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Ventos frios, que fazem a minha pele arrepiar, passava pela janela do quarto. As nuvens pretas no céu declararam chuva e tempestade pelo resto da noite. O tempo frio dava uma sensação de querer ficar no quarto debaixo de um cobertor, com um copo de chocolate quente e Netflix.

Os pais de Miguel reagiram muito bem a notícia do filho. Fernanda chorou, pulou, abraçou o primogênito e fez várias perguntas do tipo: "Você vai morar com a gente?" "Você vai estudar integral?". Já Fernando encarou de outra forma. Abraçou o filho, deu tapinhas em suas costas e se sentou no sofá novamente. "Acho que Fernanda se emocionou demais", foi sua resposta ao comportamento da esposa.

Vitória ficou reclamando, dizendo que teria que aguentar ele por mais vários anos, e que se fosse pra ele ficar, que iria ficar no seu antigo quarto. Mas eu sei que no fundo, nem que seja bem no fundo, ela ficou feliz por ter seu irmão de volta em casa. Ela está com saudades das brigas banais que eles tinham no passado e que sempre resolviam que um abraço obrigado pela mãe. Ela o ama.

Meus pais já foram liberados para ficar em repouso total em casa. Minha tia Leila fez uma pequena mudança para nossa casa para ficar de olhos nos dois e para fazer companhia principalmente. Roberta e Rodrigo não gostam de ficar parados, querem sempre andando de um lado pro outro. Choraram quando eles receberam a notícia do filho falecido, eles se sentiram culpados de formas diferentes.

Mamãe ficou se responsabilizando dizendo que deveria ter sentido, deveria ter feito um teste, deveria ter estranhando quando sua menstruação não desceu. Papai se culpou por não te desviado, por não ter achado esquisito quando o carro acelerou e ficou curvando de um lado para o outro, principalmente quando ele bateu e não pôde fazer nada para ajudar sua mulher e seu filho. Eles ainda não podiam receber emoção demais.

Britten deixou cair algumas lágrimas do seu rosto assim que recebeu a explicação dos médicos e de tia Leila. Ele, como todos nós, não sabia o ocorrido e descobriu recentemente sobre o irmão "caçula" e ficou calado por todo resto do dia. Disse que iria aceitar a prisão domiciliar e ajudar no que podia fazer, que seria trazer mais alegria e felicidade para o lugar e para - especialmente- a família. Ele começou a trabalhar pelo papai, com a parte financeira da empresa. Passa horas trancado no escritório cercado por folhas, computador e canetas.

Ele está se esforçando muito para manter o equilíbrio família/empresa. Trabalhar com cálculos, matemática, empresários furiosos e - particularmente - com o aliados da empresa e lidar com uma família maluca que quer botar ele nos eixos novamente, era muito pior.

Nesses dois dias que voltei para escola, voltei muito calada e quase não falava com todos, eles imaginavam que era porque eu ainda estava abalada do acidente. O policial mandou tomar cuidado, pois poderia ser alguém dos meus amigos. Ele ainda vinha me fazer algumas perguntas sobre a escola, sobre meus pais, se eu estava bem e tal, mas eu só respondia sim e não.

Como hoje é dia de treinamento da equipe, vou reunir todas as gotas de felicidade que restam em mim e usar em momentos com esse treino. Tive uma manhã cheia, atestados de comparecimento e atestados médicos para entregar, deveres acumulados... Até o final do ao estarei esgotada.

- Forças nesses braços. Segura esse arco, Stefani. Lia rever esse passo no seu solo. Milena concentre-se em pegar as maças no alto. Bridget, olha esse salto. Você precisa voltar para o lado, não ficar parada no ar. - A treinadora está apontando os erros de todas.

- Quer ajuda? - Lia me perguntou, pegando com delicadeza os pesos das maças em minhas mãos e colocando no tatame. Assenti e ela começou a fazer uma massagem, me deixei levar no momento e senti meus ombros relaxarem conforme ela friccionava os dedos contra minhas costas. Ela deu uma risadinha e voltou a massagear.

- O que deu em você? Terça você nem veio. Se continuar assim, você pode ser tirada do time. - Ela sussurrou. Continuei com meu batalhão do silêncio até eu escutar ela suspirar.

- Eu quero te ajudar, mas primeiro precisa si ajudar. - proferiu baixo.

-Eu só... Só estou ocupada demais. - Foi minha resposta. Ela vendo que não teria resposta além disso, se levantou e continuou a ensaiar seu solo. Eu peguei as maças e percebi que tinha melhorado. Aquela massagem era abençoada. Pra terminar a treinadora elogiou meus passos, o que me fez me sentir presunçosa.

- Lia? - Uma voz grossa chamou no fundo da sala. Carlos Euzênio.

- Pode ir. - A treinadora murmurou revirando os olhos. Lia correu até a porta, fechando-a no ato.

- Treinadora? - chamei.

- Sim?!

- Você pode me ajudar? - pedi, envergonhada.

- Seria um prazer! - os olhos dela brilharam em confirmação.

Até o final do treino ela ficou me auxiliando no passo. Várias tentativas falhas, várias maçadas (se é que existe essa palavra) na cabeça, várias caídas de bunda no chão, mas valeu a pena quando vi os olhos da treinadora brilharem de orgulho. O salto parecia simples aos olhos de outra pessoa, mas não era .

- Como foi seu dia? - Mamãe me perguntou.

- Exaustivo. - respondi.

- Valeu a pena? - Dava para sentir que ela estava sorrindo por trás do celular.

- Valeu. Eu consegui fazer um salto difícil, que me deu várias dores no corpo, mas valeu.

- Vai fazer a receita?

- Claro. - Quando eu tinha ou tenho um dia que deixa meus ossos doloridos, encho a banheira de água com gelo e entro nela. Fazia meu corpo tremer, mas quando saia, me sentia aliviada e relaxada. Pronta para dormir. Essa é a receita.

- Que bom. Seu pai tá reclamando que seu irmão tá dando pouco trabalho. Que deveria dar mais. Ele esta com saudades de vocês dois correndo de um lado pro outro.

- Não estou reclamando de nada...- Papai gritou baixando nas oitavas ao final da frase.

Conversei mais um pouco com eles e fui para meu quarto. Vi uma mensagem de Miguel em meu celular e meu coração começou a palpitar mais rápido. Fiquei olhando para o celular para ver se olhava agora ou se deixava um tempinho passar, mas minha mão foi mais rápida que meu pensamento. Abri a mensagem e ele perguntava:

"Como foi seu dia? Você tá bem? Me liga mais tarde pra gente conversar :) "

Um sorriso instantaneamente apareceu em meu rosto. Deitei na cama e respondi:

"Conto tudo por ligação."

"Estou contando os minutos pra ouvir sua voz."

E outro sorriso, maior ainda, apareceu. E ficou por horas.

O Amor Que Nos SepareOnde histórias criam vida. Descubra agora