Na tarde seguinte, Renato ligou para Aurélio. Os dois haviam se tornado
muito amigos. Nos momentos mais difíceis, Renato procuravao para desabafar
e sempre saía aliviado.
Aurélio era um estudioso não só do comportamento mas também da vida.
No trato com os pacientes, vivenciara experiências que escapavam à lógica
médica. Desde o início de sua carreira habituara-se a questionar os fatos,
buscando entender como eles ocorreram e por quê.
Suas pesquisas o levaram ao estudo da mediunidade e da interferencia dos
espíritos desencarnados na vida das pessoas. Não tinha mais dúvidas a
respeito da sobrevivência do espírito após a morte e da reencarnação.
Como amigo de Renato, travou conhecimento com Cilene e Hamílton. A
simpatia foi recíproca e logo estabeleceram laços de amizade. Aurélio ficara
viúvo havia cinco anos e morava sozinho na casa que pertencia a sua família.
Seus dois filhos estavam casados.
Discreto mas muito interessado nos problemas humanos, ele gostava de
reunir os amigos em sua casa para uma boa conversa. Eram poucos os que
privavam de sua intimidade. Renato, Hamílton e Cilene estavam fazendo parte
desse grupo.
Reuniam-se ora em casa de Renato, ora em casa de Aurélio para um
jantar agradável e depois se entregavam ao prazer da boa conversa.
Quando Aurélio atendeu, Renato confidenciou:
- Ontem tivemos notícias de Gabriela e Roberto. — Contou o que havia
acontecido e finalizou:
— Hoje à noite faremos uma reunião no centro para pedir orientação. Eles
nos haviam dito que teríamos noticias.
- De fato. Parece que o grupo está bem entrosado.
— Você nunca foi lá. Hamilton já o convidou.
— É verdade. Acontece que eu prefiro ficar de fora. Não desejo me
sugestionar.
— Assim você perde ocasião de experimentar.
- Nesses lugares as pessoas dizem que é preciso ter muita fé. Sabe como
eu sou: se estiver lá, vou querer observar tudo, ficar Com os olhos abertos para
não perder nada. Sou questionador, você sabe. Eles acham que é falta de fé.
Por isso não vou a essas sessões. Gosto das manifestações espontâneas.
— Até certo ponto concordo. Principalmente quando há fanatismo. Porém lá
o grupo é muito bom. Têm bom senso. Não aceitam as coisas sem as estudar.
Ainda penso que você deveria ir.
Além de nos dar apoio, tenho certeza de que suas energias vão contribuir
com o trabalho.
— Está certo. Você me convenceu.
— Passarei em sua casa às sete e meia.
Quando Renato e Aurélio entraram na sala da reunião, o ambiente em
penumbra, os médiuns sentados ao redor da mesa indicavam que estava na
hora de iniciar.
Hamílton ficou em pé enquanto Cilene acomodava os recém-chegados nos
dois lugares vagos ao redor da mesa. Depois ela se sentou novamente e
Hamílton fez ligeira prece pedindo ajuda para as pessoas cujos nomes
estavam sobre a mesa.O ambiente era de paz. Depois de alguns minutos de silêncio, um rapaz
começou a falar:
— Meu nome é Elvira. Tenho muito interesse neste caso. Agradeço a ajuda
que estão dando e espero poder retribuir de algum modo, prestando serviço
nesta casa. Vocês receberam notícias do casal. Era o sinal que esperávamos
para tomar algumas iniciativas. Como vocês sabem, a vida trabalha pelo bem
de todos os envolvidos. Contudo, se alguém resiste preferindo permanecer nas
ilusões do mundo, deixamos que siga o rumo que escolheu na certeza de que
a vida tem meios de levá-lo aonde precisa ir. Não é justo que os outros que já
estão maduros fiquem à mercê de energias negativas por causa de um. O que
querem perguntar?
— O que poderemos fazer para ajudar? — disse Hamílton.
— Vamos orientar. Antes vou contar-lhes uma história. No começo do
século passado, em
Paris, havia uma jovem de rara beleza, filha de família abastada, que lhe
dera esmerada educação. Tocava piano, falava vários idiomas, conhecia todas
as regras da corte, onde brilhava e conquistava corações.
Seu pai, entretanto, não era nobre e sonhava casar a filha com alguém que
pudesse dar-lhe um título de nobreza. Homem astucioso, conseguira as boas
graças de uma duquesa, que tomara Gabrielle como sua dama de companhia.
