Cap. 07

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- Parabéns, vocês seis são merecedores desse distintivo. Vamos conseguir um Brasil melhor, tenham certeza disso. Vocês superaram medo, pressão, frio, fome, sono, fadiga. Tudo isso para dar um Brasil coerente para as nossas novas gerações. Mais uma vez, parabéns!

O Capitão terminou de dizer tudo aquilo e um agente passou a fazer o "ritual" ao distribuir o distintivo para nós. Chegou minha vez, eu era o último. O agente apenas colocou o distintivo no meu peitoral desnudo, sem cola e sem nada, óbvio. Bateu com força, era a minha vez de gritar o que eu esperei minha vida toda.

- CAVEIRA!!!!!!

Por fim, todos bateram palmas e imediatamente lágrimas desceram por meu rosto. Eu estava tão feliz, assim como Emerson e Eduardo. Pode parecer algo fútil e idiota, mas para nós isso significou tanto. Nunca tínhamos passado por nada igual. As provas para passar na militar não é nem um por cento de tudo isso. O que fizemos aqui vai estar em nossos corações, seja para lembranças ruins ou boas, para sempre. Pode ser uma história vivida a contar para filhos, netos, e até para nossos netos contarem aos nossos... Ok, estou indo longe demais. A emoção que sinto é como se minha vida inteira duvidassem de mim e eu, calado, prometia a mim mesmo que eu conseguia e podia. Aqueles que fumavam e usavam drogas na minha sala no tempo de colegial viviam dizendo isso. Que eu era um otário e não ia conseguir. Pois bem, parece que no dia 23 • 08 • 2016 o otário pegou um deles. E quem sabe o otário não pegue mais?

Se eu pudesse dizer para cada futuro militar, civil, federal, caveira, ou qualquer outro ser determinado em servir a polícia e o exército, eu diria para nunca desistir. Tudo vale a pena. Tudo tem um propósito e acontece por algum motivo. Antes de vencermos temos que perder. Perder bastante. Hoje eu posso dizer que me sinto cem por cento realizado. Sinto que o desejo de me tornar caveira não foi momentâneo, passageiro. O que será que minha mãe vai dizer quando me ver chegar na porta de casa? O que meu filho vai fazer ao ver o pai voltar dizendo que se tornou um caveira, o policial que tanto quis ser? Eu estou tão ansioso para contar logo a minha família; ou melhor, aparecer de surpresa e falar "família, eu voltei. E olhem só esse objeto em minha mão. Sim, é meu distintivo. Conheçam o mais novo caveira da família Sampaio".

Meus pais, meu irmãos, Beatrice, ninguém sabe o dia que eu supostamente voltaria. Eu disse que não sabia exatamente mas que não voltaria para o Natal, justamente para essa surpresa desse certo. Sim, finalmente vou poder fazer essa surpresa. Hoje eu vou ter a chance de participar da ceia de natal, o que eu pensei que não estaria presente.

Ao chegar em São Paulo a primeira coisa que vou fazer vai ser comprar o presente de natal e aniversário de meu filho. Pode não ser algo grandioso, mas acredito que ele vai adorar. Também quero comprar alguma lembrança para meus pais, minha família.

As únicas pessoas que sabem da minha volta é Mirella e Luís, meus melhores amigos. Eles com certeza a essas horas do campeonato devem ter pegado meu cartão em casa para eu poder efetuar o pagamento dessas compras que tanto desejo fazer.

•••

O avião pousou no aeroporto de Congonhas às seis e meia da noite. Aquele pensamento de estar cada vez mais perto da família, de meu filho, passava todo segundo por minha cabeça. Emerson e Eduardo também moram e trabalham em São Paulo, mas não no mesmo bairro que eu. Por incrível que pareça são da capital, como eu, assim podemos nos ver mais vezes sempre que pudermos e quisermos. Eles anotaram seus números de telefone na última folha de meu diário de bordo. Sim, ele já chegou ao fim. Quer dizer, finalmente, né? Isso tem tanto sentimento quanto alguém poderia ter. Quem e se alguém ler, vai sentir na pele o que eu passei pelas palavras e a forma que usei para escrever aquilo tudo. Até eu mesmo, daqui algum tempo posso ler e lembrar das minhas experiências em cada uma delas.

