2.Coisas nas quais penso

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Essa é a filha da chefe.

Eu havia visto fotos dela, claro.

Não se pode entrar no escritório de Alice Macedo sem ver fotos da sua filha. A minha preferida é aquela em que Diana está atravessando a linha de chegada, toda suada e vermelha, com um sorriso de matar.

Olho para baixo, para a maca. Diana tem um hematoma bem grande embaixo dos dois olhos.

Ainda assim, dá para ver a semelhança com a mãe.

Maçãs do rosto altas, olhos grandes e profundos.

Baixa, esguia.

Mas as semelhanças param por aí.

Alice é a megera de gelo: cabelo loiro, olhos cinzentos e calculistas.

Diana...bem, ela é diferente. Seus cabelos são castanhos escuros, e os olhos são castanho-claros.

Pelo menos, tenho certeza de que são castanhos. Estão um pouco inquietos no momento.

Não tem muito espaço no banco estreito na parte de trás da ambulância. Quase saio voando quando eles partem da sala de emergência e acionam a sirene.

Sorrio.

— Pisa fundo, amigo — grito ao motorista.

O médico que está sentado do outro lado da maca de Diana me olha como se dissesse que diabos é isso?

Sei que parece estranho me divertir neste momento, mesmo assim: escutar a sirene que corta o silêncio das ruas de São Paulo enquanto todos os outros carros abrem caminho?

Muito legal.

Além disso, Diana vai ficar bem.

Eu acho.

Chegamos à ponte em pouco tempo.

A ponte.

A Estaiada, ainda a melhor, nunca me canso dela.

Às vezes, fico sonhando acordada e pensando em como seria legal deslizar pelo cabo.

Sim, certamente a queda seria longa e a morte, horrorosa.

Mas antes disso seria maravilhoso. Eu me sento com os cotovelos apoiados nos joelhos, tentando curvar os ombros um pouco.

Tenho ombros bonitos, posso mostrá-los.

Sei que ela está me olhando.

Bacana, porque também estou de olho nela.

— Aiiiiiiiiiiiiiiii!

Diana grita de repente.

Está com dor. Muita dor.

Então, pode ser que ela não esteja olhando para mim, não.

— Doutor, pode ajudar esta garota? — pergunto.

Ele se inclina para checar o soro.

Ele está dobrado, o fluxo foi interrompido. O médico acerta o tubo e cola fita adesiva para mantê-lo no lugar.

— Ela vai melhorar em um segundo.

— Legal — digo. Eu me inclino para mais perto dela para que me escute.

— Consegui fazer com que ele libere a morfina — digo, falando alto e lentamente.

Os olhos dela se viram na minha direção.

Não parecem focar muito bem.

E, por um segundo, eu penso: nossa, e se eu estiver enganada?

E se ela morrer?

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