Capítulo XXVI

1.8K 163 3
                                    

Minha sogra estava melhorando muito, mas não ficaria cem por cento. Ela ainda estava com um pequeno atraso na fala, quase imperceptível, mas ainda presente, assim como quando andava puxava um pouco a perna esquerda, mas tinha melhorado muito como ser humano. Ricardo e eu tínhamos voltado para casa, mas a visitávamos todos os dias, assim como Elisa e Bruno. Meu casamento precisou ser adiado e como Ricardo e eu já estávamos casados, eu não fazia questão de pressa.
Chegamos na casa de minha sogra como sempre no mesmo horário, e Bruno conversava na sala com meu sogro, os cumprimentei e segui para o alpendre, onde estavam minha sogra e Elisa.
- Boa tarde - disse beijando carinhosamente minha sogra na testa e a abraçando forte.
- Oi minha linda, acabei de perguntar sobre você para Elisa - respondeu minha sogra abraçada a mim.
- Hoje atrasei, fomos na igreja falar com o padre - expliquei o que tinha me feito atrasar.
- Ah! Que bom, resolveu sobre o casamento? - perguntou Elisa.
- Adiamos para setembro, quem sabe você e Bruno resolvem casar conosco - falei sorrindo.
- Não vou mentir para você não, eu gostei da ideia, hein! - Elisa disse sorrindo e piscou para dona Lucila.
- Eu acho que devia mesmo, assim eu já choro de emoção uma vez só, vendo minhas duas filhas se casarem - Lucila disse se emocionando.
A abraçamos com amor e sorrimos, beijando-a.
- Minha sogra, já tem dias que quero perguntar algo para senhora e não tenho coragem, nem faz mais tanta diferença, é só curiosidade mesmo - disse tentando ir com calma.
- Filha, pode perguntar qualquer coisa - Lucila disse, dando-me abertura para a pergunta.
- Eu queria saber porque relutou tanto em nos aceitar em sua vida e na vida de seu filho? - perguntei na intenção de entender.
Elisa me olhou assustada, ela não esperava que eu tocasse nessa história, principalmente depois que ela já havia nos aceitado em sua vida.
Minha sogra se ajeitou na cadeira, como se estivesse muito incomodada.
- Olhem, eu vou tentar explicar e espero que me entendam, mas nada disso vai mudar o amor que tenho hoje por vocês, é só algo que aconteceu e me traumatizou muito - ela disse tentando se explicar antes de contar.
- Lucila, nada do que nos disser mudará nosso sentimento por você, fique tranquila - Elisa disse me olhando e eu concordei com a cabeça.
- Eu tinha cinco anos e minha mãe me batia muito quando eu pedia para repetir a refeição; várias vezes ela apontava meninas mais gordinhas na rua e dizia "você quer ficar um monstro como ela? gente gorda é nojenta, porca e acomodada, filha minha jamais será gorda". Muitas vezes eu chorava e não entendia, mas cresci com isso. Minha mãe não dava espaço nem para minhas amizades, muitas vezes me deixava sem comer como castigo e dizia que isso era para meu bem, assim eu continuaria magra.
Ouvíamos tudo com lágrimas nos olhos, imaginando a infância de Lucila, que passava fome só para não engordar e sua mãe semeando o ódio como alguém que faz lavagem cerebral em uma criança. Ela realmente não tinha culpa, aquilo ficou impregnado nela, na essência dela. Quanta maldade ela fez por estar vampirizada pela mãe.
Elisa e eu nos aproximamos dela e a abraçamos.
- Lucila, hoje você se tornou alguém melhor! Muitos seres humanos ficam vampirizados a vida inteira, semeando o ódio e angariando inimigos não só para esta vida, mas para as outras vidas também. Deus é tão bom que teve misericórdia de você e, através de uma doença, a reaproximou de pessoas importantes, acabando de vez com este sentimento que a destruía por dentro - Elisa disse deixando tudo mais tranquilo.