Ela, porém, não era ambiciosa como o pai. Sonhava com um casamento de
amor. Um dia apaixonou-se por um jovem mercador e foi correspondida.
Sabendo que o pai jamais concordaria com o casamento, planejaram fugir.
Uma das damas de companhia da duquesa, cheia de inveja pelo sucesso
que Gabrielle fazia, descobriu tudo e delatou-os ao pai dela.
Cheio de indignação, ele prendeu a filha na cela de um convento. O
assunto foi muito comentado, e um conde, que estava muito apaixonado por
ela, procurou o pai e pediu-a em casamento. Radiante, ele aceitou. Ela não
queria, mas o pai obrigou-a, ameaçando a vida do seu amado. Ela casou. A
amante do conde, abandonada com o casamento dele, jurou vingança.
O conde, muito apaixonado, esforçou-se para conquistar Gabrielle
procurando fazer-lhe todas as vontades. Ela, no entanto, ficava apática e triste.
Desprezado por ela, o marido sentia um ciúme doentio. Acabou por prendê-la
no castelo sob a vigilância de sua mãe, uma mulher interesseira que, irritada
com a atitude da nora, fazia tudo para perturbá-la.
Valorizando o filho, julgava que ninguém chegava à altura de merecê-lo.
Gabrielle, além de plebéia, ainda se dava ao luxo de recusá-lo.
O jovem mercador, sabendo que sua amada estava sofrendo maus-tratos,
decidiu salvá-la.
Planejou com dois amigos ludibriar a vigilância e libertá-la. Armou um
ardiloso plano e depois de certo tempo conseguiu o que pretendia.
Raptou Gabrielle e com a cumplicidade dos amigos conseguiu levála para a
Itália, onde passaram a viver juntos, O conde Alberto ficou desesperado e jurou
vingança.
Contratou pessoas para procurá-los, até que conseguiu descobrir onde
moravam. Indignado, armou vários homens e foi à procura deles. Chegaram à
noite e imediatamente invadiram a casa onde o casal dormia. Raul, o jovem
mercador, tentou impedi-los de levar Gabrielle, mas foi derrubado com violenta
pancada. Caiu desacordado. No quarto ao lado, uma criança chorava
assustada. Gabrielle gritava desesperada:Soltem-me. Meu filho está chorando. Larguem-me.
Mesmo debatendo-se vigorosamente, eles a levaram. Uma hora depois,
Raul acordou e, dando conta do ocorrido, deixou o filho com a ama, armou-se e
saiu à procura dos raptores.
Conseguiu alcançá-los em uma estalagem onde se haviam recolhido. Ficou
à espreita e, quando todos dormiam, entrou sorrateiro. Ouviu vozes e
reconheceu Gabrielle discutindo com o conde. Aproximou-se. Ele a acusava de
traição, dizendo que ela teria o castigo que merecia.
Gabrielle implorava que a deixasse em paz, dizendo-lhe que tinha um filho
pequeno que precisava dela. Irritado, Alberto tentou agarrála, dizendo:
— Você é minha mulher. Vou fazer de você o que quiser.
Abraçou-a tentando beijá-la. Raul abriu a janela do quarto e pulou para
dentro, gritando:
— Solte-a. Deixe-a em paz.
Alberto voltou-se para ele e imediatamente pegou a espada, mas nessa
hora Raul, que tinha um revólver na mão, atirou. Alberto caiu e logo o sangue
molhou o assoalho. Gabrielie chorava em pânico.
Raul ajudou-a a pular a janela e, enquanto as pessoas que ouviram o tiro
arrombavam a porta do quarto, ele apanhou o cavalo, colocou Gabrielle na
garupa, montou e partiu a galope.
Chegando em casa, arrumou os pertences e partiu com o filho e a jovem
ama, que era órfã e dispôs-se a acompanhá-los.
Elvira fez uma pausa, enquanto os presentes emocionados não se
atreviam a dizer nada. Foi Hamílton quem quebrou o silêncio:
- Você está falando de Gabriela. Os outros personagens fazem parte do
processo que enfrentamos hoje.
