12. Skylar

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Consegui a permissão de chamar meus contatos para a casa da cidade. Se pretendíamos transformar aquele território em campo de batalha para que Hybern não chegasse ao resto de Prythian, era bom conhecer os segredos e lugares escondidos naquelas terras.

Batalhas já foram ganhas graças ao conhecimento do ambiente onde ocorreram. Geografia era muito importante para a estratégia em batalha, e se não pudéssemos usar trincheiras nas áreas não habitadas onde tentaríamos conduzir a guerra, se ela acontecesse, era bom conhecer bem as florestas e campos para saber o que podíamos usar a nosso favor. Hybern não teria essa vantagem, pois eles estariam em território inimigo.

Mandei uma mensagem para os dois irmãos illyrianos que estudavam o território não habitado e eles prometeram me encontrar em Velaris. Os dois entraram em contato comigo há alguns anos, quando precisavam de um especialista na fauna local para garantir que pudessem sobreviver à uma área potencialmente perigosa de mata durante uma de suas expedições. Eu havia conhecido aqueles irmãos assim, graças a um interesse em comum, mas logo descobri que a avidez pelo saber não era a única coisa em que éramos semelhantes.

A sorte é que eram gratos a mim o suficiente para se arriscar fora de seu território, em uma cidade que não gostava de receber estrangeiros, desde que havia sido tão brutalmente atacada há menos de 2 anos. Ainda via ruínas e andaimes espalhados pelas ruas, as construções aos poucos voltando ao que eram antes, mas via que o trabalho de restaurar a cidade ainda demoraria para ficar pronta. Se eu pudesse estalar meus dedos e devolver toda a glória de Velaris, já o teria feito há muito tempo. Era uma pena que ninguém pudesse fazer algo em escala tão grande.

Caesar e Andrews chegaram no início da tarde. Eu os encontrei no corredor, enquanto carregava uma pilha de livros especialmente pesada até a mesa da sala. Com grande parte do Círculo Íntimo fora da cidade, tinha espaço e tempo para trabalhar fora da biblioteca, e a mudança de ambiente me agradava. Caesar pega alguns dos livros que carregava, me ajudando a levá-los para a mesa que já tinha enchido de papéis e mapas. Apesar de serem idênticos, sabia diferencia-los graças aos detalhes que os tornavam únicos. Com o tempo, fui capaz de notar como Andrews era mais curvado do que o irmão, com o cabelo cortado sempre mais curto, enquanto Ceasar era o extremo oposto, um guerreiro forte e alto que o irmão nunca quis ser. E cada vez que os encontrava, se tornava mais simples definir quem era quem.

Um mapa completo da Corte Noturna e dos territórios Illyrianos estava aberto sobre a mesa, mantido esticado por pedras de jardim posicionadas nas laterais. Elain havia se assustado quando me viu mexendo em suas flores, mas não tinha dito ou feito nada, e eu levei isso como sua permissão, se é que era necessária uma em troca de algumas pedras. Nos sentamos à mesa e eu expliquei a situação aos dois, enfim revelando o motivo de tê-los chamado ali com tanta urgência. Por sorte, os gêmeos aceitaram me ajudar e mostrei-lhes os livros de geografia, pedindo que fizessem o possível para me contar sobre o que tinham explorado por conta própria desde aquela expedição, pois atualizar o mapa com descrições e anotações recentes podia ser o motivo de ganharmos as batalhas ou não. Conhecer o território devia ser nossa maior vantagem agora.

Cassian chegou quando trabalhávamos, mas percebi seu desconforto ao notar que eu não estava sozinha. É claro, os dois eram desconhecidos para ele, apesar das asas deixarem claro de onde vieram.

— Esses são Caesar e Andrews, Cass.- Eu os apresentei, quebrando o silêncio repentino.- São os contatos de quem falei.

Cassian assentiu e se juntou a nós ao redor da mesa.

— Primos, esse é Cassian, Comandante de Rhysand.- Continuei.- Espero que ele possa ajudar também.

— Toda ajuda é bem-vinda.- Disse Andrews, assentindo.

Com um dos livros de mapas aberto nas mãos, Cassian segurou meu braço, aproximando-me dele, o que só podia significar que queria me dizer algo em particular.