- Acho que minha mãe devia ter sido gorda, não é possível ter esse ódio tão grande, mas isso não me pertence mais, hoje graças a Deus e ao amor de vocês duas, que me acolheram com o perdão, sou um ser humano melhor - Lucila disse deixando lágrimas rolarem por seu rosto, nos emocionando.
Aguinaldo veio no alpendre e parou na porta sem ação ao nos ver emocionadas e abraçadas a Lucila.
- Oi meu bem, você quer alguma coisa? - Lucila perguntou a meu sogro limpando as lágrimas que teimavam em cair.
- Eu ia perguntar se você aceitaria ir a um churrasco na casa de Ricardo, eles já foram para casa arrumar tudo, o que acha? - ele perguntou receoso, sem entender o que estava acontecendo.
- Acho que será adorável, faz tempo que não saio de casa. Vou tomar um banho e já volto - Lucila disse se levantando e saindo rumo ao quarto dela.
Ficamos ali paradas e sentamos novamente, Aguinaldo se sentou ao nosso lado e pigarreou.
- Porque sempre que vejo vocês três juntas, estão chorando? - perguntou se ajeitando na cadeira.
- Senhor Aguinaldo, existem questões que estamos abordando com a Lucila, para que ela entenda o quanto a doença veio auxiliá-la, não algo que tenha vindo como castigo, e é normal que isso nos remeta a emoções. O mais importante é que sua esposa está mais humana, mais tranquila e principalmente, mais próxima de Deus. Ela entendeu que isso tudo aconteceu para resgatar a mulher que ela devia ter se tornado e para diminuir suas culpas. Existem pessoas que vivem uma vida toda sem essa chance, ou não conseguem enxergar o óbvio. Quando acontece algo como o que ocorreu com Lucila, elas se tornam piores, blasfemam dizendo que Deus é injusto, quando na verdade é uma forma de tentar abrir seus olhos para algo que precisa ser modificado - Elisa explicou a Aguinaldo, que ouvia atentamente.
- Elisa, você fala tudo com tanta certeza que a gente consegue entender que a vida é algo maior do que imaginamos - Aguinaldo disse surpreso.
- Senhor Aguinaldo, a vida é eterna, estamos aqui para resgatar erros e evoluir, alguns vieram com a missão de ajudar e outros de ser ajudados, depende de nós o que teremos pela frente, sua vida e as consequências dependem de sua ação, é a tal história da ação e reação. Claro que algumas pessoas precisam de uma sacudida, que é exatamente o que houve com a dona Lucila, Deus resolveu interceder, pois sabia que ela seria respaldada por nós que a amamos - Elisa concluiu deixando Aguinaldo de boca aberta, literalmente.
- Como podemos ter essa certeza? - ele perguntou tentando entender de onde ela tirava tanta certeza do que falava.
- Isso é algo que vem de dentro de você; claro que eu leio muito, não só a bíblia, mas livros espíritas e evangelhos para que eu tente entender. Não estou dizendo que sou espírita, sou uma curiosa, uso para minha evolução algumas coisas que leio e que penso se englobarem no que eu acredito. Para mim fé é isso, é acreditar em algo e colocar em prática em sua vida - Elisa disse fechando com chave de ouro.
Depois disso, o senhor Aguinaldo sorriu e bateu nas costas de Elisa com delicadeza e rebateu:
- Deus abençoe você por tanta sabedoria, quero começar a entender isso também - Aguinaldo disse sorrindo.
Neste momento minha sogra apareceu na porta, com um vestido fresquinho e com um lindo sorriso nos lábios disse:
- Vamos embora, estou pronta para um banho de piscina, meu maiô está por baixo.
Aguinaldo sorriu e a abraçou.
- Fazia anos que não a via tão disposta.
- Então aproveite! Eu sou hoje uma nova mulher que quer aproveitar tudo que deixou passar todos esses anos - minha sogra disse abraçada a meu sogro que a beijou nos lábios.
Elisa e eu sorrimos e levantamos, os acompanhando até a garagem.
Entramos no carro e seguimos rumo a minha casa.
Foi um dia lindo, fotografamos muito para deixar registrado um de nossos primeiros encontros em família.

O Poder Do Amor - Obcecada pelo chefeOnde histórias criam vida. Descubra agora