Capítulo dez - De volta ao inferno

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   No ónibus, eu fico pensando no meu dia com o Grant. Ainda não acredito que ele me levou para andar de balão. Esses dois dias perto dele tem sido muito bons, mas eu tenho medo que isso termine. E ultimamente, eu tenho me dado bem com Quentin e Kathleen. Eles querem ser meus amigos de verdade. Infelizmente, a única pessoa que eu tenho um pouco de confiança é o Grant.
   Quando o ónibus pára, eu desço e vou caminhando até casa. Vladimir não deve nem desconfiar que eu não fui para a faculdade. Espero que ele não descubra o que eu tenho feito senão será o meu fim.
   Chego em casa e encontro a porta aberta. Mesmo sem entrar, já tenho vontade de chorar. Não quero olhar para aquele monstro. Eu quero fugir para bem longe dele. Se tivesse para onde ir, se tivesse dinheiro para poder sobreviver, eu iria para qualquer lugar.
   Entro em silêncio e fecho a porta do mesmo jeito. Para o meu desgosto, Vladimir está sentado no sofá com o seu habitual olhar dos infernos e não parece feliz em me ver. Pensei que viria até mim.
   Então, eu noto o balde de pipocas que eu pensei que estava no lixo. Eu não me lembro de ter deixado por cima da mesa. Eu sei que não. Jamais cometeria um erro desses. Eu até lavei a loiça e limpei as coisas para não suspeitar de nada.
   — Boa tarde! — Digo.
   — Boa tarde? — Ele levanta. — A tarde está sendo péssima. O que você fez enquanto eu estive fora, Mia?
    — Nada.
    — Não minta para mim! — Ele segura o meu braço e aperta com força.
    — Eu não fiz nada.
    — E porquê eu encontrei esse balde de pipocas no lixo?
    — Eu só fui no cinema.
    — Com quem?
    — Sozinha.
    — Porquê será que eu não acredito?
    — É verdade! — Choro.
    Ele me dá um tapa e quase caio no chão, mas ele me segura. — Vai continuar mentindo, Mia?
    Não digo nada.
    — Olha para mim! — Ele me obriga a olhar para ele. — Se eu descobrir que você saiu com um garoto... — Ele suspira. — Se descobrir que você me traiu, Mia. Eu mato ele!
   Ele me leva para o sótão. Luto nos seus braços, mas ele vence. Ele sempre vence e me tranca no sótão, depois de me jogar no chão com fúria.
   — Vladimir! — Eu bato na porta. — Por favor, não faça isso! Eu imploro.
   — Preciso descobrir o que você fez. Eu não posso permitir que você fique com outra pessoa. Você é minha, Mia. MINHA!
   Seus passos se afastam.
   Eu sento no chão.
   Nunca pensei que ele fosse revirar o lixo para saber o que andei fazendo. Ele chegou a um nível extremo. Essa obsessão está fazendo ele ficar pior. Ele está cada vez mais doente. Ele precisa de ajuda de um psiquiatra.
    — VLADIMIR! — Grito. Ele não regressa.
    Eu deito no chão em posição fetal e choro. Eu sei que só vai me tirar daqui no dia seguinte. Com sorte, se eu suster a respiração, eu morro sufocada. E assim não terei que sofrer nas mãos dele. Mas também não poderei ver Grant.

   Não consigo dormir. Não sei se é de noite ou de madrugada. Sinto fraqueza, frio e dor de cabeça. Procuro alguma coisa para cobrir o meu corpo, mas eu não encontro. Não tem nada aqui. Nem janelas tem.
   Fecho os olhos e tento fingir que vai ficar tudo bem. Eu só tenho que esperar mais algumas horas para poder sair daqui. Não deve demorar tanto assim. Vai ficar tudo bem. Sempre fica. Vou ficar bem.
   Já não sei do que estou falando.
   Oiço a porta e olho para Vladimir. Nem tenho forças para olhar para ele com desprezo. Eu estou tremendo. Não sei há quanto tempo estou aqui. Será que já é outro dia?
    — Mia! Você está bem? — Ele olha para mim.
    Como ele tem coragem de me fazer essa pergunta depois de ter me fechado aqui? Cada dia que passa, o meu ódio por ele só aumenta. Se eu podesse, eu diria para ele tudo o que eu sinto.
   Ele ajoelha ao meu lado e toca na minha testa com as costas da sua mão e arregala os olhos.
   — Você está ardendo em febre, meu amor! — Ele me coloca nos seus braços e levanta.
   Vamos para a sala onde ele me deita no sofá e vai buscar o termómetro para medir a minha temperatura.
   Vladimir vem correndo com o termómetro e com um pano úmido. Ele coloca na minha testa e acaricia o meu rosto com preocupação. Não sei, acho que ele está com medo. Ou talvez seja uma alucinação.
   — Você vai ficar bem!
   — Você não quer saber de mim. — Digo.
   — Não diz isso. Você não imagina como você é importante para mim. — Ele tira o termómetro da minha axila. — Meu Deus! Mia, você precisa ir para o hospital.
   — Não! — Eu fecho os olhos. Detesto hospital.
   — Eu não posso deixar que sua febre piore. — Ele me põe nos seus braços mais uma vez. E me leva para fora de casa. — Você vai ficar bem.
   Espero que ele não chegue no hospital há tempo.

Intensamente quebradosOnde histórias criam vida. Descubra agora