Capítulo 02 - Indicação

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 Já passava das sete da noite e agora nuvens escuras anunciavam que uma tempestade estava chegando. A garoa fina juntamente com o vento gélido davam uma pequena amostra do que estava por vir. Kennick foi guiando seu cavalo por ruas estreitas de terra batida. Se não fosse pelas luminárias do lado de fora de algumas casas e os candeeiros em postes em alguns pontos das ruas, o percurso seria ainda mais demorado para o rapaz. Algumas ruas eram tão estreitas que as casas ficavam muito próximas umas das outras, de modo que já seria difícil passarem três pessoas ombro a ombro, pior ainda seria passar com um cavalo naquela semi-escuridão e com várias tralhas no meio do caminho. Por isso, kennick preferia evitar essas ruas e para chegar ao seu destino, teria que dar voltas e voltas por ruas mais espaçadas e luminosas. Até que enfim chegou a uma das ruas principais.

 Caminhava sem pressa guiando seu cavalo pela rua principal pavimentada que levava ao norte da cidade, chegou por fim num cruzamento onde subindo uma rua à esquerda, chegaria na pousada em poucos minutos. No trajeto, Kennick pensava no que poderia fazer a seguir em sua busca por seu mentor. Já que havia tentado de tudo, desde perguntar aos pouquíssimos amigos que Askelad ainda tinha, até chegar a ferir alguém em busca de informações e nada disso ter trazido uma única resposta sequer, estava agora perdido e se via sem opções. O dono da pousada para onde estava se dirigindo era um desses poucos amigos de Askelad e kennick achava que talvez fosse o único com quem ele ainda não havia falado sobre o assunto.

 Enquanto andava, o rapaz se perguntava se o dono da pousada não teria alguma dica ou se conhecia alguém do passado de Askelad, qualquer coisa que pudesse lhe dar novas diretrizes sobre o que fazer em suas buscas. E foi guiado por esse pensamento que Kennick não hesitava mais em ir até esse lugar. Pois nas outras vezes em que esteve na cidade, não tinha como se encontrar com o homem, pois o rapaz logo tinha que voltar para casa por causa de suas obrigações.

 Mas também havia um outro motivo que o deixava receoso de ir à pousada.

 Já ia chegando quando notou que um homem estava na porta ao lado de fora do prédio. Viu também que esse homem deu uma ordem à um garoto que estava ao seu lado. Imediatamente, o garoto correu na direção de Kennick e pediu as rédeas de seu cavalo. Ao entregá-las ao garoto, Kennick reconheceu que este era Lendri, sobrinho do dono da pousada e irmão mais novo de Lori, a garota com quem o rapaz um dia teve uma relação.

 E esse era o outro motivo que o deixava receoso quanto à ir para esse lugar. O rapaz não sabia o que dizer à Lori, sobrinha do dono da pousada. No passado, os dois nutriam sentimentos um pelo outro e em segredo eles se relacionavam. Em segredo porque Askelad e a mãe da moça mantinham uma relação publicamente e, se caísse nos ouvidos do povo que seus filhos se relacionavam, a fama dos pais seria da mais impura possível.

 Não porque um Lied estivesse num relacionamento com uma humana, pois relacionamentos entre as raças não eram nenhum Tabu já fazia séculos. Vez ou outra se podia ver um híbrido aqui e ali, fruto de relações entre pessoas de raças diferentes. O que seria considerado um Tabu é o relacionamento de duas pessoas que foram criadas praticamente juntas, como irmãos.

 Porém, com o tempo a mãe de Lori e Lendri adoeceu e chegou a falecer. Askelad passou a frequentar cada vez menos a pousada desde então, já que o lugar lhe trazia lembranças sobre a mulher que ele uma vez amou. Consequentemente, Kennick e Lori passaram a se ver cada vez com menos frequência e agora sua relação de antes já não existia. Por isso Kennick passou a ter um receio de encontrar a garota, pois não sabia exatamente como se portar diante dela ou falar sobre o assunto. Também não sabia qual a seria a reação da moça ao vê-lo novamente, depois de tanto tempo sem uma única palavra de despedida entre eles.

 De volta de seu breve devaneio, Kennick, ao entregar de bom grado as rédeas, jogou uma moeda de cobre ao garoto, que sorriu ao ver que ganhara o dia.

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