Ataque aéreo

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Primeiro memorial

Ataque aéreo

"...quando, segundo meu julgamento, realizei meu primeiro ato heróico..."

Meu coração batia acelerado, sentia enjoo e ansiedade terríveis. E nada disso tinha relação com estarmos navegando em mares bravios. Foi a primeira vez em que fiquei assustado de verdade. Meu braço foi comprimido, agarrado pelas mãos nervosas de Págoras. O marujo, tão assustado, ou ainda mais que eu, cedeu ao desespero e disse chorando – Vamos morrer Quill! Vamos todos morrer!

Observávamos o mesmo horizonte com o sol prestes a descansar no leito do oceano. Aquela escuridão, pouco a pouco, sendo projetada sobre nós, tal qual um eclipse. Primeiro, avistamos uma nuvem escura que crescia rapidamente. Logo a mancha tomou a semelhança de um enxame de insetos. Em minutos, aquele enxame gigantesco cobriu parte do horizonte, e enfim, cobriu o sol. E lá estava a maior horda demoníaca que já havíamos visto.

O marujo estava quase enlouquecendo e encontrei forças para tranqüilizá-lo – Isso ainda não é certo, Págoras. Mas se nosso destino é morrer hoje, que seja lutando e de cabeça erguida.

Desembainhei minha espada, olhei-o nos olhos, era apenas um marujo comum, assim como eu. Era mais encorpado que eu e possuía cabelos claros e curtos. Fui enfático – Vamos amigo, prepare-se para defender nossas vidas!

Em resposta, ele enxugou as lágrimas e preparou-se para receber o ataque.

Logo estavam sobre nós. Nossa frota, composta por setenta e poucos navios, foi engolfada pela horda de demônios alados.

– Posições de defesa – gritava o capitão no convés principal, logo abaixo.

– Quill, Págoras – ordenou o capitão Zidaios – movam-se! Ajudem a baixar as velas.

Obedecemos sem pestanejar. Nosso capitão transmitia muita confiança. Enquanto fazíamos nosso serviço, ele continuava a disparar ordens a fim de deixar nossa nau em condições de defesa. Por um instante, nossos olhares se cruzaram, havia nele o brilho intenso pertencente aos ancestrais, mas não manifesto nos jovens como eu e Págoras, nenhum de nós, sequer havíamos completado o primeiro centenário. E naqueles tempos de guerra, muitos jovens pereciam. O capitão Zidaios Lazeth era alto e forte, com uma constituição física perfeita, conquistada e mantida através de persistente e constante rotina de treinamentos físicos, que poucos na tripulação conseguiam acompanhar.

Após meu breve momento de divagação, as bestas já caíam sobre nós. Eram monstros grotescos, de pele rugosa, dura e suja. Tonalidade avermelhada ou marrom, espinhos protuberantes e face maligna. Os dentes eram pontiagudos e desalinhados, olhos negros como piche e focinhos pontudos cheios de meleca pútrida. Seus corpos esqueléticos eram apoiados por longas asas sem penas. 

– Cuidado Págoras! – adverti. Um demônio investiu num rasante com uma de suas lanças de tosco acabamento. O marujo se safou no último instante e investi atingindo a besta na asa esquerda. O demônio perdeu o controle do voo e colidiu, enroscando-se nos cordames.

Uma linha de arqueiros próxima à amurada derrubava muitos antes que chegassem ao navio. Mais e mais vinham sem cessar. Na medida em que suas carcaças se acumulavam nos conveses, o fedor intoxicante do sangue escuro das bestas provocava ânsia de vômito. 

– Quill! – Págoras gritou enquanto era cercado por três ou quatro. Dei combate, cortando-lhes as cabeças, pois seus pescoços eram delgados. Já não podia salvá-lo. Uma lança estava cravada em seu peito. Ajoelhei-me para escutá-lo – Maldição – suas palavras custavam a sair – meu centenário... tão próximo...

Quill - O Exterminador de DemôniosOnde histórias criam vida. Descubra agora