— Você não me disse que tinha primos.- Ele sussurrou. Parecia quase...Irritado? Seria ciúmes?

— São os filhos da irmã do meu pai.- Disse em resposta, afastando-me, mas mantendo o tom de voz.- Eu os conheci há pouco tempo, nem sabia que a irmã dele havia tido filhos, mas eu verifiquei. Pare de reclamar e faça algo de útil.

Joguei o primeiro livro da pilha para Cassian, então, encerrando o assunto. Se queria ficar comigo aqui hoje, então leria aqueles volumes também.

Ceasar levantou-se em algum momento, quando todos já estávamos fartos de tantas palavras e trabalho. Andava pelo ambiente, procurando algo nos armários da cozinha no cômodo ao lado, onde podíamos vê-lo. Provavelmente queria comida, mas poderia ter simplesmente pedido.

Esse irmão tinha o costume de mexer em tudo, menos em livros. Enquanto Andrews era silencioso e inteligente, Ceasar se mostrava o extremo oposto. Eu diria que um deles havia roubado toda a inteligência, enquanto o outro havia ficado com a força bruta ainda no útero. Útil nos campos de batalha, mas péssimo para o comando, era isso que Ceasar era. Há muito tempo eu e Andrews já havíamos deixado de esperar qualquer grande manifestação de lógica de alguém como ele, mas Cassian não sabia disso, e franzia as sobrancelhas com certa irritação enquanto meu primo se movia pela casa.

— Soube que tem um novo bichinho de estimação, Sky.- Comentou Ceasar.- Como é o nome dele mesmo?

Tirei os olhos do livro e soltei a caneta que usava para fazer anotações sobre a mesa, observando o macho andando pela casa.

— Ah, deve estar falando de Kyllian.- Disse, por fim.- Quem te falou sobre ele?

— Acho que é difícil um lobo gigante não chamar atenção.- Meu primo me olhou brevemente enquanto vasculhava a vidraçaria.- Não deve ter pensado que manteria um animal daquele tamanho em segredo por tanto tempo, não é?

— De fato.- Sorri.

Cassian se levantou, então, tirando das mãos de Ceasar o prato de porcelana que havia acabado de tirar da prateleira, o empurrando dali e fechando o vidro com a chave da porta.

— O que pensa que está fazendo?- Questionou Ceasar. Aí estava uma luta de igualdade. Contive o sorriso, apenas observando o que iria acontecer, a briga começando ali. O que podia fazer? Eu era uma criatura caótica.- Essas coisas eram da mãe de Rhysand, não tem permissão de tocar nelas. É pior do que uma criança.

— Acho que demônios são mais fáceis de lidar do que com você, Ceasar.- Comentei e acabei por soltar uma risada. Por sorte, Andrews concordava comigo, porque até mesmo ele não pôde deixar de sorrir, apesar de tentar se conter.

— Você sempre se deu bem com demônios e cães, priminha.- Ceasar disse ao focar seu olhar em Cassian.

Uma provocação clara.

— Até mesmo o maldito lobo das neves é mais inteligente que você.- Cassian rosnou.- Mas Skylar sempre gostou de criaturas estranhas. Por que me surpreenderia?

— Deve ser por isso que gosto de você, Cassian.- Respondi controlando a voz, mas mantive o sorriso discreto ao apoiar os pés na mesa, o livro aberto no colo. Muito mais confortável.

Andrews e Ceasar riram então, sem se importar se Cassian ia ficar irritado ou não, mas eu sabia como ele reagia às minhas respostas afiadas.

— Até sua parceira faz piada de você.- Ceasar ria.- Quanta credibilidade!

Parceira. Congelei com suas palavras. Isso de novo não...

— Vou te dar um motivo para rir!- Quando Cassian ameaçou atacar, Ceasar correu para a rua. Ignorando os avisos de Andrews, Cassian o seguiu porta à fora.

Aproveitando o silêncio, voltei minha atenção ao livro aberto sobre minhas pernas.

— Você não deixa nada passar, não é?- Implicou Andrews.

— Quem tem pena é galinha.- Dou de ombros.- Deixe que se matem, se é isso que querem. Vamos continuar com os mapas enquanto não tem ninguém para atrapalhar.

Andrews concordou. 

Corte de Ventos e MagiaOnde histórias criam vida. Descubra agora