A Face do Disfarce

Deveria

         Após contar no mínimo quinze passos, me levantei saindo da pista de skate e comecei a seguir os dois, que andavam normalmente e aparentemente sem conversar. Houve uma hora que o Hugo olhou bem para o homem e eu vi sua expressão mudar. Ele era bem mais forte e velho que nós dois, tinha os cabelos pretos, lisos e um pouco grandes até. Um piercing no septo e os olhos verdes. Talvez uns vinte e oito anos...

       Andamos até próximo ao bar, então seria esse o chefe, o amor da Izzy ou devo dizer que é da Sara? Ainda é tudo muito confuso em relação a essa garota. Me dá até cansaço mental só em pensar nela. Quando finalmente chegamos, estávamos em um depósito que eu acreditava ser abandonado. Quando os dois entraram, um grande estrondo aconteceu, o portão estava muito velho e enferrujado.. Ou seja, não tinha possibilidade de bisbilhotar dentro do galpão, sem ser percebido ao abrir novamente esse portão. Corri pelos lados do galpão afim de encontrar um lugar para escutar e até ver o que eles estavam fazendo. Na verdade meu instinto queria proteger o Hugo.

        Assim que parei de correr do lado direito do galpão, encontrei uma janela, e por sorte estava sem vidro. Com nenhuma dificuldade consegui entrar, e me esconder por trás de uma caixa. O cheiro era muito forte, aqui havia drogas?  Quando finalmente consegui ver os dois, o Hugo levou um murro no rosto. Arregalei os olhos, e meu coração acelerou, quem ele pensa que é? Após isso as agressões continuaram e Hugo nem se quer reagia, não posso deixar assim, não posso ficar aqui o vendo desse jeito.

         Procurei algo para me defender, afinal mesmo malhando ainda apanharia dele. Seria covarde bater nele com uma barra de ferro? E ainda seria covarde deixando meu amigo sofrer desse modo... Corri por trás das caixas, enquanto os chutes não paravam, Hugo estava quase inconsciente. Que raiva! Havia um bastão de alumínio, um pouco enferrujado. O peguei, e sem pensar duas vezes, corri até o homem, que calmamente parou de chutar o Hugo. E me encarou. Seus olhos verdes estavam pura maldade, mas por azar dele, meu corpo todo estava ardendo em ódio. Dei um golpe forte com o bastão, e pegou em seu rosto, ele riu.. Parecia inútil para ele?  Dei outro golpe e, felizmente pegou em cheio, ele caiu no chão, espero que seja morto,  que é muito improvável. Eu estava tremendo, quase chorando. Hugo estava ensanguentado, em um estado deplorável. Com dificuldade levantei meu amigo e levei o bastão comigo, estava me dando sustento.

(...)

- Mas que caralho, porra.. - Ana olhava para mim, e em seguida para o Hugo e ficou assim por muito tempo, tentando entender o que tinha acontecido. - Eu vou arrumar isso, hu... - Ela disse saindo de perto de nós.

   A casa da Ana era o local ideal para deixá-lo. Ela ia cuidar muito bem dele.. A ruiva voltou com um pote com água, soro, e algumas gases. Se ajoelhou perto do fumante que agora estava desmaiado e começou a limpar seus ferimentos. Havia sangue nas bochechas, saindo da boca, no nariz e seu olho estava roxo. Hugo apanhou muito, e aparentemente nem tentou se defender. Após acabar com os curativos, Ana o deixou dormindo em sua casa e me puxou pelo braço para fora do quarto.

- O que foi isso? - Ela estava nervosa.

- O cara, o chefe de vocês eu acho.. - Passei a mão na cabeça. - Vocês tem que sair disso, Ana.. Puta que pariu, não tem necessidade.

- O quê? - Ela me deu um tapa no braço. - Você não sabe de nada Richard.. Eu estou com medo de perguntar, mas você não se envolveu nisso, né?

- O que queria que eu fizesse? Deixasse ele matar o Hugo.

- Não.. Mas.. - Ela bufou. - Que inferno. - Ela disse por fim. - Ele viu seu rosto, você atacou ele por trás... Como..

- Eu bati na cabeça dele com essa barra de.. - Eu olhei, ela estava bem mais pesada, não era alumínio, era ferro. - Essa barra de ferro. - Engoli à seco. Uma barra de alumínio não o mataria, mas uma de ferro.. Talvez..

- Você matou ele? - A Ana talvez estava torcendo por isso.

- Acho que não.

- Então deveria.