16.

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Helena mal tinha entrado em seu quarto quando a porta abriu novamente. 

A única coisa a impedindo de pular no mesmo lugar por conta do susto era o fato de que apenas duas pessoas poderiam ter aberto sua porta: Thaís e Flávio. E, ao se virar, viu os cabelos loiros e perfeitamente lisos de Thaís caindo pelos ombros, os olhos verdes maiores do que o normal e um enorme sorriso estampado em seu rosto. Sorrir tanto deveria doer, não era possível.

Não que Helena também não sorrisse demais.

Ela sorria.

— Lena! Ai, eu preciso conversar com você! — ela fechou novamente a porta, dando os dois passos necessários para chegar ao centro do quarto de Helena, que ainda a encarava com surpresa. — Tem que ser agora, aproveitar que o Flávio está no banho.

— Aconteceu alguma coisa? — o coração de Helena estava batendo mais rápido que o normal.

Mil e uma possibilidades estava passando pela cabeça da garota. E se Thaís não quisesse mais que Helena morasse com eles? E se ela quisesse terminar com Flávio? Ela realmente não deveria tentar ficar pensando tanto nas possibilidades. Sentia que poderia acabar desmaiando antes mesmo de saber do que se tratava.

— Eu preciso muito da sua ajuda. — Thaís ainda estava sorrindo. Muito. Ok, pelo sorriso deveria ser coisa boa. Certo? — Eu quero pedir o Flávio em casamento.

Helena precisou cobrir a boca com a mão direita para reprimir o grito que queria dar. Não era possível. Aquilo era simplesmente incrível! Thaís e Flávio haviam começado a namorar ainda no ensino médio e nunca, nunca haviam terminado ou dado um tempo. Claro que não era as mil maravilhas, mas era o exato tipo de relacionamento que Helena sonhava em ter. Antes de ser namorados os dois eram melhores amigos, e a amizade, por mais incrível que pudesse parecer, era o que mais os mantinha unidos.

Mesmo quando brigavam os dois sabiam esperar o momento de esfriar a cabeça, pensar em tudo o que havia sido dito, conversar e chegar em um consenso. Não que sempre acabassem concordando, mas no geral concordavam em discordar, e no fim sempre ficavam bem. Aquele era o exemplo de relacionamento saudável que ela sempre havia sonhado em ter.

E um casamento? Aquilo era a melhor coisa de todas!

— Eu realmente estou tentando não fazer escândalo de tão feliz que estou! — a voz de Helena foi abafada pela mão que ainda estava tampando sua boca, mas ela sabia que havia sido clara o bastante para que Thaís a entendesse.

— Honestamente, eu também. — a loira soltou uma risada nervosa. — Mas então, eu estou pensando em fazer um jantar especial com as comidas preferidas dele.

— Começou bem, o que ele mais ama na vida é comer.

— Nem me fala. Se ele tivesse escolher entre mim e um ano grátis de rodízio, eu ficaria solteira. — as duas riram porque era a maior verdade de todas. — E eu queria fazer um daqueles vídeos de casal? Mas o menos brega possível.

— Ah. É aí que eu entro? — então era assim que ela ajudaria a cunhada. Editando o vídeo.

Não que ela fosse expert em edições, nem de longe. Mas ela havia feito um curso de After Effects e Premiere, já era melhor que Movie Maker. E mesmo sabendo que não era exatamente sua área – marketing digital e social midia ainda eram suas paixões – ela gostava de mexer nos programas de edição. E ainda mais por um motivo tão especial...

— Se não for te dar trabalho. — o rosto de Thaís ficou da cor de um pimentão. Ah, brancos. Ficam vermelhos tão fácil... — Eu posso pagar, se voc–

— Não me ofende, Thaís. — Helena a cortou, franzindo as sobrancelhas. — Vocês me deixam morar aqui sem nem cobrar aluguel.

— A casa é própria. — a mulher balançou a mão, fazendo pouco caso.

— Mesmo assim. Editar esse vídeo nunca vai chegar perto de pagar tudo o que vocês fazem por mim. Além disso vai ser um prazer imenso fazer parte dessa história de alguma maneira. — era impressão de Helena ou ela queria chorar? Como Helena conseguia ser tão chorona? — Quando você pretende fazer o pedido?

— Meio de outubro, no nosso aniversário de namoro. — isso dava três semanas para deixar o vídeo pronto, pelas contas de Helena. Hora de organizar a agenda. — Ele vai achar que eu só tô querendo comemorar os doze anos, mas no final vai ser um pedido de casamento.

Doze anos.

Caralho.

— Eu vou precisar que você me passe todos os vídeos de vocês dois juntos, não importa a época. E de uns de você quando era pequena, se tiver como. Vou ver com meus pais se consigo algo do Flávio.

— Obrigada! — Thaís era mais alta que Helena, mas muito mais magra. Praticamente não pesou quando a loira pulou na cunhada, agradecendo com um abraço apertado. 

— Eu que agradeço, por tudo. — Helena sorriu enquanto retribuía o abraço.

— Agora vou te deixar dormir. — Thaís saiu de cima de Helena, rindo. De fato, Lena havia acabado de chegar do trabalho, o sol já havia nascido, ela realmente queria dormir. — Até porque o Flávio já deve ter se trocado e nós precisamos trabalhar.

Com mais um rápido abraço Thaís se despediu, fechando a porta ao sair do quarto, deixando Helena sozinha novamente. Com um enorme sorriso no rosto, Helena se despiu, colocando apenas um velho e enorme camisetão, apagando a luz do quarto e se aconchegando debaixo do edredom.

Thaís e Flávio iam casar.

Ela não poderia estar mais feliz.

Quer dizer, eles praticamente já eram casados. Só faltava oficializar. Eles haviam comprado aquela casa, afinal. Ainda faltava, o que, cinco anos para terminarem de pagar? O avô de Thaís havia colaborado com uma grande quantia de entrada, e o FGTS dos dois havia sido o bastante para fazer com que uma outra parte boa fosse abatida e as parcelas se tornassem acessíveis ao bolso. Era o preço de um aluguel, afinal.

E ambos tinham uma boa vida. Thaís era concursada e trabalhava em banco desde os vinte e dois anos. Flávio havia subido para gerente da empresa de engenharia civil que trabalhava. Quer dizer, de todos ali, só Helena era mesmo a quebrada que vivia de favor na casa de parente.

Mas agora eles iriam casar, ser uma família real, ter filhos...

Meu.

Deus.

Eles iam casar. Ser uma família. Ter filhos.

Helena não poderia continuar morando com eles. De jeito nenhum.

Era simplesmente errado. Eles iriam, mais do que nunca, precisar de sua intimidade. Mesmo que a única mudança que eles sofreriam seria a aliança, um papel e talvez novos sobrenomes, ainda assim apenas a ideia de estar-casado-e-não-apenas-namorando fazia uma enorme diferença psicológica. Agora eles seriam marido e mulher. Construiriam a própria família. Teriam filhos.

Helena teria sobrinhos.

E ela não poderia ser a tia sempre dura que não tem casa e mora de favor na casa do irmão. Não. ficar para titia era uma coisa. Ser a titia que mora com o irmão porque não tem onde cair morta? Nem pensar. Não que ela quisesse fazer drama. Mas ela sabia que era melhor começar a repensar a própria vida.

Querendo ou não, havia se acomodado com o trabalho no bar.

Era hora de procurar algo novo, melhor, seguir em frente.

Quem sabe até mostrar ao mundo quem realmente era Helena Resende. 

90 Por Cento [Tom Holland]Onde histórias criam vida. Descubra agora