Sonhos palpáveis, vergonhas mais ainda

1.2K 125 73
                                    

"Vai cuidar da sua vida", respondeu grosseiramente, erguendo as sobrancelhas em repreensão quando sentiu uma das mãos de Alois tocando sua coxa. Alois riu ao ler claramente as linhas de expressão dele dizendo tire a mão daí ou te mato. "O que você está fazendo?"

"O que você disse. Indo cuidar da minha vida agora."

Ato 3

───────

Havia um homem parado no meio da imensidão. Vestia uma capa preta que lhe cobria todo o corpo, inclusive o rosto. Aos pés dele, sangue. O corpo de Ciel gelou e arrepiou, temeroso. Mesmo com os olhos escondidos pelo pano, Ciel sentia que o homem o olhava. Também não sabia de onde veio a certeza de que a figura encapuzada era masculina, mas parecia algo intrínseco às ideias dele.

Quando o homem o chamou pelo nome, o mais puro tipo de pânico inflou em suas veias, e ele desejou conseguir correr. Não pôde mexer um dedo sequer.

"Ciel Phantomhive," ele repetiu, a voz ecoando pelo infinito como adagas nos ouvidos de Ciel. "Ciel Phantomhive, nos encontraremos novamente em breve. Para onde vai fugir agora?"

E riu, riu alto e cruel, causando tonturas em Ciel. Precisava correr. Agora.

"Bocchan!" O chacoalhar no corpo de Ciel foi o que o despertou do pesadelo, singelamente ofegante e tremendo. Uma mistura de sensações confundia-lhe a mente cansada, fazendo com que o rapaz precisasse de alguns minutos até que as coisas à sua frente se tornassem mais que um borrão. "Acorde, o café já deve estar pronto a essa hora", comentou como se, provavelmente, não fosse algo próximo de sete da manhã — e como se não soubesse que aquela voz cínica o incomodava.

"Foda-se", respondeu mal humorado, deitando-se outra vez e cobrindo a cabeça com o lençol, o qual foi puxado até que o rapaz estivesse descoberto outra vez. "Se não me deixar em paz agora, vou me certificar se arrancar sua língua e enfiar ela de volta pela sua bunda."

"Suas ameaças ficam cada vez mais complexas, Bocchan", disse Sebastian com um sorriso travesso no rosto enquanto o levava pelo colo até o banheiro. Ciel assustou-se com a audácia do Michaelis e quase lhe socou o rosto tentando descer.

"Que merda é essa?! Endoidou, foi?", rosnou Ciel, debatendo-se fervorosamente, porém apenas ouvia Sebastian gargalhar — o que estressava o anjo ainda mais. "SAI, PORRA!"

"Bocchan, não é de bom tom um anjo nobre como o senhor dizer tais palavras chulas", disse ao colocar Ciel sobre a pia e se afastar rapidamente, esquivando de um chute potencialmente doído. "Tome um banho antes de irmos para o café, você está fedendo a velhos cachaceiros." Sebastian riu e saiu do banheiro, deixando-o a sós com o pensamento que merda de sonho foi esse.

Quando saiu, já de banho tomado, completamente escondido na toalha e um pouco mais calmo, Sebastian estava apenas de cueca e o aguardava com as roupas que Ciel usava no dia anterior, levemente enfeitiçadas para tirar um pouco o cheiro de álcool.

"Se eu te ver pelado mais algum dia da minha vida, serei obrigado a enterrar meus olhos para que eles não queimem, desgraçado." Sebastian riu, causando confusão extrema em Ciel. O que era tão engraçado, os xingamentos? A cara dele?

"Você não reclamou ontem à noite", disse Sebastian, mas não houve brecha para que Ciel gritasse com ele, pois batidas à porta os interromperam. O demônio guiou-se até lá, já sabendo quem seria. "Bom dia, Mey-rin."

"Sebastian-sama, já de pé como sempre", disse Mey-Rin com um sorriso enorme. No entanto, mesmo com os olhos míopes escondidos pelos óculos grossos e redondos, assim que ela reparou na falta de roupas nele, gritou como se quisesse acordar a mansão inteira simultaneamente. "S-SEBASTIAN-SAMA, POR QUE VOCÊ ESTÁ N-NU???" E correu para algum lugar indefinido, deixando para trás o rastro de sangue que lhe escorria pelo nariz. Sebastian considerou se preocupar com Mey-Rin, mas lembrou-se de que a cena era comum quando ele ou Claude usavam a piscina da área externa.

"Ela queria avisar que o café da manhã está pronto." Avisou a Ciel, fechando a porta e finalmente se dirigindo ao guarda-roupa, onde escolheu o que iria vestir. Como sabia que Ciel devia estar vestindo a roupa no trocador, não o incomodou. Sebastian foi ao banheiro para tomar um banho rápido e poder acompanhar o noivo no café da manhã. "Então, você provavelmente está com dor de cabeça, por isso deixei um remédio em cima da..." Num instante, percebeu que tinha estado sozinho por algum tempo. Sebastian olhou para a cômoda e o comprimido não estava lá, assim como Ciel não estava no quarto.

Como ele tinha conseguido sair sem fazer barulho...?

Sebastian não sabia, por isso se limitou a sorrir e aceitar que gostava de um bom desafio.

{...}

Claude apareceu sozinho para o café da manhã, fazendo Ciel, já de mau humor, dar um suspiro profundo e bater o pé na cadeira em que ele ia sentar. Evidentemente fez aquilo porque os reis não estavam em casa, mas era bom ter um ato rebelde vez ou outra. "Cadê meu irmão, cara pálida?", indagou em voz baixa por conta da dor de cabeça. Ainda que Sebastian tivesse dado um remédio para ajudar com a ressaca dele, ainda não tinha agido direito.

"Na exata mesma posição que caiu na cama hoje de madrugada. Parece mais um cadáver", disse irritadiço. Antes de pegar no sono, Alois tinha dado um bom trabalho para ele. Ciel não respondeu, apenas escolheu outra cadeira e começou a comer a refeição em silêncio.

"Peça a um dos criados levar comida até o seu quarto mais tarde, ele deve estar faminto." Claude não se deu o trabalho de levantar os olhos até Sebastian quando ele chegou — não que se desse em outros momentos. Mas a colher parou a caminho da boca de Ciel.

"Esperem... Eu não lembro de ter saído daquele quarto ontem", resmungou confuso, notando que parecia haver um lapso em suas memórias. "O que vocês fizeram?"

"O que vocês fizeram, Bocchan. E foi bagunça." Sebastian riu alto, retornando à noite anterior em pensamentos.

Se prometer, não case com o DiaboOnde histórias criam vida. Descubra agora