Capítulo XXIV

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Já havia se passado um mês desde o início das muitas sessões de fisioterapia de Alma. Larissa era bastante agradável, assim como era solícita. E os tremores haviam enfim diminuído. Alma se sentia bem.

Até que chegou um fim de tarde de sexta-feira.

Alma carregava uma caixa de papelão de tamanho médio e ligeiramente empoeirada. Desde o dia em que havia descoberto a doença, Alma pôs de lado seus instrumentos de pintura e seu ânimo e força de vontade de criar. A exposição de arte, no entanto, assim como a recente união com todos aqueles amados por ela, tudo isso havia dado a ela um novo sopro de inspiração e energia.

Hipólito espreguiçava-se preguiçosamente em cima de uma pequena prateleira envernizada e uma luminosidade invadia o ambiente através da janela fechada, quando um calafrio tomou conta de todo seu corpo encolhido e uma oscilação de sua perna. O conteúdo contido na caixa de papelão esparramou-se por todo o chão, e Alma sentiu-se colidir com força contra a cerâmica gelada. Seu braço esquerdo esbarrou contra a quina de sua estante – ali surgiria um hematoma. Uma dor entorpecente latejou próximo a sua nuca. Ela havia esbarrado no rodapé de sua parede.

Hipólito esgueirou-se pelo chão, sentando-se ao lado de Alma e evocando miados altos. Logo a porta da sala rangeu e Ananda entrou, carregando em uma sacola uma tela em branco.

"Alma, amiga, o que aconteceu?" Ela largou sem cuidado a sacola no chão, correndo e ajoelhando-se ao lado da amiga. "Venha, você precisa se sentar." Ela a carregou para uma poltrona próxima, acomodando-a com a cabeça recostada em uma almofada.

"Não sei o que aconteceu, Ananda. Senti um tremor em minhas pernas, e antes mesmo de processar qualquer coisa eu me desequilibrei e caí no chão." Ela falou lentamente enquanto esfregava com suavidade uma das mãos na nuca.

"Alma..." Ananda murmurou, a voz sempre confiante agora vacilando. "Isso me preocupou. Posso telefonar para sua irmã?"

Alma se endireitou na poltrona e aprumou em seu corpo a camisa amarela, folgada nas laterais.

"Por favor, Ananda, deixe disso. Não há nenhuma necessidade. Foi só uma queda, nada mais." Ela tentou erguer-se da poltrona, mas suas pernas ainda vacilavam.

"Como você pode saber, amiga? Por acaso você é a médica? Deixe que eu fale com Amália, ela vai saber o que dizer." Ananda agora segurava ambas as mãos enfraquecidas de Alma, em seus olhos cor de avelã um olhar suplicante que Alma desconhecia.

Ananda teve uma confirmação silenciosa, apenas um balançar de cabeça abatido de sua amiga.

Ananda retirou o celular de seu bolso, colocando-o sem demora contra o ouvido, a mão nervosamente repousada em sua cintura. A conversa entre ela e Amália durou alguns prolongados minutos - para Alma minutos intermináveis. Logo Ananda esticou a mão, um sorriso tênue disfarçando sua preocupação.

" Amália quer falar com você." Ela cochichou. Alma tomou o telefone, uma expressão aborrecida e ao mesmo tempo amedrontada em seu rosto, as sobrancelhas erguidas. Ela encostou o telefone em sua orelha, mas manteve-se em silêncio, sua respiração quase imperceptível.

"Alma? Ananda me disse que você caiu, isso é verdade? Como isso aconteceu?" Alma ouviu a voz familiar e firme de Amália do outro lado da linha.

Ela explicou tudo novamente. E o fez com ares e timbre de quem apenas contava qualquer ocorrido sem muita importância - ao menos era nisso que ela queria crer. Havia sido apenas uma queda irrelevante causada por um desequilíbrio bobo, ela pensou repetidas vezes, de novo e de novo. Amália soltou um suspiro disfarçado ao ouvir tudo que a irmã tinha a dizer.

O verde nos teus olhosWhere stories live. Discover now