— Isso mesmo — concordou ela. O espírito do conde viu-se no astral
revoltado, planejando vingança. Raul, além de roubar-lhe a mulher amada,
tirara-lhe a vida. Augusta, sua ex-amante, ajudava-o nessa empreitada. Eu sofri
muito. Laços de amor me prendem a Alberto. Tivemos ligações em vidas
passadas, nas quais começamos por uma louca paixão e acabamos por
sublimá-la quando o recebi como filho. Tentei de todas as formas que ele me
ouvisse e concordasse em perdoar. Tenho amigos que me ajudam e todos nos
empenhamos para que ele compreendesse que é inútil lutar contra a força das
coisas. Que essa atitude só traz sofrimento. Mas ele não me ouviu. Descobriu
onde o casal vivia, colou-se ao rival com intenção de destruí-lo.
Raul tornou-se nervoso, irritado, ora sentindo-se inquieto, ora caindo em
apatia, desmotivado para o trabalho.
Aos poucos foi perdendo o entusiasmo pela vida e lembrando-se do rival
que havia assassinado. Começou a vê-lo ameaçador, cobrando o que lhe
devia. Gabrielle fazia tudo para trazê-lo à razão, porém a cada dia ele ficava
pior.
Eles haviam tido quatro filhos, e GabrielLe, notando que Raul se
descuidava do trabalho, substituía-o enquanto ele ficava no quarto dormindo ou
andando inquieto pelas ruas da cidade. Eles haviam montado pequena Loja de
onde tiravam o sustento. Raul foi ficando pior e GabrielLe assumiu inteiramente
o negócio, tendo por ajudante Nina, a órfã que haviam recolhido e que a
apoiava em tudo.
Raul nunca se recuperou. Foi enfraquecendo e acabou morrendo antes
dos quarenta anos.Quando acordou no astral, Alberto esperava-o cheio de ódio, satisfeito com
o que conseguira.
Vendo-o, Raul atacou-o enraivecido e os dois rolaram, agredindo-se
mutuamente.
Não pudemos separá-los naquele momento. Levamos tempo até que Raul,
cansado, sofrido, arrependido, aceitou nossa ajuda e foi recolhido em um lugar
de recuperação. Lá, estudou, recuperou-se, aprendeu que, para se libertar da
sua ligação com Alberto, precisava perdoar.
Porém só o conseguiu quando entendeu que cada pessoa é o que é e só
tem condições de fazer o que sabe. Ele se julgava com direito ao amor de Ga-
brielle porque ela o amava. Via o conde como um intruso que se valera de sua
fortuna para roubar-lhe a mulher amada. Por isso não sentiu culpa quando a
raptou. Contudo, o conde tornara-se marido dela e viu-se no direito de tê-la de
volta. Como tudo é relativo ao entendimento de cada pessoa, os dois, cada um
por sua vez, acreditavam que estavam com a razão.
Foi preciso tempo para que ambos entendessem que ninguém é de
ninguém e que sentir amor não dá o direito de agarrar-se ao ser amado e a
esse pretexto manipular sua vida cobrando retribuição. Para conquistar a paz,
precisavam ceder e mudar de atitude. Isso só aconteceu quando Gabrielle
voltou para o astral, compreendeu as necessidades de cada um e resolveu
trabalhar pelo entendimento de todos. Só assim teriam equilíbrio para seguir
adiante.
Alberto não se conformava em notar que, apesar do título de nobreza que
ostentara no mundo, Raul era mais bonito, inteligente, culto do que ele.
Acreditava que por isso Gabrielle o preferira.
Gabrielle, desejando ajudá-lo, concordou em reencarnar, aceitá-lo como
marido, ficar um tempo a seu lado a fim de motivar-lhe a auto-confiança, o
sucesso. Acreditava que, depois desse tempo, ele teria condições de progredir
por si mesmo. Então ela estaria livre para ficar ao lado de Raul, a quem
realmente amava.
Alberto preparou-se para a nova encarnação, feliz por poder contar com a
companhia dela.
Apesar de saber que ela amava outro, no fundo guardava a esperança de
poder conquistá-la definitivamente.
Gabrielle foi aconselhada pelo seu orientador espiritual a não mergulhar
naquela aventura. Ela, porém, sentia-se culpada por haver casado com ele e
depois tê-lo abandonado e pela tragédia que os envolvera.
Seus orientadores concordaram, porqüanto sabiam que ela não teria paz
enquanto não se livrasse daquela sensação de culpa que a atormentava.
A mãe de Alberto, apegada ao filho, sentindo que não o ajudara como
deveria, prontificou-se a recebê-lo novamente. Reencarnou e recebeu o nome
de Georgina. Alberto nasceu e teve o nome de Roberto. Conforme o
combinado, casou-se com Gabriela, porém não conseguia dominar o ciúme. A
sensação de traição, de perda, ainda estava muito forte em seu inconsciente.
