"Paredes meias"

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Ponto de vista da Abi

Acabei de fazer a cama e tomar um duche. Estou prestes a deitar-me no meu colchão... só para mim. Olho em volta, para a divisão vazia... um dia hei-de conseguir meter mais coisas aqui dentro. Agora que comecei a trabalhar tudo vai ser mais fácil. Sorri... sabe bem estar num sítio onde, além de sozinha, me sinto protegida. É o meu espaço e ninguém mo pode tirar. Esta prestes a cair no sono com estes pensamentos quando oiço bater à porta. O meu coração acelerou de imediato.

"Abigail! Abre a merda da porta!" Senti um arrepio na espinha quando ouvi a sua voz. "Eu juro por deus que se não abrires esta merda eu vou mandar a porta abaixo!"

Levantei-me do colchão e fui a respirar fundo repetidamente até à porta de entrada. Fechei os olhos e respirei fundo mais uma vez antes de abrir a porta e quando o fiz quase caí do empurrão que me deu para entrar por ali a dentro como uma tempestade.

"Por favor... tem calma." Pedi, porque sinceramente eu já tenho pouca coisa, não preciso que ele parta nada logo na minha primeira noite aqui.

"Que merda é esta, Abi? O que é que achas que estás a fazer aqui? Qual é a tua ideia brilhante?" Grita como se não houvesse amanhã.

"Olha... está tarde. Fala mais baixo, ok? Nós podemos falar como duas pessoas racionais."

"Eu sou racional! Tu és só maluca! Olha a tua volta! Achas que vais sobreviver aqui? Tu não tens nada! A única diferença entre ti e um sem abrigo é que tens tecto."

"É melhor do que viver contigo." A minha voz começou a alterar-se.

"Tu és louca! Nunca vais conseguir viver sozinha... e sabes disso. Só estás querer chatear-me."

"Eu não sei em que mundo é que tu vives, Nate... juro que não sei! O que é que estás sequer a fazer aqui? O que é que te importa onde é que eu estou? Porque é que ainda te dás ao trabalho?"

"Porque apesar de tudo eu ainda gosto de ti, Abi! É por isso que estou aqui! Eu não quero que vivas assim!"

"Mas eu não gosto de ti... desculpa. Acabou. Eu levei tudo até ao máximo, mas chega a um ponto em que não dá. Eu perdoei demais... e tu sabes disso."

"Eu posso mudar! O que é que queres que eu seja?"

"Eu quero que sejas consciente e que saias daqui... Aliás, como é que descobriste onde eu estava?"

"Não foi difícil subornar os gajos da transportadora." Filhos da puta!

"Eu nunca mais quero que apareças aqui, ok?"

"Tu não me podes pedir isso! Eu tenho o direito de te levar comigo!"

"Não, Nate! Tu não tens! Eu não sou propriedade tua! Nós acabámos! Mete isso na tua cabeça!"

"Tu sabes que nós temos de ficar juntos, Abi... para sempre. Eu amo-te... e eu sei que tu sentes o mesmo, só estás um bocadinho confusa." Tentou agarrar no meu braço mas eu esquivei-me a tempo.

"Por favor, nem sequer me tentes tocar..." O meu coração acelerou de novo.

"Pára de ser dramática!"

"Deixa-me em paz... é a única coisa que eu te peço. Deixa-me viver a minha vida e vive a tua." Olhou-me com desdém.

"Tu és uma ingrata... se não fosse eu nunca tinhas saído daquele ninho de cobras onde estavas! E é assim que me pagas? A deixares-me?"

"Tu sabes o que fizeste, Nate! Não há volta a dar para aquilo que fizeste! Acabou!" Enchi os pulmões de ar para dizer essa última palavra.

"Não! Não acabou!" Gritou ainda mais alto que eu. "Isto não acabou mesmo!" Virou-me as costas e saiu porta fora fechando-a com um estrondo.

VizinhançaWhere stories live. Discover now