Capítulo 19

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Nos dias que se seguiram, Roberto foi melhorando. Saiu da UTI e foi para o quarto comum. A princípio crivava Gabriela de perguntas sobre o que havia acontecido durante os dias em que ficara inconsciente, mas ela, depois de resumir os fatos com simplicidade, disse-lhe que não queria mais falar no assunto e recusava-se a responder novas indagações.

— Estou fazendo o que posso para esquecer tudo. Não quero falar mais sobre isso. Vamos mudar de assunto.

— Estou preocupado com as despesas. Estava começando a trabalhar e não tenho reservas.

— O Dr. Renato está pagando tudo. — Não gosto que faça isso. — Não temos opção. Depois, ele considera justo, uma vez que foi Gioconda que o feriu.

- Eu também sou responsável pelo que aconteceu. Não é justo que só ele pague.

— Vamos deixar as coisas assim e não arranjar mais problemas do que os que já temos. Ele responsabiliza a esposa e quer pagar.

— Eu contribuí para que ela se descontrolasse. O ciúme é um fogo destruidor. Sei como pode nos enlouquecer. Apesar de eu nunca ter imaginado que ela pudesse chegar a esse ponto.

— Chega de falar nisso. — A cada dia que passa, vendo sua dedicação, sinto-me mais culpado. Diga que me perdoa e que tudo voltará a ser como antes.

— Já disse que quero esquecer, deixar a poeira assentar, colocar a cabeça no lugar.

— Diga que me ama e que me perdoa! — Não me pressione. Tenho estado com os nervos à flor da pele. Preciso de um tempo para pensar.

— Para quê? Você sabe que não poderei viver sem você. Diga que nunca vai me deixar.

— Não quero falar nisso agora. Se continuar assim, irei para casa agora. — Desde que vim para o quarto você não tem dormido mais no hospital. Antes ficava aqui a noite toda.

— Agora que está fora de perigo, preciso cuidar das crianças. — Nicete fará isso muito bem. Eu preciso de você. — Tenho vindo todos os dias. Preciso cuidar um pouco de mim. Aproveitei para tirar férias, mas dentro de uma semana terei que voltar ao trabalho.

— Pretende voltar àquele escritório? — Claro. Você ainda não pode trabalhar. Não posso perder o emprego. Ele olhou para ela com tristeza. — Pensei que, depois do que houve, não voltasse mais lá. — Preciso trabalhar. — Poderia encontrar outro lugar. - Pensei ter entendido que você está arrependido e acredita que somos inocentes.

— E estou. Tenho certeza de que você sempre me foi fiel. Mas é que, depois do que houve, as pessoas vão falar. A maldade alheia é terrível. Não quero que ninguém faça comentários maliciosos a seu respeito.

Gabriela apertou os lábios tentando segurar a onda de revolta que a envolveu. Tentou se acalmar. Depois disse:

— Se isso fosse verdade, você não teria me feito passar por ladra. - Eu estava louco! Por favor, esqueça isso... — Deixe-me em paz. Depois do que fez, não tem condições de exigir nada de mim nem de me dar conselhos sobre como proceder. Não vou deixar meu emprego, me esconder, como se fosse culpada. Sou inocente, sou um mulher honesta que vive do trabalho. Não admito que ninguém julgue meus atos, muito menos você.

Ela estava trêmula e seu rosto indignado, coberto de rubor. - Está bem. Não precisa se irritar. Você fará como quiser. Não direi mais nada sobre o assunto.

— É melhor assim. Agora vou para casa. As crianças não estão indo bem na escola. Preciso ajudá-las.

Depois que ela se foi, Roberto ficou pensativo. Nos dias em que ficara inconsciente, lembrava-se de ter sonhado que vagava por diversos lugares. Lembrou-se do medo que sentira julgando que houvesse morrido. Recordou-se das palavras de Gabriela afirmando que sempre lhe fora fiel e de como ele se emocionara sentindo que ela dizia a verdade.

Ninguém é de Ninguém - Zibia GasparettoOnde histórias criam vida. Descubra agora