15. Cassian

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Havia dor. Muita dor, tanta que nem podia focar a visão no quarto ao meu redor ao gritar a cada mínimo movimento dos meus músculos feridos e exaustos. Eu estava exausto. Ouvia vozes ao meu redor, mas não podia dizer há quanto tempo estava ali, ou mesmo o que estava acontecendo, perdendo a consciência tão rápido quanto acordava a cada pontada de dor.

Meu mundo havia sido resumido a dor e pesadelos, pensando se um dia isso iria acabar. Eu queria que acabasse, não importava como. Toda vez que aquele líquido viscoso e horrível tocava minha boca, agradecia a oportunidade de voltar a dormir que recebia com alegria como a única alternativa para acabar com aquele tormento. Eu poderia aguentar aquilo por muito mais tempo? Será que a possibilidade de nunca mais voar valia em troca do fim desse sofrimento? Sabia que se estivesse em meu melhor momento, a resposta com certeza seria "não", mas com tanta agonia, começava a duvidar do quão persistente eu podia ser. Que meus amigos nunca me ouvissem, meu Grão-Senhor e irmão iria me socar se soubesse que pensamentos assim rondavam minha cabeça, mas não havia mais nada em que eu conseguia pensar, quando a dor encobria qualquer racionalidade na minha mente.

Senti mãos macias tocando meu rosto, secando as lágrimas que escorriam sem parar. Uma voz que há muito não escutava cobria os sussurros naquele quarto, e vi longos cabelos negros e uma orelha pontuda de feérica ao abrir os olhos momentaneamente, contendo um grunhido quando aqueles dedos gelados tocavam as feridas sempre sangrando das minhas asas destruídas.

— O que fizeram com você, Cass?- Ouvi aquela voz sussurrar.- Como pôde permitir isso?

Eu queria respondê-la, queria dizer que iria aguentar, fazer alguma piada para vê-la rir depois de tanto tempo sem ver aquela fêmea, mas eu nem sabia se aquilo estava mesmo acontecendo ou se era só um sonho, a névoa dos remédios para me fazer dormir começava a confundir meus sentidos. Estava tão cansado.

— Acha mesmo que pode fazer alguma coisa?- Ouvi uma voz masculina dizer. Parecia Azriel, mas era difícil ter certeza quando sentia meus batimentos cardíacos rugindo nos meus ouvidos e abafando qualquer outro som.

— Eu não teria vindo se não pudesse.- A meio Illyriana dizia, correndo aquelas mãos geladas pelos meus ombros, onde me apoiava no colchão macio, a única coisa concreta naquele meu estado deplorável e semiconsciente. Eu queria que ela saísse, para que não visse como eu estava destruído e ferido, mas não tinha forças nem para dizer alguma palavra coerente. Senti seu olhar sobre mim, e apesar da dor, apesar de sentir como se não fosse sobreviver até o dia seguinte, eu levantei meu olhar, me esforçando para focar naquele belo rosto feminino e os cílios longos lançando sombras sobre os olhos negros.- Escutei-o pedindo minha ajuda, e vim por ele. Sempre viria.

Eu não sabia se estava falando comigo ou com as outras pessoas no quarto.

Seu sorriso doce entrou em foco quando senti suas mãos nas minhas costas, luz azulada brilhou entre nós, cobrindo meu corpo ferido e cansado. Instantemente, senti um enorme alívio, como se um peso fosse tirado das minhas costas. Me permiti uma longa respiração, como há dias não fazia, quando percebi que os fios de sangue paravam de escorrer nas asas sensíveis, tão sensíveis e machucadas. E aquela luz azul, ao se sobrepor sobre mim, parecia curar tudo aquilo que parecia que ia me matar. A dor sumiu então, me senti aliviado e grato pelo que ela fazia por mim, mesmo depois de tanto tempo sem nos vermos, e sem pedir nada em troca. Eu devia mandá-la embora, devia ficar com raiva, mas naquele momento só estava feliz em vê-la.

— Sky...- A voz estava baixa e rouca quando sussurrei, apesar da dor em minha garganta, como se estivesse gritando há dias. Talvez estivesse.

— Está tudo bem, Cass. Vai ficar tudo bem.- Seus dedos acariciaram meu rosto enquanto a luz foi perdendo a intensidade, no entanto, a dor não voltou. Me sentia anestesiado, embora não soubesse que magia ela tinha feito.- Você vai ficar bem. Curado. Vivo.

Corte de Ventos e MagiaOnde histórias criam vida. Descubra agora