A Pensão Rosewood

241 40 0
                                    

Uma jovem de nove anos de idade, sentada com seu livro favorito no colo, amassava o rosto na janela para observar os pingos grossos da chuva que caía brutalmente lá fora. O barulho que a chuva fazia era ensurdecedor mas acalmava seu pequenino coração. Havia outro barulho ensurdecedor ecoando pela casa, mas esse por sua vez era o barulho do choro de uma criança. A pequena eu, que era a criança com o livro sentada em frente a janela, reconhecia aquele choro mais do que ninguém e pedia que algum salvador da pátria fizesse o menino parar de gritar. Mas eu sabia que isso não era possível, sabia que por mais que houvessem outras pessoas naquela casa, a salvadora da pátria naquela circunstância teria que ser eu. Me levantei do meu lugar e fui direto ao cômodo em que o som era mais forte e estridente. Era a cozinha.

Havia um menino de cabelos negros que ricocheteavam pelo ar enquanto ele se balançava, era um menino pequeno apesar de já ter seis anos, ele batia as pernas com força no balcão onde estava sentado e gritava como se fossem os últimos minutos de sua vida. E havia um belo anjo ajoelhado em sua frente. Uma mulher de longos cabelos negros ondulados e brilhosos. Ela virou seu rosto em minha direção, a expressão fechada contendo pura impaciência, demonstrando os traços finos e delicados de seu rosto em completa exasperação. O anjo suspirou e se levantou, limpou as mãos na pequena toalha ao lado do menino. Endireitou o prato de comida ao seu lado e me chamou com uma das mãos. Obedeci o seu comando como sempre fazia.

- Vigie o seu irmão até eu voltar. – ela decretou e eu assenti.

- Sim, senhora. – respondi.

Apesar de já saber que ela não voltaria até o menino ter acabado de comer toda a sua refeição, ansiava pela sua volta e a declaração da minha liberdade. Mas a minha obrigação era fazer ele comer. Sentei no balcão e olhei para a criança que soluçava ao meu lado.

- Enxugue as suas lágrimas e me diz: O que tem a comida dessa vez? – eu pedi explicações.

- As ervilhas estão misturadas com o feijão. – ele reclamou.

Peguei o seu prato e comecei a separar cada ervilha limpa em um canto, e as outras que estavam infectadas pela impureza do caldo de feijão coloquei em uma outra vasilha.

- Está melhor agora? – perguntei lhe oferecendo o prato.

Ele encarou o prato por alguns minutos, decidindo se estava válido ou não, por fim decidiu que não tinha nenhuma objeção.

Depois de mais ou menos trinta e cinco minutos, um outro anjo passou a porta da cozinha carregando o que parecia ser um cesto enorme de roupas. Ao ver a cena dentro da cozinha, deu dois passos para trás e observou cautelosamente parada à porta.

Ela era bonita. Tinha a pele um pouco mais clara que a do outro anjo, tinha cabelos castanhos claros e olhos cor de amêndoa. Era bonita, mas nada de extraordinário, sua beleza era comum segundo críticas. Mas sua simplicidade era enormemente recompensada pelo caráter e inteligência que tinha, ela era a minha favorita.

- Onde está a sua mãe? – ela perguntou para mim.

- Ela pediu para eu ficar e saiu. – eu respondi, o que para mim foi uma resposta inocente.

Ela colocou o cesto no chão e entrou para a cozinha, secando suas mãos no avental.

- Está liberada, querida. – ela declarou.

- Mas mamãe.. – eu protestei.

- Você está liberada, Regina. – ela confirmou.

Me levantei do balcão ao mesmo tempo em que ela se abaixou na frente do menino. Não pude ouvir toda a conversa mas tive a certeza que ela falara algo sobre a ação indelicada e a teimosia não serem atitudes respeitosas de uma criança daquela idade. Uma criança da minha idade sabia muito bem que aquele jeito polido, amigável e sensível de falar de Celine Mills doía na alma mais do que uma surra ou castigos. Ninguém gostava de desapontar seu coração.

A Garota ImpossívelOnde histórias criam vida. Descubra agora