29. Skylar

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— Ainda dá tempo de mudar de ideia.

Vivienne havia acabado de abrir a porta da carruagem azul gelo, com Kallias já esperando lá dentro. Empregados carregavam malas no compartimento atrás dos bancos, e cavalos brancos como a neve batiam os pés e relinchavam, ansiosos por um passeio.

— Está brincando? Estou adorando poder dar um tempo desse castelo.- Disse ela.- Quer dizer, adoro esse lugar. É minha casa, mas não me lembro a última vez que tive férias.

Ri, minha respiração criando nuvens de fumaça ao entrar em contato com o ar. Ali era frio o ano inteiro, mas aquele era o ápice do inverno em toda Prythian. Se era frio o Solstício de Velaris, ali era congelante. Qualquer um sem o inverno no sangue jamais se adaptaria àquela cidade.

— Faz um tempo que também não descanso.

— É por isso que será uma excelente governante.- Vivienne respondeu. E olhando brevemente para Kallias, deu um passo à frente, como se estivesse me revelando um segredo. Desci um degrau das longas escadas em frente ao castelo, me aproximando mais da pálida fêmea.- Talvez eu até convença meu marido a nem voltar. Poderia te deixar como a mais nova Grã-Senhora.

Arregalei os olhos, surpresa.

— Não acho que seria uma indicação adequada.

— Seria perfeita!- ela exclama.- Vi o gelo ao redor de você naquele dia. É seu destino sentar naquele trono um dia, depois que não estivermos mais aqui. Considere esse tempo por aqui como uma experiência, um estágio. Um dia, tudo isso será seu.

— Não me acho adequada para o cargo.

Vivienne sorriu.

— Os melhores governantes não acham.- Ela deu tapinhas no meu ombro direito.- Está tudo bem, você já lidou com as mesmas questões antes. Não vai ser muito diferente de lidar com as terras de seu pai.

Balancei a cabeça.

— Vou ter que discordar.

Dessa vez, foi Vivienne quem riu. As terras illyrianas eram uma coisa, mas uma Corte inteira? Aquilo era um absurdo!

— Vocês duas vão ficar conversando aí fora por mais quantas horas?- Kallias reclamou de dentro da carruagem. Estava enrolado em cobertas e sentado quase esticado no banco inteiro, a única maneira que se sentia confortável enquanto estava com dor.

— Macho impaciente!- Vivienne lhe retrucou.- Estou me despedindo, por que não faz o mesmo?

Kallias acenou. Retribui o gesto.

— É tudo que tem a dizer?- A fêmea apoiou as mãos na cintura, olhando-o feroz. Era óbvio quem estava no controle.- Nem um tchau?

— Mulher, estou com dor e com frio, vamos logo! Já foi conversa suficiente por hoje. Deixe o resto para a volta.

— Você é inacreditável!- Vivienne apontou-lhe o dedo.

Só podia rir, me lembrando de outro casal de parceiros não muito diferente.

— Está tudo bem, deixe-o descansar.- Afirmei.- Posso lidar com uma Corte por um tempo, mas só por um tempo.

— Aposto que vai mudar de ideia quando voltarmos.- Vivienne virou-se para mim mais uma vez.- Vou te convencer que seu lugar é aqui, juro pelo Caldeirão.

Dei de ombros.

— Talvez.

Vivienne puxou-me para um abraço, surpreendentemente caloroso para um lugar tão frio. Ela era muito diferente da maioria dos nascidos naquela Corte. Nem eu podia agir como ela, mesmo tendo sido criada em outro território. Gostava de Vivienne, apesar da amabilidade me parecer incomum. Me deixava desconfortável também, algumas vezes. Para uma filha do gelo e da guerra, aquele não era um comportamento natural.

— Cuide-se, Skylar. Você e seu guerreiro.- Ela sussurrou próxima ao meu ouvido.- Sei que deixo minha casa em boas mãos.

Retribui o abraço, ainda que um pouco desajeitada.

— Boa viagem.

Os empregados já haviam se afastado, e o cocheiro aguardava pacientemente em seu lugar à frente da carruagem.

Vivienne me soltou, juntando-se ao marido no banco acolchoado e de aspecto macio. Fechei a porta para ela, e quando o cocheiro ordenou aos cavalos que caminhassem, permaneci de pé no mesmo lugar, assistindo-os irem embora.

Suspirei, absorvendo o ar gelado da Corte Invernal quando a carruagem sumiu no horizonte. Observei as casas de telhados cobertos de neve, as ruas movimentadas por feéricos de casacos pesados e cabelos brancos. Um lugar muito diferente de qualquer outro que já tivesse conhecido.

Cada Corte era um verdadeiro mundo à parte, e pelo visto, aquele era meu, pelo menos por um tempo.

Corte de Ventos e MagiaOnde histórias criam vida. Descubra agora