Paloma

123 14 0
                                    

Amigo é coisa pra se guardar na alma, não no coração. O coração é lugar arriscado, é solo instável, bicho solto que age sem pensar.

Quando cheguei aos 18 anos, com muitas espinhas na cara e nenhum juízo na cabeça, vivia rodeado de amigos. Eles eram a extensão da minha família; a rua, a extensão da minha casa. Na verdade, eu passava mais tempo na rua que em casa. Foi assim que conheci o Afonso, o Leandrinho, o Digão, o Felipe e a Paloma, única menina daquele grupo inseparável.

Praticamente vi a Paloma nascer. Exagero, na verdade vi o crescimento da menina gordinha, um ano mais nova que eu e vizinha a vida inteira. Quando chegou aos 15, Paloma deu uma esticada, reduziu as medidas e até que ficou bonitinha. Não, na verdade ela ficou muito bonita, eu é que tinha dificuldade de observar isso porque estava com ela o tempo todo, inclusive na escola.

Foi para ela que falei da minha primeira namorada, da primeira transa, das brigas em casa. E Paloma sempre me ouvia com os olhos grudados em mim e um sorriso permanente no rosto, como se admirasse as histórias da minha vida. Ela nunca tinha namorado, achava-se feia.

Um dia, cheia de sorrisos, Paloma contou-me a grande notícia: tinha conhecido um garoto, estavam praticamente namorando. Um frio inoportuno me congelou por dentro, uma angústia me deixou pra baixo: estava com ciúmes?

Sim. Ciúme. Não ciúme de amigo, de homem. De quem perdeu a garota para um rival. E quando ela me contou que transou com ele, que perdeu a virgindade tão bem guardada por longos 16 anos? Ah eu fiquei muito chateado (chorei escondido, ela jamais soube).

Meses depois, os dois terminaram. Paloma achou em meu ombro um lugar seguro para derramar suas lágrimas. Declarei-me a ela e passamos a namorar. Até que resolvemos ir para a cama, mais por insistência dela. Beijei-a carinhosamente, senti seu corpo quente colado ao meu, mas... Não consegui uma ereção. Eu estava diante de uma amiga, quase irmã. Paloma entendeu, também me amava como irmão.

O "namoro" ainda durou alguns meses e, que eu saiba, Paloma jamais contou a alguém o nosso segredo. Minha amiga continua lá, guardada no fundo da alma.

Os Amores que ViviOnde histórias criam vida. Descubra agora