— Nunca precisei passar por isso na minha vida, viu. — disse Lily arrastando uma de suas malas, enquanto Zac carregava mais duas.
— Você não é menos importante por ter um cartão de crédito recusado, Lily. Perdi a conta de quantas vezes passei constrangimento por causa de grana. A solução para isso você já tem: trabalho. Você é uma das mulheres mais inteligentes que eu conheço e extremamente comprometida com o que faz. Calma, vai dar tudo certo. — disse Zac.
— Espera, repete aquela parte da mulher mais inteligente e tal... — fazendo Zac rir.
— Verdade. — Zac parou na calçada para chamar um táxi. — Muito do que sei, aprendi com você. Você tem que acreditar que consegue dar certo sem sua mãe. Cadê aquela garota corajosa?
— Eu sei. — Lily estava desapontada consigo mesma. — Eu me acomodei demais... Não deveria ter deixado ela controlar tanto minha vida.
***
Uma nova rotina menos confortável começava a se estabelecer. Lily teve dificuldade para conseguir um novo emprego na mesma posição que ocupava na empresa de sua mãe, apesar de sua formação e experiência. Algumas vezes, não conseguia nem mesmo ser chamada para entrevista ou não passava da primeira etapa de uma seleção. Começou a desconfiar sobre o dedo de sua mãe naquela situação. Lembrou-se de uma amiga que trabalhava em uma galeria em Paris, a única que poderia ajudá-la a confirmar sua suspeita.
Marcou um café com Julyenne, uma amiga francesa muito elegante cinco anos mais velha que Lily. Quase tão refinada como Dona Margot, a moça tinha a mesma idade que Lily. Elas se conheceram em uma das viagens da família Rasmussen a Paris, quando foi obrigada a ir porque simplesmente não tinha opção, a não ser obedecer a sua mãe.
No desenrolar da conversa, Julyenne revelou que recebeu uma ligação de Margot pedindo que não recebesse Lily e muito menos a contratasse. Por maior que fosse a briga entre Lily e a mãe, era a primeira vez que experimentava o poder da mãe para prejudicar sua vida, ainda que ela achasse estar fazendo bem. Estar com Zac feria demais o orgulho, era motivo de constrangimento para Margot..
— E o Peter? Pensei que vocês tinham ficado noivos? — Julyenne disse.
— De fato, ficamos... por 5 minutos. Ele fez o proposal, se ajoelhou e tudo, mas depois daquele momento constrangedor, pedi que parasse e conversaríamos melhor depois. Isso para não dizer "não" no meio do restaurante. Deixei que ele colocasse o anel no meu dedo e assim que chegamos em casa, devolvi. — contou Lily.
— Não acredito que você fez isso! — disse Julyenne em meio a gargalhadas.
— Nosso namoro era uma piada. Ele só me pediu em casamento porque minha mãe queria me prender em Nova Iorque na vida que ela idealizou pra mim. — disse Lily.
— Eu sei como é isso. Meus pais já quiseram me arranjar várias vezes e sempre dou um jeito de escapar, por isso estou sozinha até hoje. Parece que vivemos no século passado. Uma loucura como eles acham que podem nos controlar como marionetes. Me conta. E você, está namorando? — perguntou a amiga.
— Sim... na verdade estamos morando juntos por culpa da minha mãe mesmo. Meu plano era alugar um cantinho pra mim e ficar cada um na sua, só de namoradinhos. Mas com essa dureza, tive que aceitar dividir o apê com ele, né? — disse Lily, mostrando sua frustração.
— Que pena, querida! Eu posso ajudar. Tenho um apartamento aqui perto que está alugado até o final deste mês. Se você estiver desconfortável, pode ficar lá o tempo que precisar. — disse Julyenne.
— Ai, muito obrigada. Talvez precise. Eu ficaria bem mais à vontade e não queimaria tantas etapas nesse começo de namoro. Ele é um querido, mas não queria depender dele nesse sentido. — confessou Lily.
— Você nunca precisou de ninguém, não é agora que vai viver como uma dona de casa de subúrbio, não é, Lily? — A amiga sorriu e deu um gole no chá. Lily fez o mesmo para ver se aquela piadinha descia mais suave.
— Você não conhece ninguém que tenha coragem de enfrentar minha mãe e me contrate para trabalhar em uma galeria, museu, qualquer coisa? — perguntou a moça desesperada.