Peguei minha bagagem, no caso, duas bolsas grandes, e entrei no táxi. Falei o destino e esperei com a cabeça encostada no vidro do banco de trás. Que saudade dessa cidade linda. Eu olhava cada casa com a esperança de que a alguma hora uma delas fosse a minha. Meu pai provavelmente vai estar trabalhando, como em todos os outros natais. Seria bem frustrante não vê-lo lá, mas já me acostumei. Uma das piores coisas que ele fez foi ter se mudado para lá quando eu ainda era uma criança de dez anos de idade. Ele só passa um tempo aqui em suas férias, alguns feriados em que não trabalha e folgas, claro. Mas também só acontece quando ele tem dinheiro. Pois, ele envia para minha mãe uma quantia para manter a casa, já que apenas seu emprego de enfermeira não basta, ele também tem que se manter lá, né? De vez em quando ele manda algumas lembrancinhas para mim, meus irmãos e meu filho, mesmo não sendo obrigação dele, acho que ele se sente culpado pelo tempo em que perdeu longe de mim, de nós.

- Chegamos - o taxista informou. Olhei para a casa, continuava a mesma coisa, óbvio. Não mudou quase nada. A única coisa que eu acabei de perceber foi a mudança do jardim. Está colorido, florido. Com certeza minha mãe chamou meus tios para cuidar do jardim. A cerca também estava nova, já que as antigas estavam podres por conta da chuva. Essas pareciam mais resistentes.

- Obrigado - digo ao moço, que foi bem gentil, e lhe pago.

Sei lá, não sei se é porque eu estava com saudade de tudo isso que até as pessoas parecem diferentes. Parece que todas elas estão de bem com a vida. É, pode ser que provavelmente isso mude mais tarde, que seja coisa de momento, adaptação novamente.  Eu havia combinado com Mirella e Luís um dia antes de eu partir. A ideia era eu entrar vestido de papai Noel e dizer que fui... Espera, vamos deixar isso fluir.

Após passar em algumas lojas com Mirella e Luís para comprar os presentes e a roupa...

Voltamos para casa com o saco de presentes e a roupa. Calma, não eram presentes tão caros, por mais que eu quisesse, já que todos eles merecem. Me vesti atrás da casa de Papai Noel e espero sinceramente que ninguém tenha me visto. Coloquei a barba, por último e me posicionei na frente da casa. Mirella e Luís haviam entrado antes, falaram que foram comprar bebidas, e realmente compraram. Uns dez minutos depois eu toquei a campainha. Quem atendeu foi Miguel.

- PAPAI NOEL!!!

- Ho, Ho, Ho, garotinho.

Minha mãe apareceu logo atrás, junto a Beatrice. Aaahhh, que saudade delas. A minha vontade era de correr e partir para o abraço, mas também queria fazer suspense, então me segurei.

- Oi, quem é?

- É o Papai Noel, vovó.

- Sim, eu sei, meu querido... Mas...

- Fui chamado para alegrar o natal dessa família - digo alegre, com a própria voz do Papai Noel. Ou ao menos... Tentei.

- Entre, mas acho que houve um engano - ela diz.

Entrei pelo convite dela. Parei no meio da sala, deixei o saco de presentes no chão e olhei bem ao redor. Estava toda a minha família. Meu pai, minha mãe, meus irmãos, Beatrice, os pais dela, meu filho, meus amigos, os pais deles e também alguns tias, tios, primas e primos meus. Nem eu estava acreditando, provavelmente é o Natal mais animado dessa família.

— Tem certeza de que não me chamaram? — faço cara de desentendido.

— Sim, temos certeza.

— É uma pena, porque... — tiro o chapéu e a barba aos poucos.

Todos me olhavam atentos, ninguém sabia o que um Papai Noel doido desses estava fazendo.

— Cadu Sampaio voltou — finalizo após tirar toda a caracterização do rosto.

Meu Caveira (Concluído)Onde histórias criam vida. Descubra agora