Capítulo 15

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"Boa noite, dona Ruth" - eu disse, apoiando a minha bolsa em cima da mesa da cozinha - "O Oliver está em casa?"

"Boa noite, querida. Acredito que hoje ele só volte mais tarde!"

Ótimo. Eu teria tempo para esfriar a minha cabeça. Tudo que eu queria era enfrentá-lo, mas eu sabia que isso não traria boas consequências. Eu precisava me acalmar antes de sofrer com todo conhecimento que eu adquiri sobre ele naquele dia.

Resolvi tomar um banho e colocar uma roupa mais confortável, escolhi uma camisola e fui até a cozinha recuperar a minha bolsa. Dona Ruth estava lavando a louça quando eu entrei e peguei um pouco de água.

Eu estava percebendo que ela sempre estava cuidando da casa como se fosse a empregada. Ela abaixava os olhos para mim e me tratava como sua patroa. Mas por que? No final do dia, ela também não era uma Madraga?

Antes que eu pudesse fazer mais alguma pergunta, ela tirou seu avental e disse:

"Bom, por hoje é só. Estou indo para casa, querida."

"Casa?"

Eu jurava que ela morava conosco, em um dos quinhentos quartos.

"Sim, querida."

"Achei que a senhora morasse aqui, com o seu sobrinho..."

Ela deu um sorriso gentil, como se escutasse meus pensamentos e tivesse as respostas para minhas perguntas, mas não pudesse revelar demais, nem em uma expressão facial, quanto menos em palavras.

"Eu não pertenço a esse lugar, querida" - ela colocou a sua mão em meu ombro, como se tentasse me consolar - "Ninguém que vive aqui realmente pertence."

"Você deveria saber disso." - ela falou, pegando suas coisas e caminhando para o jardim, onde eventualmente desapareceu por aquelas ruas escuras.

Talvez fosse algo de família, sabe? As mentiras; os olhares que diziam tudo e ao mesmo tempo nada; a gentileza que poderia aparecer mas custaria caro; os olhos verdes que brilhavam com a luz do sol e tinham pequenos pontos de cor de mel.

Mas o que ela queria dizer com não pertencer? Para mim, não pertencer sempre seria minha história de vida. Mas o que significava para alguém que carrega um sobrenome poderoso? Uma família tatuada nas costas e homens dispostos a te defender com uma arma? Arma que, inclusive, é vendida por ele para outras pessoas.

E por que eu deveria enxergar bondade em pessoas envolvidas nisso? Talvez ela não soubesse, eu pensei. Mas teria como não saber? Se eu, uma forasteira, pude ver tantas coisas. Como ela teria ficado longe de tudo aquilo? Ou melhor, se ela soubesse, como teria aceitado?

Assegurei-me de que eu realmente estava sozinha na casa e decidi explorar, algo que eu deveria ter feito no primeiro dia em que coloquei os meus pés ali.

Segui o corredor até o seu fim e parei na porta dos aposentos de Oliver. Eu tive medo. Tive medo dele estar atrás de mim ou dentro do quarto, tive medo dele ser um fantasma que me perseguiria pro resto dos meus dias e não me deixaria ter paz por entrar no seu ambiente íntimo.

Em que merda que eu fui me meter?

Naquele ponto já era tarde demais. Eu havia me envolvido na vida dele, assinado documentos sem questionar e ainda vivia em sua casa. Eu estava nas mãos de Oliver e nunca, em hipótese alguma, ele me deixaria sair daquela enrascada sem nenhum arranhão.
A solução seria ir embora sem que ele descobrisse.

Eu ainda tinha muitas perguntas e esperava que seu quarto as respondesse. Para minha surpresa, Oliver não trancava a sua porta, me dando acesso completo ao lugar que ele passava parte do seu dia. Sua cama estava feita, indicando que ele não esteve ali nas últimas horas.

Tornar-se Janeiro (em pausa)Onde histórias criam vida. Descubra agora