15.Foi como um acorde belamente executado, sem qualquer sentimento

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Ponto de vista de Laura

Caminho pelas ruas de São Paulo com a ruína no bolso, um medo forte no coração e o desejo de voltar para a Macedo para entregar os pãezinhos. Tommy virá a minha procura. Tenho certeza disso. Eu o surpreendi, e, por ter escapado, provavelmente o frustrei a ponto de ele começar a jogar mais pesado. Mas ele não consegue me encontrar. Por enquanto, estou segura. Será que ele vai adivinhar que tenho informações importantes comigo? Será que vai saber que eu hesitei, pensando se devia espalhá-las?

Qual é o plano dele? Correr para Alice, sem dúvida. Avisar que o showzinho de horrores acabou. Por que pensar nisso não me deixa feliz? Ah, eu sei por quê: Diana. Diana estragou tudo. Diana bagunçou tudo. Ela confundiu minha cabeça. Me deixou totalmente perdido. Por isso preciso encontrá-la. Para desfazer a confusão. Provavelmente, se eu tentasse recriar aquele beijo agora, ele não teria efeito sobre mim. Nenhum efeito bom ou ruim, o que quer dizer que ele provavelmente não teria efeito algum.

É uma ideia confusa. É bem provável que eu não tenha uma ideia completamente clara até testar a afirmação. Aquela sobre o segundo beijo que não significa nada para mim. Nadinha. Decido dar um chute num saco de lixo na calçada. Bem. Bem. Bem. Preciso ir vê-la, ver o que ela está aprontando, ver o que ela acha que eu deveria fazer. Conseguir sua permissão. Sim, sua permissão, não, não quero isso. Porque ela não é minha chefe.

Eu me lembro de quando passei por Diana e ela estava trabalhando naquela simulação — não uma simulação —, mas isso eu já sei, do que me lembro mesmo é o jeito como o cabelo dela estava meio jogado para o lado e que foi com grande dificuldade que eu não me aproximei e beijei sua cabeça. Se eu fizesse isso, ela, sem dúvida, se viraria e me bateria. Ou não. Caminho mais depressa. É uma descida, então consigo ir mais rápido. É possível que ela não tenha percebido que eu saí com o pen drive? Não, de jeito nenhum.

Droga. Por que eu fiz isso? Porque estava com medo. E eu nunca sinto medo. O Embarcadero está à vista. O tráfego está começando a ficar intenso. Os bondes passam apitando. Há um casal de idosos, gays caminhando de mãos dadas, levando um cachorrinho em uma coleira. Há um morador de rua à procura de latinhas nos cestos de lixo. Tem uma executiva de terninho cinza, com saia e tênis. Fico tentando imaginar se ela é a advogada do escritório que invadi.

Passo por uma pequena multidão de pedestres e caminho decidido em direção ao armazém, onde pegarei Diana e a beijarei até cansar. Não. Primeiro, vou perguntar a ela se devo ou não destruir a sua mãe e os negócios da família. Paro à beira do píer. Tem algo errado. Sinto isso, então paro. E é tarde demais. Porque há dois caras atrás de mim, perto demais.

— Estamos armados!

Eu me viro para olhar para eles. São o Dr. Chen e a Dra. Anapura. Gênios. Chen tem quarenta e poucos anos. Ele tem um olhar assustado por trás dos óculos, que ele pensa que o deixam moderno. Anapura é uma mulher cerca de quinze anos mais velha do que eu. Tem uma trança comprida que desce pelas costas que quase chega à... bem, é muito comprida.

— Vocês não estão armados — digo.

Chen aponta com nervosismo para um volume por baixo da blusa. Anapura tira algo do bolso do casaco que parece uma lata de spray para cabelos. Mas não é. Ela borrifa algo em mim, e eu digo algo brilhante, do tipo:

— Ei!

E o mundo fica borrado. Não posso dizer que esperava acordar em algum lugar em especial. Mas não acordo no armazém do píer. O cheiro de orvalho foi embora. Assim como o barulho da água batendo nas pedras. Há algo no ar que me parece familiar. Estou de volta à Macedo.

Mãos fortes me seguram. Há um capuz na minha cabeça. Estou sendo posto de pé e empurrado para a frente. Eles pegaram meus sapatos. Estou com os pés descalços no carpete. Minhas mãos estão amarradas atrás de mim. Sinto que há pelo menos três ou quatro pessoas ao meu redor. Passamos por uma porta.

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