Gabriela foi se desiludindo e compreendendo que ninguém muda ninguém.
A presença dela ao lado dele, ao invés de ajudá-lo, fazia-o recordar-se mais
dos problemas passados.
Sua atitude fazendo-a passar por autora do desfalque fê-la ter certeza de
que ele ainda não estava pronto para mudar. Entrou em depressão. Roberto
sentiu que a havia perdido. Ao invés de conformar-se, voltar atrás e tentarreconquistá-la provando o quanto a amava, persistiu no desejo de dominá-la.
Para isso, fez um pacto com algumas entidades perigosas que os estão
explorando. Infelizmente essa é a situação hoje.
Renato sentia o coração bater descompassado. Tinha certeza de conhecer
essa história e de haver feito parte dela. Teve vontade de perguntar se Raul
também havia reencarnado. Mas não teve coragem.
Hamílton perguntou:
— Eles estão em condições de serem libertados?
— Ele ainda não. Você sabe: pediu a ajuda dessas entidades, recebeu
favores, comprometeu-se de livre vontade. Agora, terá que colher os resultados
dessas atitudes. Nada poderemos fazer.
Todavia, ela, apesar de tudo, fez a parte que lhe cabia. Manteve-se fiel,
procedeu dignamente.
— Nesse caso não poderia ter sido poupada?
— Não. Ela se julgava capaz de influenciá-lo, fazê-lo mudar. Isso éuma
ilusão. As pessoas só mudam quando amadurecem e decidem-se a isso. Ela
não foi poupada justamente para que se livrasse dessa ilusão, percebesse a
verdade.
- É um difícil desafio... — comentou Hamílton.
— Sim, mas muito proveitoso. A ilusão de que ela poderia intervir no
processo de evolução dele a fez sentir-se culpada. A verdade é que cada um
erra por sua própria cabeça, ninguém é responsável pelo erro dos outros. O
conde, mesmo sabendo que ela amava outro, desposou-a. Ele também estava
iludido pensando que com o tempo poderia conquistá-la. Ficou frustrado e não
entendeu que um casamento como o dele só poderia dar no que deu. Ao invés
de enfrentar a verdade, muitos preferem manter a ilusão, e isso é que atrai
sofrimento. Toda planta que meu pai não plantou será arrancada. Sábias
palavras de Jesus. Todas as ilusões serão destruídas. Porque a verdade é luz,
é imutável, é felicidade. Quando os homens entenderem isso, irão se poupar
de muitos sofrimentos. Eu gostaria de indicar algumas providências para esse
caso.
— Já temos o endereço. Poderemos ir visitá-los.
— Vocês não. O médico que vocês conhecem e que é nosso amigo,
embora não se recorde de nós no momento, poderá ir até lá no próximo
sábado, como se fosse ao acaso. Uma vez lá, nós o inspiraremos como agir.
Fiquemos firmes. Em breve voltaremos. Deus os abençoe.
Continuaram em prece silenciosa por mais alguns minutos, depois
Hamílton encerrou a reunião.
Quando as luzes se acenderam, Aurélio não se conteve. Abraçou
Hamílton, dizendo comovido:
— Que maravilha! Nunca assisti a nada igual.
— Parece que Elvira mencionou você — respondeu ele.
— Eu senti que falava comigo. Estou à disposição.
Renato interveio:
— Estou emocionado! Tive vontade de perguntar muitas coisas!
— Eu sei — disse Hamílton. — Você também viveu essa história.
Renato baixou a cabeça tentando esconder o brilho de algumas lágrimas.
— Uma coisa me intriga... — disse Aurélio.
— O quê? — perguntou Hamílton.
— A reencarnação deles foi programada pelos mentores espirituais. MasRoberto não soube aproveitar como poderia. O que vai acontecer agora?
— Os programas são feitos antes da reencarnação direcionados às
necessidades de aprendizagem de cada um. Porém o aproveitamento varia de
acordo com as atitudes que escolherem durante a estada aqui. O livre-arbítrio é
respeitado — esclareceu Hamílton.
— Nesse caso — considerou Aurélio —, ela vai ser ajudada mas ele não.
