Coração dividido

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Aos primeiros raios de sol do dia seguinte, Elisa foi acordada por alguém batendo na porta. Ainda sonolenta, ela se levantou, vestiu a túnica meio de qualquer jeito e foi atender a visita inesperada.

Uma pessoa vestida com um manto negro, com o rosto coberto por um capuz, a esperava do outro lado e Elisa sentiu um frio na espinha.

- Bom dia. Você é Elisa, não é?

- Sou eu mesma.

- Que bom.

A estranha figura baixou o capuz e Elisa viu que uma máscara cobria seu rosto.

- Sou Altair, amazona de Águia, o senhor Regulus me pediu para investigar sobre o paradeiro de seus amigos. – a mulher fez uma pequena pausa e continuou – Eu estou vigiando a cidade de Rodorio, para o caso de haver o um novo ataque.

- Ah, claro – o alívio a tomou e ela deu um passo para o lado. –Não quer entrar?

- Não, não posso perder tempo. Preciso me apresentar ao senhor Sísifo antes de retornar.

-Entendo. – Elisa a fitou, esperando.

- Seu amigo Thorgan está em Rodorio. Ele mandou uma carta – a mulher entregou a folha de papel dobrada para Elisa. –Infelizmente, do seu outro amigo não tenho notícias, presumo que esteja morto.

- Andrew... – Elisa olhou para a carta em suas mãos, impactada com as duras palavras da amazona.

- Isso foi tudo que pude conseguir. – Altair meneou a cabeça – Sinto muito.

A mulher se afastou e Elisa pensou que ela deveria estar acostumada a lidar com situações de morte como aquela, a julgar pela maneira que falara, praticamente sem emoção. Andrew estava com ela no dia do desabamento da hospedaria. Ainda podia lembrar da expressão em seu rosto enquanto ele tentava avisá-la do perigo.

A culpa por tê-lo levado para aquele lugar a consumiu. Ele não tinha completado 19 anos ainda, tinha tanta vida pela frente. Andrew, com seus cabelos compridos e louros, sempre amarrados com uma faixa de couro e o nariz torto após ter sido quebrado numa briga de taverna.O pesar a envolveu como uma nuvem pesada e o som de uma pessoa chorando muito cortou seu coração. Foi apenas quando um soluço sacudiu seus próprios ombros que ela percebeu que o choro vinha dela mesma. Aquele choro doído era por Andrew, pelos cavaleiros mortos, pela saudade que sentia de casa.

Até aquele momento ela tivera esperança de reencontrar os dois companheiros e, depois que aquela guerra acabasse, os três voltariam para casa e aquela história tão terrível se tornaria apenas uma lembrança distante e fantástica de sua viagem à Grécia. Agora, ela já nem sabia mais se o mundo ainda seria o mesmo, ou se ela e Thorgan sobreviveriam. Foi só depois de alguns minutos que Elisa conseguiu se controlar e finalmente ler a carta.

“Estimada Elisa,
Espero que esteja bem. Voltei há alguns dias de Atenas e descobri que Gaius foi destruída. Um morador de Rodorio me encontrou na estrada e me trouxe para cá. Fico muito feliz de saber que está viva. Estarei esperando por você aqui.Essa mulher chamada Altair me disse que não posso ir até onde você está e que você talvez não possa sair daí até essa guerra terminar. Infelizmente, não tive notícias do Andy. Cuide-se.
Do seu servo,
Thorgan.”

Aquela era definitivamente a letra de Thorgan.Estava mais bagunçada que o normal, o que significava que ele escrevera com pressa, decerto a amazona não lhe dera muito tempo. Ao ler aquilo, Elisa decidiu que falaria com Regulus e pediria a ele que a deixasse ficar em Rodorio. Se pensasse friamente, não havia nada que a prendesse ao Santuário, no máximo o hospital de Konstantinos. E ali, no recanto de Atena, no meio daquela guerra, ela muitas vezes se sentia realmente uma intrusa.

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