Capítulo XV

61 8 4
                                    

Alma não pôde evitar que um largo sorriso se espalhasse por seus lábios quando abriu a porta de seu apartamento e viu que Álvaro era sua visita inesperada. Assim que ele a viu, Álvaro agarrou-a pela cintura, pressionando-a ternamente contra ele e enchendo-a de breves beijos.

"Desculpe, mas não estava me aguentando, tamanha era a saudade que já estava sentindo de estar com você, dos seus beijos." Ele sussurrou grave em seu ouvido, sem desconectá-los um do outro. Alma riu ao ouvir suas palavras.

"Também já estava morrendo de saudade de você. Como é reconfortante sentir o seu abraço de novo."

"Posso entrar?" Álvaro perguntou a Alma beijando a ponta de seu nariz. Ela deu um prolongado suspiro antes de respondê-lo.

"Pode. Eu estava precisando mesmo espairecer um pouco..." Ela se sentou em um dos braços de seu sofá, um desânimo quase palpável emanando de seu corpo.

"O que foi, Alma? Está tudo bem?" Álvaro se sentou logo ao seu lado, tomando as mãos de Alma com as dele.

"Estou me sentindo exausta, Álvaro. Ontem eu voltei ao hospital - onde minha irmã trabalha. Ela me prescreveu alguns medicamentos, como Prolopa e muitos outros. Todos fortes. Estou tomando um verdadeiro coquetel, e isso não tem me feito bem. Olhe só! Nem tenho mantido meu ritmo normal quanto às minhas pinturas, e nem tenho efetuado com perfeição a minha única tarefa no momento, que é pintar para Manoel Ferraz. Estou com medo de descobrir que essa doença maldita vai me atrapalhar em minha profissão."

Álvaro olhava atento para a tela, que começava a ser preenchida. Balançou a cabeça algumas vezes, como quem refletia a respeito de algo, e então voltou sua atenção para Alma.

"O que é?" Ele apontou para a tela. "O que você está pintando?" Alma, ao ouvir sua pergunta, abriu seu sorriso mais sincero.

"Minha mãe. Sabe, ela morreu quando eu ainda era muito jovem. Mas me recordo dela – algumas partes de minhas lembranças são de fato minhas, outras provêm de relatos contados por meu pai ou de fotografias... Sabe, talvez algumas de minhas recordações nem sejam verdadeiras... Mas lembro-me bem de seu espírito, quase sempre tão cheio de vida. Mas enfim, decidi pintar uma de minhas memórias a respeito dela, uma das que se apresentam mais vívidas a mim. Ela, caminhando pela orla de alguma praia por aí, catando pequenas conchas e me entregando algumas delas para me deixar feliz... Estou reinventando esse momento. Afinal, Ferraz disse que quer algo que seja aconchegante, convidativo. E nada é mais acolhedor para mim que essa imagem que tenho de minha mãe."

Alma notou que agora Álvaro a olhava com toda a atenção possível, sequer piscava os olhos.

"O que eu posso fazer, Alma, para ver esse sorriso que acabei de testemunhar se abrindo de novo em seu rosto? O que você quer? É só me dizer..."

"Fique aqui comigo por um tempo. Podemos andar um pouco pelas ruas... Preciso mesmo passar em algum lugar para comprar mais tinta." Alma escorregou seu corpo para onde Álvaro se encontrava sentado, enroscando seus braços em torno do pescoço do advogado.

"Se isso vai te deixar feliz, Alma, então eu ficarei contigo pelo tempo que você desejar – e espero pelo meu bem que você me queira por aqui por muito, muito tempo." Ele deu um beijo profundo e prolongado em Alma enquanto a manteve aninhada entre seus braços.

O dia se encontrava mais ameno que os anteriores. Alma e Álvaro procuravam pela tinta da qual ela precisava. Casa dos Papeis, Papelaria Estação das Folhas, Papelarte Papelaria: algumas lojas se encontravam fechadas, outras não tinham o que ela queria em seus estoques. Ela deixou a Empório do Papel por último, buscando a todo custo evitar um encontro com Leon – ao menos por enquanto. Quando se viu obrigada a procurar pelo produto por lá, Alma começou a repetir mentalmente, como um mantra: que hoje ele não esteja lá – apenas porque ela não estava preparada para vê-lo ainda.

O verde nos teus olhosWhere stories live. Discover now