ABRIL, 16. 2019.

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Com um grito seco preso na boca, Selena acordou desnorteada. O corpo gelado, as unhas perfurando o colchão macio com tanta brutalidade.

Ao abrir os olhos, pensou que estivesse de volta no pesadelo. O mundo inteiro estava escuro e silencioso.

Os músculos estavam tão tensos que precisou testar o aperto em sua mão, movendo devagar cada dedo para liberar o colchão e os lençóis.

Agora, totalmente desperta, não conseguia capturar os contornos do pesadelo que fizera seu corpo gelar, o motivo do seu terror cru. Havia sido um daqueles sonhos em que o mundo inteiro parecia ser consumido pelo fogo? Ou um dos pesadelos em que era perseguida por cães do tamanho de árvores, brutais e persistentes?

Era bom que não se lembrasse, assim as imagens não poderiam assombrá-la durante as manhãs.

O sangue dela, contudo, permanecia gelado de pavor. Um diferente pavor.

Que horas eram?

Selena sentou-se na cama. Marcus continuava dormindo ao seu lado, com o rosto enterrado entre os travesseiros.

Ela sentiu-se como se fosse sorrir, mas sua barriga estava vazia, a garganta seca e os membros duros. Sequer havia planejado dormir outra noite na casa dele, muito menos se lembrava como havia caído no sono.

Em vez de sorrir, mordeu os lábios.

Ergueu-se depressa da cama e vasculhou o quarto em busca da sua mochila. Chutou sapatos para o lado e bateu numa cadeira, machucando a sua cintura. Xingou-se baixinho, esperando encontrar Marcus acordado com o mesmo mal humor que mordiscava seus braços e pernas. Mas ele sequer se moveu.

Sem paciência, ligou a luz do quarto.

Óbvio, ela havia deixado a sua mochila caída perto da porta.

Apagou a luz novamente. Não precisava de outra pessoa irritada agora.

Ela meteu a mão e revirou os objetos, retirou uma pequena necessaire e o seu celular. Tentou ligar o celular, mas a tela dele permaneceu escura. Deveria ter descarregado. Quanto tempo ela já havia passado nessa casa? Duas noites?

Sentia-se estúpida por ter ficado, por ter medo de algo que não se lembrava, por ter esquecido novamente de tomar os seus remédios. Debaixo da raiva vermelha, ela se lembrava bem demais do olhar reprovador de sua mãe e das palavras amargas dela. "Você vai morrer".

Não adiantava pensar em memórias amargas.

Puxou para fora da mochila o seu carregador. Junto veio o fone de ouvido todo enrolado nele.

Selena suspirou. Mesmo que houvesse tido uma longa noite de sono, sentia-se como se tivesse corrido uma maratona.

Após ter colocado o celular para carregar, pegou a sua necessaire e trancou-se no banheiro. Ligou todas as luzes, antes de jogar os itens da pequena bolsa sobre o balcão da pia. Tubos vazios caíras; em cima deles, uma caixa pequena e um pacote com dezenas de agulhas, um frasco com álcool em gel e lencinhos. Ela havia usado sua última porção de insulina no dia anterior.

Que horas eram?

Precisava de outra dose, mas não havia nenhuma.

Mentalmente, xingou-se de todo nome terrível que podia imaginar.

Já havia sido irresponsável e esquecido seus medicamentos outras vezes, vezes o bastante para saber quanto tempo seu corpo aguentaria antes de começar a ficar perigosamente doente. Ela sobreviveria algumas horas a mais. Não havia razão para pânico, tentou dizer a si mesma.

A SIDE: SELENA // Under Your Skin //Onde histórias criam vida. Descubra agora