13. Silêncio e paz

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Às duas da manhã, Lily acordou com dores de cabeça no chão frio do banheiro. Tinha adormecido ali com os olhos pesados de tanto chorar. Alcançou sua bolsa jogada no chão e olhou a hora no celular. Viu também que Zac havia ligado diversas vezes e sentiu raiva por não ter chegado em casa ainda mesmo sem ter notícias dela.

Procurou se recompor e terminou de se despir para tomar um banho gelado. A dor de cabeça era intensa como marteladas e até o barulho da água do chuveiro tocando o chão era motivo de incômodo. Perdeu a noção do tempo que ficou naquele banho. Suas lágrimas se misturavam e iam embora com a água que escorria pelo ralo. Mais calma, sentiu-se em condições de sair do chuveiro, vestir uma camisola confortável e desabar na cama. O simples ato de secar-se com a toalha, fazia seu corpo doer. Lily só queria que aquela noite acabasse. Quando se aconchegou na cama e começou a pegar no sono, ouviu a porta da sala bater. Zac tentou chegar em silêncio imaginando que Lily já estava dormindo, debruçou-se sobre a cama e disse:

— Lily, amor... onde você estava? Te procurei e liguei tanto.

Ela olhou para ele querendo dizer muita coisa, despejar toda a dor que sentia. Mas contrariando sua vontade, permitiu-se apenas dizer:

— Não quero olhar pra você, Zac. Por favor! — E cobriu a cabeça com o lençol, sem dar chance de se explicar.

Com receio de mostrar sinais de leve embriaguez, Zac não quis insistir e foi tomar banho para dormir no sofá.

***

Na manhã seguinte, ele acordou ao som de Lily passando mal no banheiro do quarto. Chorava por não querer sua ajuda, mas não conseguia controlar a vontade de colocar tudo para fora. Por fim, se sentiu um pouco melhor e foi até a pia lavar o rosto e escovar os dentes. Com olhos inchados, Lily olhou fixamente para ele por alguns segundos pensando em como começaria a conversa. Ela nunca tinha olhado para ele daquela forma. Zac sabia que seria difícil.

Ele tinha preparado um chá enquanto Lily guardava a roupa usada no quarto. Ela foi para a sala, aceitou o chá e sentou-se no sofá, tomando da bebida quente enquanto olhava fixamente para a televisão desligada.

— Você sabe o que é se sentir no céu e no inferno, Zac? — perguntou com a voz firme e serena.

Ele engoliu seco e pôs a mão em seu no joelho.

— Amor...

Ela retirou a perna de seu alcance e fechou os olhos com muita dor.

— Você já foi traído?

— Lily...

Calmamente, ela colocou a xícara de chá na mesa de centro e voltou ao sofá para olhar para ele.

— Ultimamente, tenho me perguntado todos os dias se vale à pena estar aqui. Nunca me senti tão feliz e ao mesmo tempo tão triste com alguém.

Os olhos dele marejaram ao ver tanta tristeza nas palavras dela.

— Eu acho que você não precisa mais de mim. — Tentou interrompê-la, fazendo-a falar um pouco mais firme. — Você se preocupa tanto em me dar o que não sinto falta, que está me perdendo... Era muito importante pra você aquele evento, eu entendo...

Ele segurou sua mão e disse:

— Amor, me desculpa. Preciso de você mais do que imagina. Eu me perdi, não sei como fazer isso sem você, sou um idiota... Não pense em ir embora. A ideia de te perder dói demais.

— Você está rodeado de pessoas que vão te ajudar a continuar. — falou em voz baixa, sendo logo interrompida.

— Não, não. Quero você! Ontem Julyenne me apresentou a tantas pessoas que eu não aguentava mais. Estava cansado de sorrisos e apertos de mão, desesperado por não te encontrar no meio daquela gente. Você não atendia às minhas ligações e eu não conseguia me livrar dela.

Lily suspirou com o ódio que lhe agravava a queimação no estômago. Pensar na falsa amiga aumentava seu enjoo.

