Capítulo vinte e dois

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Pela primeira vez quando vi Pedro se aproximar de mim com suas mãos lambuzadas de ketchup enquanto comia um hambúrguer não me preocupei tanto se ele havia lavado as mãos antes.
  Claro, provavelmente ele tinha lavado e óbvio que devemos lavar, mas eu me sentia inquieto até perguntar se ele havia lavado as mãos, e de tanto em perguntar em todos esses anos, ele tornou lavar as mãos antes de comer um hábito. — O que foi bom para ele.
  Ele sentou ao meu lado e se pôs a comer seu hambúrguer. Enquanto ele comia não prestei muita atenção nele e estávamos calados, eu lia Entre Mundos da GJA Guimarães enquanto ouvia o som do pessoal da sala jogando vôlei.
  — Você ainda está se encontrando com aquela garota? — Ele disse subitamente enquanto lambia os dedos após terminar de comer.
— Adhara? — Senti meu coração acelerando quando falei seu nome.
— Acho que é ela mesma! — Ele sorriu.
— Faz algum tempo que não a vejo, fico preocupado em relação dela estar longe de casa. — Olhei um pouco além da quadra e vi que alguns alunos preparavam as decorações para a festa da escola, na qual eu iria tocar. — Quero que ela venha me ver tocar o violino.
— E você acha que ela vem? — Ele agora se levantava para lavar as mãos, eu o acompanhei.
— Creio que sim, quando contei para ela do evento ela ficou bastante animada. — Olhei novamente onde estavam os alunos e eles faziam uma facha com o nome da escola.
Fomos até o banheiro onde Pedro lavou as mãos rapidamente, lavou tão rápido que não havia nem ao menos dado tempo de limpar todas as bactérias que teriam em sua mão.
— Preciso te contar uma coisa… — Ele estava com um sorriso no rosto, era estranho, era difícil vê-lo sorrindo.
— Pode contar! — Estranhei o sorriso, estávamos saindo do banheiro.
— Ele pediu para que eu não comentasse com você,  mas você é meu melhor amigo cara, não tem jeito... — Estávamos na quadra novamente, agora em pé observando o jogo.
— Fala logo! — Já estava sem paciência.
— Então... — Ele deu outra pausa enquanto olhava o jogo. — Eu e seu primo David estamos ficando…
  Arregalei os olhos tentando expressar estar surpreso, mas quando eu os vi conversando naquele dia já sabia.
— Caraca, por essa eu não esperava, espero que vocês dois dêem certos juntos! — Sorri.
— Ele tem medo de te contar, não sei por…
Antes que ele completasse ouvimos um enorme barulho na quadra, estava acontecendo uma briga.
Nos aproximamos onde já estava uma aglomeração de pessoas em volta, dois garotos estavam no chão, um deles — O que estava em baixo. — Estava quase sendo nocauteado de tantos murros que estava levando.
Até que dois caras finalmente conseguiram os separar, e tão grande foi a surpresa quando vimos quem estava apanhando.
— É o Carlos! — Pedro disse surpreso ao vê-lo com o olho roxo.
Assim que separaram a briga, enquanto todos riam e o valentão que bateu em Carlos o xingava, ele saiu correndo e foi para o banheiro que era ali próximo. 
Quando o vi correndo me lembrei de quando éramos amigos e de como ele era.
— Eu vou tentar falar com ele. — Eu disse já indo em direção ao banheiro.
— Você está maluco? — Pedro parou em minha frente. — Depois de tudo que ele te fez, do tanto que ele foi filho da mãe com você, você vai atrás dele tentar ajuda-lo?
— Pedro, não tem como resolver o mal com o mal, é a mesma coisa que em vez de resolver a criminalidade com leis justas, armar a população para que tudo vire um faroeste. Se eu for como ele foi comigo, serei um ser humano tão ruim quanto ele. — Eu disse saindo e o deixando ali.
  Entrei no banheiro rapidamente e tranquei a porta, eu sabia que logo logo os "amigos" de Carlos iriam ali para colocar mais pilha para que ele brigasse.
  Assim que entrei me deparei com ele se encarando no espelho, ele estava com os dois olhos roxos e vermelhos.
  — O que faz aqui? — Ele disse com a voz trêmula assim que me aproximei.
  Me aproximei ficando ao lado dele, o vendo pelo reflexo no espelho.
— Eu… — Respirei fundo antes de continuar. — Eu vim conversar com você, Carlos.
— Não temos nada o que conversar. — Ele voltou a se encarar. — Depois de tudo que eu te fiz, não acha tolice de sua parte vir tentar me ajudar?
— Eu não acho que seja tolice. — Eu continuava o encarando. — Eu sei que você não é assim Carlos… Eu conheço você. 
— Você não me conhece mais… Eu não sou o mesmo que era quando tínhamos doze anos Everton.
— Eu sei o que aconteceu com você... — Respirei fundo novamente. — Se fosse a um tempo atrás eu teria ódio de você... Mas uma pessoa me ensinou a curtir cada minuto, porque agora estamos aqui, e depois podemos não estar… O que aconteceu com você de verdade foi que você achou que apaixonou por alguém…
— Olha, eu e a Amanda…
— Me deixa falar… — O interrompi. — O amor não é possessivo Carlos... Ele não faz você deixar seus amigos e ir atrás de popularidade… Aliás para que merda serve você conhecer todos da escola e ir em todas essas festinhas regadas por drogas? Me diz, quem estava lá te ajudando quando você estava apanhando? Me diz? Onde estava o Mateus quando você estava apanhando? Hein? Eu o vi filmando tudo.
— Ele filmou aquilo? Não acredito! — Carlos cossou a cabeça.
— Sim… E tenho certeza que todos os seus amigos estão rindo de você agora, e tenho certeza que mais tarde vão colocar pilha para você brigar novamente…
— Meus amigos, eles…
— Vamos corrigir… Carlos… Eles não são seus amigos…
  Ele abaixou a cabeça, e não a levantou mais até que eu saísse dali, eu sabia, a verdade doía, e naquele exato momento sabia que o durão da escola estava chorando.
  Ficamos alguns instantes em silêncio enquanto eu sabia que ele estava pensando.
— Ela disse que me amava… Íamos namorar… Mas aquele cara era… Um caso que ela tinha na academia… Ele ficou sabendo que eu estava querendo ficar com ela e bom… Você viu o resultado… Mas eu sei Everton… Ela já me amou
— Não diga essas palavras em vão, porque amar significa querer bem, significa querer estar próximo a outra pessoa, significa não trair… A Amanda nunca nem se quer gostou de você...
Novamente o silêncio tomou conta do banheiro, mas eu sabia que ele estava pensando sobre tudo que eu estava falando.
— Eu espero que você pense nas coisas Carlos… Ninguém do pessoal que você anda te quer bem… Acho que você já percebeu quem é que te quer ver bem… — Eu disse me afastando de onde ele estava. — Pense nisso… Tudo bem você errar, essa é a hora que você bate de cara na parede e vê todos os seus erros, mas se voltar a comete-los estará sendo idiota. — Eu disse indo em direção a saída. 
  — Everton, espere! — Ele enfim levantou a cabeça. 
— O que é?  — Voltei a encara-lo.
— Eu quero pedir desculpas pelo o que te fiz… Você sabe… O lance de te jogar a rã, gravar e jogar na Internet... Você é o único que está comigo de verdade.
Eu sorri, indo novamente em direção a saída. 
— Eu te desculpo, amigo. — Disse vendo por fim um sorriso em seu rosto que estava todo inchado.

O TOC DA ESTRELA (2018)Onde histórias criam vida. Descubra agora