Prólogo.

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Eu costumava passar algumas horas do meu dia pensando em como seria quando o conhecesse. Como seria o ter ao meu lado todos os dias, em ter seus olhos como ultimo e primeiro pensamento. Eu apenas costumava pensar sobre isso.

Costumava nos visualizar juntos, pensava em nós sentados em algum lugar longe de todos, apenas o som de nossas respirações, sem nada que pudesse nos afastar.

Ele seria aquele para quem eu revelaria meus segredos, seria o premiado, a pessoa a quem eu me sentiria a vontade para contar tudo, cada pequeno detalhe do meu dia. Eu lhe contaria sobre as minhas dores e saudades, eu explicaria a ele minhas razões para esconder tudo de todos e ele entenderia.

Ele jamais olharia para mim com condescendência, ou diria que entende algo sem realmente entender. Ele seguraria minha mão e esse seria o claro sinal de que ele permaneceria ao meu lado.

Obvio que era mais fácil e seguro quando "ele" não tinha um rosto, quando era apenas um rosto no meio dos demais, talvez moreno? Quem sabe tivesse sardas, ou talvez uma pequena falha entre as sobrancelhas. Eu não sabia, e em parte ainda não sei...

No entendo, olhando-o agora, vendo o rosto que havia ocupado o homem dos meus sonhos,eu apenas não conseguia parar de pensar no quão longe eu havia deixado minha ingenuidade me levar.

Gostava de culpar os olhos, pois eles haviam me inebriado e deixado-me sem ar, haviam me contado lindas historias e me deixado noites em claro pensando que sim, eu havia enfim encontrado o que procurava, mesmo que fosse errado, mesmo que já tivesse outro na equação, mesmo com tanto a perder, apenas um olhar em seu rosto era a certeza de que as perdas valeriam a pena.

Mas não, eu não havia a quem culpar, e não, as perdas não valeram a pena.

Ele havia dito que seria para sempre, que seria infinito, mas a verdade é que a culpa, assim como a vergonha, era toda minha e de mais ninguém.

Um garçom passa por mim e pego uma taça de vinho bebendo um gole do mesmo, seguro-a com força em minha mão, e dou mais alguns passos, logo a atração de todos é atraída para o alto da escada com corrimão de mamadeira pura, viro-me também e me deparo com ele.

Digo para mim mesma que é uma despedida, e de fato é, mas não é a despedida imparcial que eu gostaria, é a despedida que meu coração precisa.

Ao seu lado, sua esposa segura firmemente em seu braço e sorri de forma apaixonada para o mesmo, e como não o fazer? Ele seria o sonho de qualquer uma, havia sido o meu.

Olho para a mesma e logo noto sua barriga, não dá para saber ao certo quantos meses a mesma está, mas o formato não deixa dúvidas de que logo logo mais um Ross estará reinando neste mundo.

A mulher elegante e loira se vira para os convidados e sorri, por um instante penso ver seus olhos em mim, mas logo dou ao pouco vinho que bebi o crédito por minha imaginação fértil. Ela jamais saberia quem eu era. Alex estaria garantindo manter seu castelo de cristal intacto.

Engulo o vinho e sinto seu gosto amargo tomar minha boca, eu nunca havia gostado de bebidas alcoólicas, no entanto, hoje havia sido um bom dia para ceder ao vicio de todos e remédio de muitos. A bebida desce por meu corpo queimando-me e nesse instante decido que já vi o suficiente.

Eu sabia que a etiqueta me obrigava a esperar ele descer as escadas, pois de acordo com os todos ali, ele faria um discurso ao final, mas meus pés são mais firmes e fortes do que meu tolo coração e toda etiqueta que ainda poderia existir em mim, sendo assim, apenas deixo que os mesmos se movam entre todos os convidados.

Meu vestido vermelho chama a atenção de olhares curiosos, mas sigo sem olhar ao redor e dar a chance de ser reconhecida ou até mesmo notada de forma que possa ser lembrada.

Vejo os olhos frios e distantes de todos, vejo olhares de penas e alguns outros que apenas ignoro. Deixo a taça ainda cheia de vinho sob a bandeja de um dos garçons que olha de forma hipnotizada para a escadaria. Ele ainda desce por ela. E ele ainda está acompanhado.

Continuo desviando de todos, mas quanto mais corro, mais sufocada me sinto, respiro fundo, pois aqui é o ultimo lugar que devo deixar-me chorar. Vejo as portas brancas e sorriu de lado ao pensar que falta pouco para o pesadelo passar, apenas mais alguns passos e estarei longe de tudo e todos.

Passo pela mesma e sinto a brisa fria bater de encontro ao meu rosto quente, meus olhos focam-se na figura a minha frente, ela usa pijama de bolinhas amarelas, em sua cabeça tem um boné velho de um time que não reconheço, pois ela não o usava antes, desço os poucos degraus a minha frente andando em sua direção ao mesmo tempo em que me questiono quando a mesma começou a assistir ou se interessar por jogos de futebol.

"Pensei que gostaria de partir agora", diz sorrindo de lado. Seu sorriso era idêntico ao dela. E talvez por isso fosse tão difícil para papai olhá-la.

"Pensou certo", digo parando a sua frente. Ela olha para trás e franze o cenho, evito olhar também, pois quanto menos eu tiver em minha mente, mais fácil será recomeçar.

"Você terminou tudo o que tinha para fazer?", indaga-me. Sorriu de lado e quando abro a boca para respondê-la sinto um peso familiar em meu pescoço, toco meu pequeno colar e seu pingente de coração. Um diamante solitário, igual ao meu coração.

Arranco-o de meu pescoço jogando-o ao chão, Sam olha para o colar que jaz aos meus pés, seus olhos claros erguem-se até mim, ela estende sua mão para mim e eu a pego sem hesitar, sorrindo ela me puxa e juntas caminhamos em direção ao carro de papai.

Contorno a imensa carreta que se encontra presa no mesmo e adentro no conforto do automóvel. Ao meu lado Sam coloca o cinto, uma musica lenta toca na radio, mas desligo-o rapidamente. Musicas lentas e românticas não fazem mais parte da minha vida.

Sam liga o carro e dirigi para fora da propriedade dos Ross em silencio. Passamos pelos portões com os faróis baixos e vejo o rosto dos seguranças, os mesmos que haviam sido enganados, eles dizem algo para os pontos grudados em seus ouvidos, mas não se colocam a nossa frente para impedir nossa passagem.

Com os vidros abaixados acomodo-me próxima a janela e deixo o vento soprar meus cabelos e em meu mais profundo, oro para que ele seja forte o bastante para soprar com ele todas as lembranças também.

Love LiesOnde histórias criam vida. Descubra agora