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(…)
Já haviam se passado quatro meses quando eu resolvi voltar a psicóloga.
Já devia estar em sua sala a quase dez minutos, porém ambos estávamos em completo silêncio até então.
— Você pode achar que é loucura. — Eu encarava o chão, me lembrando de cada detalhe. — Mas eu sei o que eu vi e o que vivi naqueles dias…
Eu a encarei, ela estava com o olhar parado olhando para a parede, provavelmente com mil pensamentos em sua mente.
— Everton… — Ela respirou fundo. — Eu não duvido de você... Adhara sempre teve a capacidade de encantar as pessoas… — Seus olhos se encheram de lágrimas. — Vejo que até mesmo depois de morta.
— Ela me disse que se sentia sufocada por não deixarem ela sair…
— Eu sei… Fomos bastante rígidos com ela mas era apenas para protege-la… Não queríamos que ela… — Ela voltou a chorar. — Não queríamos que ela…
Eu então finalmente olhei no fundo de seus olhos.
— Eu entendo. — Eu até mesmo depois de todo aquele tempo não conseguia acreditar.
— Eu espero que você possa encontrar paz dentro de sí mesmo depois de tudo isso… E encontrar alguém que…
— Eu vou sempre amar sua filha... — Eu continuava a encarar. — Não importa quantos anos passe.
— Você é um bom rapaz, Everton. — Ela disse tentando sorrir.
Ficamos mais um tempo em silêncio, era difícil digerir tudo aquilo.
— Eu acho que eu já vou. — Eu disse me levantando, ela se levantou também.
— Pode vir aqui sempre que quiser. — Ela abriu a porta.
— Tudo bem… Eu espero que você fique bem, assim como eu também espero ficar. — Eu olhei no fundo de seus olhos e via Adhara neles, desejava o melhor para ela naquele instante.
— Vamos ficar bem, Everton. — Ela sorriu. — Não tire os olhos do céu.
Eu sorri por fim, saindo de sua sala.
Nunca mais voltei até sua sala, soube alguns anos depois que ela havia se mudado para o Rio de Janeiro e que havia conseguido engravidar de novo, um menino dessa vez. Fiquei bastante feliz por ela quando soube.
Caminhei até a saída ainda me lembrando de cada detalhe que havia vivido naqueles dias, eu estava com olheiras e tomando remédios, não estava conseguindo dormir direito e quando dormia apenas sonhava com ela.
— Eai cara, como foi? — Pedro estava me esperando na porta de seu consultório.
— Difícil... Esta tudo muito difícil, cara. — Eu disse.
— Vai tudo ficar bem cara, eu sei disso. — Ele disse tentando me consolar, mas palavras não bastavam naquele momento.
Caminhamos até minha casa, ele tentou puxar assunto até lá mas minha cabeça estava longe, estava no céu.
Apenas me lembro que ele havia me chamado para ir a praia aquela noite com os outros caras, e por incrível que pareça, após quatro meses sem querer sair de casa, eu aceitei.
David passou na minha casa quase oito e meia com a caminhonete de seu pai.
Eu entrei e me sentei ao seu lado sem dizer uma palavra. Lembro dele tentar puxar conversa mas eu não dei moral, eu não estava querendo conversar com ninguém.
Logo passamos na casa de Pedro e Carlos, e Pedro me convenceu a deixar Carlos sentar onde eu estava e ele e eu irmos para trás na caminhonete.
E assim fizemos, Carlos foi na frente e logo eu e Pedro subimos e deitamos lá atrás.
— Se anima, vai ser legal na praia, faz tempo que não saímos. — Ele disse tentando levantar meu humor.
— Você sabe Pedro… — Eu respirei fundo. — Tudo ficou tão cinza.
— Você pode colorir tudo novamente. — Ele começou. — Você sabe bem que ela está sempre com você...
— O problema não é esse, eu estive com ela enquanto ela estava… Estava…
— Tudo bem… — Ele olhava para o céu estrelado. — Por mais que isso pareça muita maluquice aconteceu cara… E você foi para ela… Alguém que ela nunca teve… Foi o apoio que ela precisava… E pode ter certeza que ela vai se lembrar disso por toda a eternidade.
— Eu sei, mas…
— Calado, está na minha vez de falar. — Pedro disse, imitando como eu sempre falava. — Eu te amo cara, e sabe que eu apenas quero o seu bem. E talvez aceitar que tudo isso foi real e que foi uma experiência para o seu crescimento seja o melhor a se fazer. Você praticamente não tem mais TOC, você se tornou extrovertido e o mais importante, você aprendeu a amar… Por mais que tenha sido horrível ver o corpo dela naquele estado, eu tenho certeza que tudo o que passaram juntos apenas fez você crescer.
— Eu vou ama-la pelo resto da minha vida.
— Ela vai te amar pela eternidade. — Ele sorriu. — Tem algo mais bonito que isso?
Foi então que, ouvindo as palavras dele, após quatro meses eu finalmente abri um sorriso.
— Obrigado, por tudo. — Eu sorri, o encarando enquanto ele arrumava o óculos em seu rosto.
Ficamos ali olhando as estrelas até finalmente chegarmos a praia.
Os três desceram com tudo e foram rapidamente para a água, era uma noite quente de verão.
Eu os acompanhei até a areia, e sentei, observando eles indo com tudo para a água.
— Você não vem? — Carlos gritou me encarando.
— Prefiro ficar aqui! — Sorri.
Eu os observei se jogando na água, as ondas indo e vindo com sempre foi, era noite de lua cheia, e o céu estava claro e estrelado.
Eu observei cada um deles, sorrindo, se divertindo, e naquele momento apenas me senti grato.
Me senti grato por ter amigos com quem contar em todos os momentos.
Me senti grato por ter uma família que mesmo com alguns problemas acabamos nos entendendo.
Me senti grato naquele instante por ter vivido tudo aquilo, e que por mais que tenha tido um final tão trágico, apenas havia me feito bem, eu estava agradecido por naquela noite ver aquela estrela caindo, grato por conversar com ela e acabar me apaixonando pelo seu jeito que era inteiramente dela. Eu estava agradecido por ter passado cada segundo daqueles dias melhorando a mim mesmo graças a ela.
A vida é um sopro, agora estamos aqui, mas daqui a vinte minutos podemos não estar mais. Tudo é tão frágil e tudo passa tão rápido que não devemos esperar para valorizar as pessoas ao nosso redor, não devemos esperar para agradecer, para abraçar, para dizer eu te amo, porque quando tudo se acabar não teremos mais chances para fazer isso, e nos arrependeremos.
Naquela noite eu olhei para o céu enquanto estava sentado ali, eu olhei para ela, a estrela mais bela, a estrela mais brilhante e que eu tive o prazer de conhecer.
E enquanto eu olhava para o céu, eu a senti ali, me arrepiei quando senti seu toque em meu braço, eu sabia que era ela.
Eu sorri, até me sentir abraçado por aquela energia, respirei fundo e continuei olhando para o céu, enquanto ouvia meus amigos se divertindo na água.
— Eu te amo, Adhara.Começou a ser escrito em: 02/08/18
Terminou de ser escrito em: 21/09/18
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O TOC DA ESTRELA (2018)
RomanceQuando Everton vê sua estrela favorita cair do céu, sua vida fica de cabeça para baixo. Mas as coisas pioram quando a estrela se transforma em uma garota e agora além de enfrentar seu transtorno obsessivo compulsivo (TOC) e problemas familiares te...