— Aqui está parte dos seus salários atrasados. De hoje em diante, quero que volte a trabalhar só para nós — disse Gabriela a Nicete.
— Não vai lhe fazer falta? — Não. No próximo mês pagarei o restante. — Não quero, D. Gabriela. Nem deveria receber este. Tenho trabalhado pouco aqui, e a senhora não tem obrigação de pagar todo o salário.
- O que você tem feito por nós não há dinheiro que pague. Estou feliz em poder dividir com você esse dinheiro. Você merece. É de coração.
- Obrigado. Ainda bem que tudo está melhorando. Roberto fechou o jornal que fingia ler e aproximou-se, dizendo: - Eu ia dizer isso mesmo. Estou ganhando dinheiro e de hoje em diante voltarei a pagar as despesas. Aqui há o suficiente para a semana.
Entregou a Gabriela um envelope com dinheiro. — Arranjou emprego? — indagou ela. — Não. Resolvi que vou mesmo continuar a trabalhar por conta própria. Os empregadores querem pagar pouco porque não tenho diploma nem experiência. Depois, eu gosto de fazer tudo do meu jeito.
- Talvez seja melhor mesmo. Como você conseguiu ganhar esse dinheiro? — Não tenho capital para montar um negócio, então estou intermediando compras de materiais de construção. Desse ramo eu entendo.
- Ótimo! fez Gabriela sorrindo. — Eu tinha certeza de que você ia reagir. Sempre se saiu bem.
Vendo que ele se sentara novamente e apanhara o jornal, Gabriela continuou:
— Apesar disso, você não parece satisfeito. Aliás, tem andado calado, com ar preocupado, não conversa, não brinca com as crianças... Não entendo. Deveria estar contente por haver conseguido uma saída.
— Estou contente. Sinto que dentro em breve poderei voltar não só a pagar todas as despesas da casa como até a dar-lhe mais conforto e bem-estar. - Sinto que você está diferente. Pensei que fosse pela sua situação financeira. Se não é o dinheiro, o que é?
— Sua teimosia em querer continuar trabalhando. Isso me entristece muito. Gabriela trincou os dentes e respirou fundo antes de responder: - Por que você é tão preconceituoso? Em teimosia você ganha longe! Em vaidade também.
Quando irá entender que o fato de eu trabalhar não significa que você seja incapaz de manter a casa? Quando vai perceber que eu preciso do meu espaço para fazer o que gosto?
— Eu não ia dizer nada. Você perguntou, eu respondi. - Gostaria que soubesse como me sinto com essa sua atitude. O casamento para mim é parceria, é igualdade, é cooperação. Quando você precisou, eu fiz tudo para ser companheira, para ajudá-lo, fiz o meu melhor. Mas você nunca reconheceu esse esforço. Ao contrário, continua desvalorizando o que faço, como se eu não servisse para mais nada a não ser ficar em casa, como se eu não tivesse querer. Você deseja que eu me torne um objeto de adorno em nossa casa para que seus amigos digam: "Olhe como Roberto é capaz! Como ele consegue ser um bom chefe de família! Para que sua mãe possa finalmente aprovar nosso casamento, coisa que ela nunca fez, e dizer: "Roberto soube encontrar uma mulher digna dele!"
Ele se levantou e tentou abraçá-la, dizendo: - Não é nada disso, Gabriela. Você está enganada! Ela se esquivou do abraço com raiva: - É, sim. Que outro motivo haveria para esse seu comportamento? - É que eu a amo muito! Sou louco por você. Morro de ciúme vendo-a passar o dia inteiro no meio de outras pessoas enquanto eu estou longe.
- Isso que você sente não é amor! Não é mesmo. É insegurança, é falta de confiança em você, é falta de confiança em mim. Sua maneira de falar me ofende. Como se eu precisasse estar sendo vigiada constantemente para não fazer nenhuma besteira... Para não arranjar um amante... O que pensa que eu sou? Como pôde passar nove anos do meu lado e não perceber minha maneira de ser?
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Ninguém é de Ninguém - Zibia Gasparetto
SpiritualHá quem pense que sentir ciúmes é provar que se ama ardentemente, mas até descobrir que ele transforma a vida amorosa em uma dolorosa tragédia, culminando em amarga separação. Se fizermos as contas, percebemos que sofremos mais com as pessoas que am...