Capítulo 29

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Rachel olhou para mim sem expressão alguma. Era como se não estivesse me escutando. Então ela me pareceu em estado de choque. Será que eu estava assim tão mal?

— Nós temos tantos planos — continuei. — Só vamos morrer depois dos oitenta. Ele se preocupa muito comigo, gosta de tomar conta de mim, e se não puder fazer isso, vai pirar. Além do mais, ele é tão forte e saudável, quase nunca fica doente, como vai conseguir lidar com esse lance de ter morrido?

— Ahn... Hummm... Deixe eu ver... — Isso nunca tinha acontecido. Rachel sempre tinha uma teoria sobre problemas emocionais. — Anna, essa barra é grande demais para eu segurar sozinha. Você precisa de auxílio profissional, alguém especializado nisso. Um psicólogo que lide com pesar e perdas. Eu lhe trouxe um livro sobre luto, talvez possa ajudar, mas você precisa se consultar com um especialista para...

— Mas, Rachel, eu só quero falar com ele, só isso! Não agüento imaginá-lo preso em algum lugar horrível, sem ser capaz de entrar em contato comigo. Afinal de contas, onde ele está? Para onde ele foi?

Os olhos de Rachel foram se arregalando, se arregalando e o desalento em seu rosto piorou.

— Anna... Olhe... Eu acho que você realmente precisa de...

Os homens de preto estavam de saída e, ao passar ao lado da nossa mesa, um deles olhou para Rachel e fez cara de espanto.

Seu rosto magro exibia marcas antigas de acne, olhos castanhos atormentados e cabelos pretos compridos. Ele não se sentiria deslocado dividindo um palco com os Red Hot Chili Peppers.

— Oi! — cumprimentou ele. — A gente já não se conhece? Da reunião na igreja de São Marcos? Rachel é o seu nome, acertei? Sou o  Ângelo. E aí, como você anda? Continua em conflito?

— Não — respondeu Rachel, de forma ríspida, lançando um olhar cheio de fagulhas, do tipo "não tem nada a ver falar disso aqui". Quase dava para ver as faíscas ziguezagueando pelo ar.

— E aí, você resolveu se casar com o cara?

— Sim. — Mais rispidez. Mas ela não resistiu à tentação de esticar o braço só para exibir a aliança de noivado.

— Uau! Casamento! Puxa, meus parabéns. Ele é um cara de sorte.

Nesse momento ele olhou para mim com ar de compaixão estampado nos olhos.

— E aí, gatinha? — cumprimentou, solidário. — Muito pesado esse lance, né?

— Você estava prestando atenção na nossa conversa? — A rispidez de Rachel voltou com força total.

— Não, mas é, tipo assim... — encolheu os ombros —... Meio óbvio, né? — Olhando novamente para mim, aconselhou: — Encare Um dia de cada vez.

— Ela não é viciada em nada! E minha irmã!

— Tudo bem, mas isso não é motivo para não enfrentar um dia de cada vez.

Fui para o trabalho pensando: Aidan está morto, Aidan está morto. Eu não tinha percebido a extensão dessa realidade até agora. Quer dizer, eu sabia que ele tinha morrido, mas nunca pensei que a coisa fosse permanente.

Eu me movia pelos corredores do trabalho como um fantasma, e quando Franklin me cumprimentou dizendo "Bom-dia, Anna, Como vão as coisas?", eu quase respondi "Vão ótimas; a única novidade é que meu marido morreu e nós estávamos casados há menos de um ano. Sim, é claro que você já sabia disso, mas eu acabei de descobrir".

Só que não adiantava nada dizer isso. Eu era notícia antiga para todo mundo e eles estavam tocando a vida em frente.

Estávamos indo jantar, só nós dois. O mais difícil de suportar é que isso era uma coisa que raramente fazíamos. Geralmente íamos a restaurantes apenas socialmente, para sair com amigos e outras pessoas. Quando estávamos só nós dois, o mais comum era nos encolhermos agarradinhos no sofá e pedirmos comida em casa.

Tem Alguém Aí? - Família Walsh Vol 4Onde histórias criam vida. Descubra agora