fifteen papers, two legs

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Achamos melhor pintar o cabelo de Dahyun em sua casa. A garota me disse que seu chefe a despediria depois de uma semana sem trabalhar e paredes pintadas. Ah, é, Dahyun odiou a tinta roxa. Ela me fez voltar na loja para comprar outra cor. Escolhi o azul, achei que ficaria lindo nela. Qualquer coisa ficaria, na verdade. Ela falou que também não gostava muito de azul. Eu mandei ela ir se ferrar. Dahyun riu e pegou a sacola com a tinta da minha mão, ainda sorrindo.

Momo estava na cozinha, preparando algo para o jantar. Já estava escurecendo do lado de fora. Ela olhou para mim quando chegamos.

— O que ela está fazendo aqui?

Desviei o olhar para os quadros na parede, sem saber o que falar.

— Dá um tempo, Momori, por favor — Dahyun disse.

A outra japonesa pareceu surpresa. Eu também estava.

— Tudo bem — deu de ombros, meio contrariada. — Onde será que está a Sunny? – murmurou, abaixando-se para olhar debaixo da mesa.

— Momo — Dahyun falou calma.

Observei a garota morena se ajoelhar no chão. E achei que ela tivesse enlouquecido.

— Mas... eu tô bem aqui...

— Ah! — gritou. – Achei! — ela levantou-se com a gata que dei para Dahyun — Oi, coisa fofa.

A gata miou em resposta.

Momo — Dahyun rosnou.

— O nome dela é Sunny? — indaguei, sorrindo.

Momo alternou o olhar entre mim e Dahyun.

— Ah... — falou. — Ah. Você não contou pra ela — colocou a gata no chão de novo. – Foi mal.

Sunny veio cambaleando até meus pés, acho que um olho só a deixava um pouco desorientada. Ela se sentou e miou.

Um riso baixinho escapou de meus lábios. Agachei-me para coçar sua orelha.

— Oi, Sunny. Sabe, eu gosto bastante do seu nome.

— Eu não curto muito não — Momo falou.

— Sunny — Dahyun interrompeu.

Eu e a gata nos viramos na direção da garota. Dahyun quase sorriu.

— Que tal fazermos o que viemos fazer? — locomoveu a cadeira de rodas para seu quarto. — Quanto mais rápido você for embora, melhor.

Olhei para o bichano. Ela parecia estar dizendo "dá pra acreditar nessa louca?"

Suspirei.

— Nem me fale, Sunny... Nem me fale.

A menina virou-se para mim

— O que?

— Nada, só estava falando com a Sunny, ela é uma ótima ouvinte — brinquei, sorrindo.

Pude jurar que Dahyun também sorriu, quando rumamos até seu quarto.

[...]

O quarto de Dahyun era decepcionante. Quer dizer, mais ou menos, já que o lugar parecia uma galeria de arte, com todos aqueles quadros. Porém, eu ainda achava um pouco decepcionante. Geralmente, o quarto de alguém releva algumas coisas sobre a pessoa, no entanto, o dela não tinha retratos de quando ela era adolescente, ou livros para me dar uma pista do seu gosto literário. Será que ela preferia romances? Bem, dúvido muito. Ela não é esse tipo de garota. Pra falar a verdade, mesmo depois de dois meses sendo sua amiga, eu não faço a mínima idéia de que tipo de garota ela seja.

— Você ainda não me contou o que aconteceu com você... — falei enquanto aplicava a tinta azul em seu cabelo.

Dahyun fechou os olhos.

— Até que isso é bom — murmurou.

— Você está fugindo do assunto – revirei os olhos. — De novo.

Ela suspirou.

— Tem razão, Sunny. Talvez eu esteja fugindo do assunto porque não quero falar sobre isso.

— Ah, tudo bem.

Ficamos em silêncio por um tempo. Até Dahyun remexer-se desconfortável em sua cadeira de rodas, moder o lábio e falar:

— Eu estava em uma festa com Momo...

— Dahyun, você não precisa fazer isso se não quiser — disse, sincera.

— Sim, preciso sim. Então, eu estava em uma festa com Momo. Eu tinha dezessete anos, ela dezoito. Era uma daquelas festas que todo adolescente nessa idade frequenta: muitas bebidas, garotas, garotos e drogas. Eu não queria ter ido, mas, Momo me convenceu, dizendo que eu precisava de uma "companhia" — riu. — Ela garantiu que acharia alguém. Nem tive a chance de contar pra ela que, na verdade, eu gostava de garotas. Bem, nós estávamos lá e Momo já tinha desaparecido na multidão de pessoas e eu estava um pouco bêbada. Talvez muito. De repente, me senti cansada e enjoada. Queria ir pra casa. Eu não sabia dirigir, e as chaves do carro estavam com Momo. Então, liguei pra minha mãe.

Ela respirou fundo.

— Depois de uma bronca de vinte minutos, ela falou que iria me buscar. Fiquei no jardim esperando por ela. Me joguei no carro assim que ela estacionou na rua vazia. Não me lembro muito bem o que ela me disse, muito menos o que eu disse pra ela. Mas, me lembro dos gritos, do barulho de vidro se quebrando e de tudo escurecer.

Eu queria dizer algo, mas, não acho que tinha muito o que ser dito.

— Eu acordei no hospital e ela já estava morta. Nem pude me despedir. Dizer o quanto eu sentia muito e o quanto eu a amava. Meu pai gritou comigo por horas quando chegamos em casa. Falou que eu deveria ter morrido, e não ela. Às vezes, quase concordo com ele.

— Dahyun...

— Todos me culpam pelo o que aconteceu, Sunny. E sabe? Ninguém quer saber o que eu sinto. Ninguém quer saber que acho que vou enlouquecer só de pensar em passar mais um segundo desse jeito. Ninguém quer saber que além disso, sou uma mulher de vinte anos que anseia por viver. Ninguém quer saber que nem, ao menos, posso escovar meus dentes sozinha. Ou ir até o mercado e fazer minhas próprias compras. Ninguém quer saber o que os meus amigos e parentes já disseram sobre mim pelas costas, pensando que eu não posso ouvir. Ninguém quer saber que não vou saber como é fazer sexo, e nem vou aprender a dirigir. Ninguém quer saber que nunca mais vou correr, só por poder e querer. Ninguém quer saber como é ser eu. Eu sou, apesar de tudo, um ser humano. E tenho vontades, desejos, medos e sonhos. Sonhos, Sunny. Tenho tantos. Quero viajar. Conhecer o mundo. E não posso. Não posso porque arrancaram esse direito de mim quando eu era uma menina de dezessete anos.

Dahyun me olha. Acho que ela quer chorar. Fico calada.

Dou um beijo em sua bochecha. Ela pega em minha mão.

— Obrigada.

— Pelo o que?

— Por ainda está na minha vida, Sana.

XX

Eai gente, tudo certo?

Muito obrigada a vocês que são uns amores por estarem comentando, votando e comentando <3

Em segundo lugar, mas acho que isso é deveras mais importante:
#WELOVEYOUSANA!! Ai eu fiquei muito triste e puta com tudo isso, a Sana é muito anjinho para merecer isso poxa :( Vamos continuar dando muito amor a ela, que é o que ela merece, certo?

Beijos de luz <3

nina; saidaOnde histórias criam vida. Descubra agora