3 - parte 02

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DISPONÍVEL APENAS 8 CAPÍTULOS PARA DEGUSTAÇÃO.

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São quase dez da noite quando dois dedos se enfiam em minhas costelas e no susto, quase viro a bandeja de taças de Champagne. Mas consigo equilibrá-la enquanto Tim aplaude minha coordenação.

— Brilhante, senhorita! Realmente brilhante!

— Olá, parabéns pela festa. E pelo contrato com o governo, você deve estar muito feliz.

— Ah, então você prestou atenção a isso. Sim, meu irmão e eu trabalhamos muito duro e foi uma competição muito difícil. E isso vai alavancar de vez nossa empresa.

— Acredito que já sejam bem reconhecidos, a julgar pela quantidade de pessoas importantes nessa festa — comento e ele me olha admirado.

— Me surpreenda, senhorita Ayla. Me mostre alguém importante nesta festa.

— Além de você? — Ele ri e calo a boca enquanto busco com os olhos qualquer pessoa que me salve desse constrangimento, encontro e sem apontar o dedo, indico a direção com a cabeça. — O vereador Hélio Torquato e sua esposa. O chefe de gabinete do prefeito, com quem ele fala.

Giro mais um pouco e avisto outro importante casal, os olhos dele seguem o movimento da minha cabeça.

— O apresentador do jornal matinal e sua esposa, uma modelo bem conhecida. Nicholas Reymond, CEO da Empreiteira Reymond. Ele parece estar desacompanhado. Otavio Medina, o famoso arquiteto. Deve ser uma honra para vocês tê-lo aqui.

Ele assente e seu sorriso dessa vez não é divertido, e sim, admirado.

— Como sabe quem é ele? Ou quem é o CEO da Empreiteira Reymond? Você costuma acompanhar esses sites de fofoca?

Nego com a cabeça.

— Não tenho internet em casa. Mas eu leio muito. De tudo. Até jornal.

— Em que trabalhava antes da confeitaria e daquela boate onde nos conhecemos?

Abro a boca para responder, mas avisto Marisa me olhando de soslaio e não quero que pense que estou matando serviço só porque sou amiga do chefe, então estendo a ele um sorriso de desculpas.

— Sinto muito, mas preciso continuar servindo. Me ofereceram mais um trabalho no final de semana, então prefiro não arriscar.

Ele compreende e me parabeniza pelo bom serviço, e me afasto com um peso nas pernas. Tirando a noite na boate em que mais brigamos do que conversamos, nunca tivemos uma conversa tão íntima e preciso controlar meu coração que está sambando enlouquecido por vê-lo fazendo perguntas sobre mim. E porque seu sorriso pela primeira vez não era de zombaria.

Começo a pensar que dessa vez meus pressentimentos estavam errados. Nada de mal vai acontecer.


— Você conseguiu ver o irmão do Tim? A casa é dele, mas não há fotos e não o vi até agora — Sabrina me para quando estou prestes a descer as escadas que dão na parte de baixo do belíssimo jardim, onde fica o campo de futebol e de golfe.

— Acho que eles chegaram juntos, mas não o vi desde então. Acho que não. Não o conheço de toda forma.

— Será que ele é bonito como o Tim? Você não fica nem um pouco curiosa?

É aí que o universo age, e meu pressentimento se concretiza.

Giro a cabeça enquanto respondo Sabrina e vejo Tim ao pé da escada, prestes a subir enquanto sorri animado para uma ruiva que só pode ser modelo. Não é a loira com quem ele estava, mas é bastante íntima dele. Fico tão atordoada que piso em falso o primeiro degrau, me desequilibro e viro a bandeja com as taças sobre alguém que estava subindo. Mas o pior de tudo é que esse alguém evita que eu caia, mas também perde o equilíbrio e cai para trás, indo parar direto nos pés da escada.

Ouço os gritos à minha volta, de repente todo mundo se aproxima e só consigo começar a processar o que acabou de acontecer quando Sabrina coloca a mão gelada em meu ombro.

— Ah, Ayla, o que foi que você fez?

— Acho que matei alguém — respondo em pânico sentindo-me a própria Nazaré Tedesco, uma famosa vilã da televisão que matava pessoas empurrando-as escada abaixo.

E só quando meus ouvidos finalmente captam o que estão dizendo à minha volta é que me dou conta que a merda foi ainda maior.

— Senhor Eros? O senhor está bem? Precisa de uma ambulância?

Minhas pernas tremem e meu ar some quando puxo a blusa de Sabrina, parada ao meu lado.

— Ele disse Eros? Como se chama mesmo o irmão do Tim? Sabrina, como ele se chama? Por favor, não me diga que acabei de molhar e matar o dono dessa casa.

— Você fez isso — ela responde em um sussurro choroso.

Penso que vou desmaiar.

As pessoas aglomeradas na escada se afastam e um homem alto e elegantemente vestido, com seu belo terno encharcado surge de pé. Ele tranquiliza a todos dizendo que está tudo bem e sobe alguns degraus tentando ajeitar a roupa. Para diante de mim e começo a sentir que este é o ponto onde serei merecidamente humilhada e expulsa de sua casa. Consequentemente, da vida de seu irmão também.

— Você é bem desastrada para uma garçonete, hein? — comenta com um sorriso divertido enquanto seus olhos negros passeiam por meu rosto e corpo sem o menor pudor.

Sabrina sacode a manga da minha blusa desesperadamente, mas só consigo pensar em que palavras poderia dizer para tentar amenizar a enorme merda que fiz.

— Senhor, eu sinto muito, não queria matá-lo, menos ainda encharcá-lo, eu...

— Ah, então ter me molhado foi o pior? Eu poderia ter quebrado meu pescoço, sabia?

Além de sua voz divertida, e alguns murmúrios, não consigo distinguir mais nada do que possam estar dizendo. Penso que todos aguardam ansiosos qual será meu fim.

— Sim, senhor, eu sinto muitíssimo.

Meus olhos pousam nos dele, e tento decifrar se seu sorriso zombeteiro está calmo, ou apenas antepassando uma tragédia. Se está mesmo brincando comigo, ou me zoando antes de realmente me humilhar. Se Tim viu o que fiz, claro que viu! O que ele vai dizer então? Pensar em Tim me faz encontrar semelhanças entre ele e o homem parado diante de mim. Ele é mais alto, seu cabelo, ao contrário do de Tim, é mais comprido, e cai sobre um de seus olhos, o castanho escuro se misturando com seu olhar. A barba está perfeitamente aparada, não como a de Tim que sempre está por ser feita, a dele emoldura seu rosto. E tem os ombros ainda mais largos que o de Tim.

— Você não vai desmaiar, não é? Você precisa respirar — diz de repente me amparando pouco antes das minhas pernas cederem e eu desmaiar.


Quando acordo, estou na cozinha, Sabrina está ao meu lado aflita e Marisa com cara de poucos amigos. Ela me pergunta como estou, estendendo-me um envelope com o pagamento da noite e não precisa dizer mais nada. Noto que a maioria das pessoas já foi mesmo embora, mas com certeza fomos dispensados antes pela grande burrada que fiz. Procuro Ulisses entre os garçons, e o encontro já no portão dos fundos, com um enorme sorriso ao me ver.

— Quem diria que seria você a fazer merda hoje, hein, maninha?

Sabrina acerta um tapa mandando que ele se cale, e vamos no ônibus a viagem toda com ele repetindo orgulhosamente que fui eu quem ferrou com tudo dessa vez.

DEGUSTAÇÃO - Uma mentirinha de nadaOnde histórias criam vida. Descubra agora