— Não que eu me lembre... — respondeu vagamente.
— Você tem trabalhado exclusivamente nos negócios da família, July? — perguntou.
— Sou curadora de uma exposição permanente em uma Universidade. Ultimamente tenho ido mais vezes por semana para acompanhar umas peças que estão sendo restauradas.
— Olha, que legal! — Lily só queria uma chance e deixou bem claro o tipo de ajuda que precisava, porém sua amiga fingia não entender. Talvez por temer a fúria de Dona Margot.
Julyenne bebeu o chá que restava na xícara, olhando para a tela do telefone e pegou sua bolsa.
— Qualquer coisa eu te aviso, agora preciso ir. Desculpe a pressa, amiga. — Deixou Lily na mesa do café.
***
Ao chegar em casa, Lily largou a bolsa com as chaves em cima de mesa. Zac assistia tevê e percebeu que a menina queria atenção. Ela não falou nada ao chegar, nem mesmo o cumprimentou. Foi direto para a cozinha, depois de deixar o casaco pendurado, e abriu uma garrafa de vinho. Despejou uma quantidade maior que o usual na taça e bebeu com facilidade, como se estivesse matando a sede com água, tentando descarregar a frustração. O rapaz ficou assistindo tudo querendo ajudar, tentando encontrar uma oportunidade de falar.
— Tudo bem, Lily? — Quebrou o silêncio.
Lily levou as mãos ao rosto, deu um longo suspiro e respondeu:
— Não... não está nada bem. Minha mãe está me deixando de mãos atadas. Nem com amigos estou conseguindo oportunidades. Sem emprego e com meus cartões bloqueados, não consigo pensar numa maneira de viver aqui.
Ele levantou do sofá e foi em direção a Lily sem tirar os olhos da expressão de tristeza que trazia no rosto. Puxou uma cadeira e sentou-se ao seu lado na mesa da sala, oferecendo seu ombro para que encostasse a cabeça. Lily achou conforto no perfume impregnado na pele dele.
— Vai ficar tudo bem. — disse ele, pousando a mão sobre seu rosto.
Nos olhos de Lily, ele via ansiedade e angústia pela falta de perspectiva. Ele já havia passado por muitos momentos complicados em relação a dinheiro, mas para Lily, que sempre viveu em outro mundo, isso parecia difícil de resolver pois nunca tinha passado por aquele tipo de privação.
***
Após algumas semanas, Lily continuava na mesma situação e sua ansiedade só aumentava. Julyenne havia ligado dizendo que o morador quis renovar o aluguel por mais um tempo e não poderia oferecer o apartamento como combinado.
Viver com Zac estava sendo tranquilo e ele de forma alguma se incomodava, contudo Lily queria evitar desgastes com uma excesso de intimidade, já que não tinham decidido de antemão morar juntos.
Zac passou a trabalhar mais um turno na faculdade e se envolveu com alguns projetos que tomavam todo o seu tempo durante o dia, chegando em casa exausto. Todos os dias, ele se lembrava de levar um agrado pra Lily, ainda que fosse simples para deixá-la mais feliz. Era um chocolate, flores, um café (mesmo sabendo que ela não gostava de café depois das cinco). Ele adorava ficar no sofá vendo tevê, abraçadinho com ela e falando sobre o dia que teve.
Apesar de passar grande parte do dia em casa lendo seus livros, Lily tentava arejar os pensamentos dando um passeio pela cidade, afinal não era qualquer lugar, era Paris. Esnobe como fosse, a cidade era linda e Lily gostava de dar uma volta de bicicleta e tomar um café caprichado olhando para a torre Eiffel. Infelizmente, não podia ter esse luxo com os últimos acontecimentos, então mantinha só os passeios de bicicleta e voltava para casa para tomar seu café caseiro.
Zac dormia depois de quinze minutos de conversa e ela relevava, pois via o quanto havia trabalhado e se dedicado aos estudos durante a semana. Ele trabalhava com prazer e era muito esforçado, despertando admiração e conquistando alunos e professores.
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Worlds apart
FanfictionLily é uma moça que tinha tudo pra ser mimada. Filha única em uma família rica, ao invés de se encantar com os benefícios de uma vida privilegiada, pegou a mochila e foi conhecer o mundo e admirar as artes à sua maneira. Assim conheceu Zachary, um s...