[''É normal que uma criança acredite em amigos imaginários, mas se continuar acreditando depois de crescer, isso deixa de ser normal, e passa a ser doença.'']
— 10 DE ABRIL DE 1971 —
Capítulo dezesseis
...
Micah andava despreocupadamente pela sua casa à procura do seu irmão. Não era sempre que estavam em bons termos, e esse felizmente era um dos poucos dias em que o procurava para lhe dizer algo bom. Sabia que isso apenas acontecia porque o décimo aniversário de ambos chegava e sempre tratava-o bem na data comemorativa. De qualquer forma, olhava para cada cômodo, espreitando como se fosse um detetive em algum filme besta de investigação.
— Ezra! — Chamou-o, irritando-se por não receber resposta alguma até agora; quem sabe ele tampouco estivesse em casa.
Caminhou até o fim do corredor, ouvindo conversas altas vindo do quarto do seu pai, lembrando-se que era mais um dos dias onde os amigos dele vinham para conversar sobre qualquer coisa que quisessem sem preocupar-se se falavam algo criminoso ou não. O ex-militar sempre lhe dizia para não ouvir nada, para sempre passar reto pelo cômodo nesses dias, mas nunca conseguia conter a sua curiosidade e, bem, dessa vez, não foi diferente.
Micah cuidadosamente aproximou-se da porta, abrindo-a com tanta delicadeza que certamente um detetive experiente teria orgulho de sua discrição, para só então espreitar o que realmente acontecia dentro daquele lugar. Para a sua sorte, todos estavam sentados de costas para a porta, graças à distribuição de móveis do quarto.
Na pequena televisão, um filme passava. A criança franziu o cenho e, apesar da pouca idade, já fora bastante exposto para todo o tipo de horror que evidentemente não deveria ter visto, logo não foi tão difícil compreender o que se sucedia. Era pornografia. Já tinha visto mulheres agindo daquela forma antes nas revistas que às vezes roubava do quarto do seu pai, mas sempre era diferente em vídeo.
Lá todos comentavam sobre a aparência da mulher em questão e ridicularizavam as próprias esposas, expondo como elas deveriam se portar e, para os solteiros, como sempre deveriam escolher uma submissa se quisessem ter sorte na vida. Ninguém gostaria de uma mulher que falasse demais, que perguntasse demais, ou que tampouco saísse muito. Eram nesses pequenos momentos em que Micah tinha uma noção de que tipo de mulher deveria ir atrás.
— Ei! — Porém, logo a voz do seu irmão chama a sua atenção, fazendo-o arregalar os olhos e fechar a porta rapidamente, afastando-se em instantâneo. — O que tá fazendo espionando o papai?
— Não tava espionando. — Respondeu nervoso, refazendo seu caminho ao começo do corredor, se defrontando com Ezra. — Só quis checar.
— Isso é espionar. — Revirou os olhos. — Ele disse que não podemos entrar no quarto quando ele tá com os amigos.
— Eu sei! Mas e daí? Eles nem viram nada mesmo. — Deu de ombros. — E você nem vai acreditar no que eu vi. — Sorriu, afastando-se.
— O quê? — Virou-se, à espera de uma resposta que não veio. — Ei, o que você viu?! — Gritou, correndo até o seu encontro.
— Não vou falar. — Cruzou os braços, parando de caminhar. — Mas é algo bem legal.
— Aqueles filmes de guerra sangrenta?
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Sentimentos Inaptos
HorrorE se você não conseguisse sentir nada? Isaac Evans é um adolescente portador de uma síndrome rara, que o impede de sentir qualquer estímulo externo em seu corpo. Em meio a descobertas circundantes à sua sexualidade e liberdade, também está atado aos...