acordar. Depois de falar com ele na esperança de que ele me oiça e de falar com o médico dele saio do hospital, entro dentro do meu carro e deixo-me chorar. É tão triste vê-lo ali, sem reacção, sem poder aproveitar os seus filhos... Assusto-me quando me batem no vidro do carro, olho e vejo o Comandante do Rui. Abro a porta e saio.

- Boa tarde Dra, vai agora ver o Rui?

- Boa tarde Comandante, não. Venho de lá agora. Estive com ele e com o médico dele.

- Alguma novidade?

Passo-lhe os dados que me foram passados e logo me despeço dele, não sem antes ele reforçar que tudo o que eu precise para os meninos é só falar com ele pois ele e o restante pessoal da esquadra estão solidários connosco. Entro dentro do carro novamente mas desta vez sigo para casa, paro só na estação de serviço para colocar gasolina no carro e aproveito para levar uns machiatos caramelo para mais tarde, uns pirulitos para as crianças e uns café creme para a Stelle. Este sim é o meu vicio. Quando estou perto da porta oiço as gargalhadas das crianças e logo ai todos os problemas do dia desaparecem. Assim que abro a porta e eles me vêm a festa começa, aumenta logo a gritaria e até eu e a Stelle gargalhamos com eles. Depois de os deixar com os pirulitos sento-me com a Stelle para lhe contar como está o Rui. Logo somos interrompidos pela Mia e o Seu grito

- Mamã... Mamã... - olho para ela e as lágrimas logo me sobem aos olhos, é a primeira vez que ela me chama assim. Quando vou chegar junto a ela os gémeos repetem-na e logo eu choro com estes anjinhos e a sua sinfonia de mamã... Como se não bastasse logo a Mia se vira para a Stelle e grita de novo.- Nonna... - Com o coro de mamã e Nonna e eu e a Stelle a esbugalharmo-nos a chorar e a rir preparamos o jantar...

A Stelle já tinha deixado o jantar pronto e depois de dar o comer e banho aos meninos eles capotam na cama. Depois de ajudar a Stelle a limpar a cozinha sentamos na sala a falar.

- E então, como ele está?

- Na mesma Stelle... Custa muito vê-lo ali mas agora está com ele acordar, só espero que não demore.

- Estás a gostar dele não é filha?

- Não sei Stelle. Sei apenas que está a ser dificil vê-lo ali e não saber quando vai acordar. Dá-me um sentimento de quase perda, entendes?- respondo e mesmo sem querer as lágrimas começam a cair e a Stelle puxa a minha cabeça para o seu colo e eu permito-me desabafar.

Será que ela tem razão, eu estou a gostar dele? Será que ele sente o mesmo por mim? Com estes pensamentos adormeço ali mesmo, no colo daquela que considero minha mãe desde que aqui estou e que acredito que os meus anjinhos colocaram no meu caminho...

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