Ana & Lúcia

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A sorte é um pote de ouro no fim do arco-íris: não passa de lenda. Aprendi, nesses anos de vida, que a sorte é simplesmente a vitória passageira de uma luta empreendida.

Mas nem toda sorte é, de fato, motivo de comemoração. Há episódios que, por um lado, trazem uma efêmera alegria; por outro, prolongadas dores de cabeça e uma consciência pesada.

Quando engatei um namoro com Ana, gerente de uma ótica onde eu comprara óculos para descansar a vista, não imaginei que havia ganhado na loteria - será que eu levaria o prêmio?

Ela era linda: pequenina, olhos azuis, cabelos pretos e longos e um sorriso enigmático que eu nunca conseguia decifrar, pois era, ao mesmo tempo, inocente e malicioso.

Com menos de um mês de namoro, Ana insistia que eu devia conhecer sua família. Até que aceitei o convite. Seria um jantar na casa de seus pais. Cheguei na hora combinada e, quando minha namorada abriu porta, dei-lhe um abraço afetuoso, mas ela me afastou com certa indiferença.

- Minha irmã tá descendo. Entre. - disse cerimoniosamente a moça, que, até então, eu julgava ser Ana.

Na minha frente, acredite, havia uma cópia idêntica dela, sua irmã gêmea.

- Oi, amor. Perdoe-me por não contar sobre a Lúcia. - disse-me Ana, sorrindo. Estava radiante.

Passado o constrangimento, sentamo-nos ao redor da mesa e, enfim, o jantar foi servido.

Dois meses depois, eu estava íntimo da família. Até que durante um churrasco, numa manhã de domingo, aconteceu o improvável. Depois de tomar umas cervejas, Lúcia ficou de pileque. Eu, que também havia me excedido na bebida, já não consegia discernir uma irmã da outra.

Lúcia tomou minha mão e me levou para a lavanderia, atrás da casa. Deu-me um beijo molhado, cheio de tesão. Eu correspondi ao beijo, incendiado pelo desejo.

Quando abri os olhos vi, sobre o ombro de Lúcia, a cara amarrada de Ana. Ou será que estava vendo Lúcia sobre o ombro de Ana?

Era Ana. Com um espeto de churrasco na mão e o coração embebido de ódio. Botou-me para correr dali, aos gritos. Nunca mais viria as irmãs Ana e Lúcia. Tão lindas. Tão loucas.

Os Amores que ViviOnde histórias criam vida. Descubra agora