— Desde que vocês se conheceram, comecei a te perder. Cada dia por um motivo, aos poucos você passou a gastar mais tempo com ela. — disse ela.

Zac acariciou seu rosto, que de tão tenso, parecia petrificado. A lágrima escorria, mas sua expressão era dura e o olhar sem vida.

— Não é só ciúme, Zac. É o que eu represento na sua vida. O tempo que você investe no que ama. Não está me fazendo bem.

— Amor... — Zac esfregou os olhos com as mãos e respirou fundo. — Eu admito que estou fazendo tudo errado. Não sei como agir num relacionamento, não consigo expressar o que sinto, não sei... por isso nunca dei certo, nunca consegui que desse certo com ninguém. Estou errado? Sim! Faço tudo errado sim! Eu não mereço tudo o que você faz por mim. Estou sendo ingrato e egoísta... injusto com você. Não consigo pensar em outra coisa.

Lily o escutava sem expressar emoção alguma.

— Você tem toda razão em sentir mal. Eu dei motivos pra isso achando que estava fazendo bem pra nós dois. — prosseguiu. — Não sei o que fazer pra te fazer sentir melhor de imediato. Queria tanto mudar isso!

Lily disse que não com a cabeça e deixou o choro tomar conta.

— Dói tanto, Zac... tanto! Me sinto tão sozinha aqui!

Ele sentou mais perto e ofereceu um abraço acomodando sua cabeça no peito, sentindo a dor dela. Era mais do que achar que estava sendo traída, mais do que a falta de dinheiro, era a situação de não correspondida, a doação não reconhecida, vê-lo maravilhado com um mundo novo sem que a trouxesse para perto. Lily não queria voltar para Nova Iorque, muito menos queria trabalhar com sua mãe novamente ou voltar para seu apartamento vazio, mas a solidão que sentia ao lado dele a magoava. Ele estava arrependido e a apertava contra o peito tentando diminuir a distância emocional entre eles.

— Desculpa, amor. — Distribuía beijos por todo o seu rosto.

— Quero acreditar, Zac. — Ela quis olhá-lo nos olhos.

— Eu preciso te contar uma coisa que talvez faça me odiar mais. Mas você precisa saber, não quero que exista segredo entre a gente...

— Ontem fui à galeria organizar a exposição.

— Sim.

— Trabalhamos e no fim do dia Julyenne pediu pizza. Bebemos um pouco também. Depois de um tempo, reparei que ela se insinuava pra mim.

— Imaginei que faria. — falou sem surpresa.

— Ela se insinuou insistentemente... e eu vim para casa... Reagi de forma diferente do que acho certo, mas não fiz nada. Não a toquei, não falei nada, porque não significa nada pra mim... porque eu amo você... é você que eu quero!

Lily respirou fundo para ganhar tempo e pensar no que acabava de ouvir. A dor de cabeça não ia embora, só piorava. Massageava as têmporas na esperança de aliviar, em vão.

— Quer dizer que não aconteceu nada entre vocês? — ela perguntou, com os olhos semicerrados.

— Não. Não quis entrar no jogo dela. Só achei que seria um bom contato pra ganhar visibilidade, mas se isso significa colocar a nossa relação em risco, eu abro mão. Você é mais importante pra mim do que qualquer coisa!

Lily respirou fundo e disse:

— Eu acredito em você. — Relaxou o corpo no seu abraço e aceitou suas desculpas.

Eles passaram aquela manhã abraçados e em silêncio depois da discussão. Zac tinha o dia de folga e ela ligou para o trabalho dizendo que não se sentia bem. Não assistiram tevê nem atenderam ao telefone. Só silêncio e o coração em paz, prontos para recomeçar e fazer dar certo.

Now how about I be the last voice you hear tonight?
And every other night for the rest of the nights that there are
And every morning I just wanna see you staring back at me

'Cause I know that's a good place to start

Not a bad thing — Justin Timberlake

Worlds apartOnde histórias criam vida. Descubra agora