*Cap. 6 - CASAMENTO

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Passaram-se três semanas desde que firmaram o acordo. E, naquele sábado, fim de tarde, Suna seguia com o motorista para o seu casamento. Quer dizer, a festa de comemoração do contrato de união estável, que tinha valor semelhante a um matrimônio sem divisão de bens, com direito à bênção de pastor e tudo. Ela havia enfrentado dias corridos. Fizera o depósito para Dante e se comprometera com o restante do dinheiro em seis meses. Ele havia resmungado, mas não a procurara mais. Sentiu que sua paz duraria até aquela quantia se esgotar.


Em poucas ocasiões, conversara com Max, sendo a maioria delas através do aplicativo de mensagens e os diálogos giravam em torno da única preocupação dele, a extensa lista de convidados. Já a sua, a pedido do neurocirurgião, incluía apenas a mãe e a avó, que não pôde vir, além de amigos do Maresia. Percebeu que ali, entre as pessoas convidadas, estavam as que ele precisava provar que está constituindo uma família. Não conseguia imaginar que fato tão forte poderia levá-lo àquela atitude extrema e concluía que estivesse escondendo a sexualidade, contudo, nunca poderia perguntar por aquilo.


O mais difícil havia sido enfrentar a surpresa das pessoas. Sua mãe, Fátima, perguntara se estava grávida; pobre mãe, tão cheia de alegria. Os colegas de trabalho e os proprietários do Maresia, dona Corina e senhor Carlo, a censuraram pela falta de confiança neles em não contar sobre o hipotético namoro. Maya a fizera dezenas de perguntas. E Suna havia ficado nervosa. A amiga a rodeara de indagações e suposições sobre o tal namoro relâmpago, que nunca tinha acontecido. Acabara por inventar que nada tinha revelado por superstição e por receio de alguém pensar que se envolvia por interesse. Sofria por mentir às poucas pessoas em quem confiava. E para sustentar a mentira do casamento havia contato outras tantas mentiras. 


E seguira naquela louca maratona de invencionices. Conhecera a mãe de Max, a viúva Maria Alice Maximo, que a havia tratado com desdém no primeiro encontro, mas, naquele dia, ela se esforçava em demonstrar simpatia. Enquanto se arrumava, a sogra de mentirinha a presenteara com uma joia da família, um brinco em forma de duas gotas, em ouro branco, cravejado de brilhantes, dissera que era para dar sorte. A mãe de Max era uma mulher em torno dos sessenta e poucos anos, elegante, magra e de seios empinados, pele de pêssego e cabelos loiros tingidos, provavelmente, nos melhores salões de São Paulo.


Mesmo com as agruras e desafios que enfrentaria, uma pontada de alegria florescia no coração da noiva, o que soava estranho. Ela atribuía aquilo ao fato de se sentir bonita. A maquiagem parecia de artista, escolhida entre os tons da paleta pastel, de forma a valorizar sua pele. O cabelo estava preso num coque trançado, adornado por um fio de pérolas. Escolhera um vestido longo branco, frente única, gola alta, marcando a cintura com finas pregas verticais, e com um pouco de roda na saia. As unhas foram feitas de modo impecável, num tom claro, e adornavam as mãos que carregavam o buquê de flores campestres brancas e amarelas. De repente, o carro parou. Era a hora de estrelar o ano de mentiras.


** 


A pianista começou a dedilhar a música "A Thousand Years", o sinal de que Suna iria entrar. O neurocirurgião Vicente Max se colocou em frente ao pastor convidado a dar a bênção e da mestre de cerimônia, que estava com o contrato de casamento. Atrás dele, posicionaram-se sua mãe, o irmão, João Paulo e a esposa, Isabela. Ao redor, os convidados ficavam de pé para vê-lo casar, principalmente, os que inundavam os corredores dos hospitais e grupos de redes sociais com conversas inapropriadas sobre sua vida sexual. O motivo que o levou a forjar um casamento se encontrava nas primeiras fileiras ali à frente de seus olhos, Mércia Arruda, a médica que havia se relacionado por quase um ano, cuja língua não parava de expelir veneno a seu respeito.

SÓ POR UM ANO (Degustação)Onde histórias criam vida. Descubra agora