— Você não entendeu. Todos sempre são ajudados. Neste momento, a
ajuda para ele será a de perceber os próprios enganos, e isso só será possível
experimentando os resultados desagradáveis de suas atitudes. A desilusão
ajuda a eliminar os falsos valores e a reconhecer os verdadeiros.
— A vida tem seus próprios meios de ensinar — tornou Aurélio.
— Quando você vai ao Rio? — indagou Renato.
— Neste fim de semana, conforme eles pediram. O assunto é urgente e é
melhor não perder tempo.
— Gostaria de ir junto — disse Renato.
— É melhor não — interveio Hamílton. — O Dr. Aurélio irá sozinho.
Manteremos contato todo o tempo.
- Pensei em ir junto, mas manter-me incógnito. Não pretendo aparecer
para eles.
— Mesmo assim, Renato. Você se esquece de que essas entidades
perceberão sua presença e isso poderá despertar suas suspeitas, inutilizando
nosso esforço. Nesses casos precisamos seguir à risca a orientação dada.
Controle sua ansiedade. Tudo acontecerá na hora certa.
Cilene juntou-se a eles e combinaram os detalhes. Aurélio viajaria no
sábado pela manhã e à tarde iria até a casa de Gabriela fingindo não saber que
estavam ali. O resto ficaria por conta dos espíritos.
Naquela noite Renato não conseguiu dormir logo. A história de Gabriela
não lhe saía do pensamento. Hamílton dissera que ele também estava lá. Pelo
amor que sentia por Gabriela, ele só poderia ter sido Raul, o homem que ela
havia amado.
A esse pensamento, ele estremecia de emoção. Nesse caso, ela também o
amara. Por que nunca notara nada? Ela o teria substituído por Roberto?
Não, ele estava delirando. Não podia ter sido Raul. Se o fosse, ela
certamente teria demonstrado algum interesse. Se houvesse notado que ela o
queria, não teria conseguido dominar a atração que sempre sentira.
Precisava perguntar para Hamílton se de fato ele havia sido Raul.
Dominado por contraditórios sentimentos, finalmente adormeceu.
Sonhou que estava parado em frente a uma pequena casa, cujo jardim
cheio de flores o emocionou. Ele conhecia aquele lugar. Abriu o pequeno
portão, subiu os degraus que o levavam à varanda e abriu a porta principal.
Entrou. A sala era simples mas acolhedora. Renato sentia-se emocionado.
Naquele momento uma jovem veio correndo ao seu encontro e abraçou-o,
beijando-lhe os lábios com amor.
Era Gabriela. Um pouco diferente da que ele conhecia, mas ele sabia que
era ela. Apertou-a de encontro ao peito, beijando-lhe os cabelos com carinho.
- Estava esperando ansiosa para contar a novidade. Vamos ter um filho!
Nesse momento, ele ouviu uma criança chorando enquanto alguns homens
entravam na sala e o agrediam. Ele olhou em volta e viu seu corpo no chão
enquanto Gabriela era levada aos gritos por aqueles homens.
Tudo foi rápido. Ele tentou ver para onde eles haviam ido, porém nãoconseguiu. Viu-se perambulando solitário e aflito por um lugar triste, sombrio,
enquanto uma voz gritava:
— Assassino! Assassino! Eu me vingarei.
Renato acordou suando frio. Levantou-se, foi até a cozinha tomar água.
Agora não tinha mais dúvida. Ele fora Raul. Gabriela o havia amado. E agora,
depois de tudo, como estaria seu coração?
Um dia se recordaria do amor que sentira por ele?
Passou a mão pelos cabelos, nervoso. Mesmo que ela viesse a saber do
passado e esse amor ainda estivesse dentro do seu coração, nunca poderiam
ser felizes. A vida os havia separado. Ela estava casada, tinha filhos.
Também havia Gioconda. Ela nunca lhes daria paz. Era inútil sonhar.
Precisava conformar-se em continuar esperando. Talvez, quando tudo
estivesse nos devidos lugares, a vida lhes desse oportunidade de ficarem
juntos usufruindo desse amor.
![](https://img.wattpad.com/cover/150795315-288-k185560.jpg)
VOCÊ ESTÁ LENDO
Ninguém é de Ninguém - Zibia Gasparetto
SpiritualHá quem pense que sentir ciúmes é provar que se ama ardentemente, mas até descobrir que ele transforma a vida amorosa em uma dolorosa tragédia, culminando em amarga separação. Se fizermos as contas, percebemos que sofremos mais com as pessoas que am...