capítulo 1

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Inglaterra, 1814

 

─ Quero que me ensinem a flertar — pediu Dulce Saviñón , de dezoito anos, enquanto olhava pela janela de seus aposentos, na propriedade rural de seu tio Martin, o duque de Inverary.

Ao ouvir o riso das irmãs, afastou-se da janela e cami­nhou até elas, ambas acomodadas em confortáveis espreguiçadeiras.

Anahí, de vinte anos, marcava a letra "E" no sola­do de cada pé esquerdo dos pares de sapatos novos de Dulce, enquanto Maite, de dezenove, folheava o Times daquela manhã.

— O que há de engraçado em querer aprender a flertar?

— Por que está interessada nisso? — Anahi não desviou os olhos do que fazia.

—Tia Alma teve outra de suas visões paranormais. — Dulce calou-se por um instante, ao detectar incredulidade nos olhos das irmãs. — Segundo ela, parece que estou destinada a me casar com um conde e um prínci­pe, não necessariamente dois homens diferentes. Só quero estar preparada para conquistá-lo quando ele aparecer.

— E por que precisaria conquistar alguém com quem já está predestinada a se casar? — A pergunta de Maite era mais por brincadeira do que por ironia.

— Para compensar meus pontos fracos, como meus ca­belos ruivos, por exemplo.

— A cor deles combina perfeitamente com sua per­sonalidade. — Maite admirou a cabeleira farta da irmã caçula e sorriu.

— Gostaria tanto ter cabelos negros como os seus Mai, ou loiros como os de Anie. Ouvi dizer que os homens adoram as loiras.

— Pare de reclamar, Dulce. Você poderia ser careca.— O comentário de Samantha divertiu as irmãs.

— Já eu adoraria ter cabelos negros como os de Mai ou ruivos como os seus — Anie confessou, enquanto marcava o solado de outro sapato com a letra "E".

— E eu queria me parecer com uma de vocês duas, irmãzinhas — concluiu Maite.

— Parece que ninguém está mesmo satisfeito com o que tem. — Dulce sorriu, mas aquele lindo sorriso logo se desvaneceu. Quando tornou a falar, havia angústia em sua voz. — Não sei distinguir esquerda de direita, e nunca lerei o Times porque jamais consegui aprender a ler, escrever ou calcular. Se ao menos eu soubesse flertar, poderia encontrar um homem e casar-me com ele, antes que descobrisse que não passo de uma incapaz.

Ao perceber a maneira como as irmãs a encaravam, Dulce sentiu um calor subir-lhe às faces. Não podia acreditar que sua frustração ainda surpreendesse as ir­mãs. Fazia anos que conheciam seu problema. Conhecer e compreender, porém, eram coisas absolutamente dis­tintas. Afinal, elas sabiam ler, escrever e calcular.

— Pare de dizer que é incapaz, porque não é verdade. — Anahi retrucou.

— Alguma coisa impede que você aprenda, é só — acrescentou Maite.

— Sim, uma coisa chamada estupidez!

As irmãs iam dizer algo, mas Dulce calou-as com um gesto de mão.

— A maioria das pessoas não sabe, porque ninguém ja­mais tentou ensiná-las. Eu, porém, não consegui aprender, apesar de todo o esforço que fizeram para me ensinar. O "p", para mim, parece um "q", enquanto que o "b" parece um "d", isso sem contar que sempre confundo o "6" com o "9" — con­cluiu a voz marcada por frustração e impotência.

Adorável Condessa - VondyOnde histórias criam vida. Descubra agora