Minha mãe, Celine, costumava dizer que a escolha de um nome poderia ser o maior feito de nossas vidas. E tal feito era algo sagrado. Como na mitologia egípcia, em que o deus Ptah criou o mundo apenas dizendo o nome de todas as coisas. Um fato interessante sobre os egípcios: o nome fazia parte da alma humana. Era chamado de Ren, o verdadeiro nome. Dessa forma um recém-nascido deveria recebe-lo de imediato, pois senão sua alma e sua existência estariam incompletas. No Egito Antigo as cerimônias de nomeação eram secretas, por isso uma pessoa poderia viver uma vida inteira sendo chamada por um título ou apelido, sem revelar o seu verdadeiro nome.
Para os Judeus, tampouco é diferente. O nome de um judeu é a sua alma judaica. Essa ideia é reforçada pela palavra neshamá (alma), que por sua vez nos lembra a palavra shem (nome). A escolha do nome para os judeus também nos leva a cerimônias, que é uma tradição sagrada. Um menino judeu recebe seu nome durante o brit milá (cerimônia que acontece ao oitavo dia, que você deve conhecer como circuncisão). Já a menina é nomeada logo após o nascimento, na primeira oportunidade de leitura da Torá.
Assim, podemos concluir que o nome é algo divino. E em ambos os casos, ele guarda a sua força vital. Na mitologia egípcia proferir o nome de alguém exala um imenso poder, tanto que evitavam ao máximo dizer o nome de certas divindades, pois traria a sua ira. Porém, chamar o nome de alguém muitas vezes é necessário, principalmente quando queremos despertar a sua força vital. E é por esse motivo que quando queremos reviver alguém de um desmaio, inevitavelmente chamamos o seu nome.
- Emma! - eu exclamei, inevitavelmente.
Algumas das pessoas que se encontravam ao nosso redor exclamaram algumas palavras de preocupação, porém não moveram um só dedo. Um rapaz e uma jovem que passavam por perto, olharam de relance e seguiram como se nada estivesse acontecendo. Muito típico.
Apenas uma senhora de idade mais avançada teve a bondade de ajudar. Me senti tentada a perguntar se ela realmente se achava nas condições, mas preferi não ser mal agradecida. A senhora usava uma longa túnica branca, com um símbolo bastante familiar para os farmacêuticos gravado em azul no lado direito: uma serpente enrolada em um cálice, era o Cálice de Hígia. O símbolo mundial da saúde. Ela também usava um véu branco, literalmente como uma freira. Tentei puxar em minha memória qual matriz religiosa usava aqueles trajes, porém o símbolo da deusa grega da saúde em uma roupa inicialmente católica, confundiu um pouco a minha mente.
- Minha jovem, a Santíssima Morada fica logo ao lado. Por quê não levamos a mocinha para receber os cuidados necessários? - ela ofereceu apontando para um prédio de marfim encantador do outro lado da avenida.
A proposta era tão convidativa que eu aceitei, não me julgue. Apesar de pequena e delicada, Emma pesava como uma torre de concreto. O prédio estava a poucos metros de nós e nunca, pois nunca em minha vida precisei desconfiar de uma velhinha trajada de túnica e véu. Porém, como você já deve imaginar. Eu estava completamente enganada.
E por toda a sorte que eu tinha, só depois de repousar Emma em um dos quartos aos cuidados da Irmã, pude perceber que o local e toda a situação era errada demais para o meu gosto. O prédio não era vazio, mas muito silencioso e tinha baixíssima iluminação. Os quadros nas paredes não representavam Jesus, Moisés, Buda ou qualquer outro líder religioso conhecido. As paredes eram de um cinza claro que lembravam vagamente um hospital e pude ver com dificuldade pintadas ao teto do prédio, quase que imperceptíveis "Estrelas de Davi" no tom azul real. Aquele com certeza não era um santuário judeu, muito menos um lugar acolhedor. O sentimento de angústia tomou conta de mim, voltei e parei em frente a porta do quarto onde Emma estava. O quê eu poderia fazer? Tirar Emma do quarto e sair sem ninguém perceber? Impossível.
Voltei a entrar no quarto e a senhora estava sentada na cama junto com Emma, que ainda estava desacordada. A freira passava cuidadosamente uma toalha molhada no rosto da nova paciente, a encarava com uma espécie de assombro e admiração. Fiquei ali parada por alguns segundos pensando no que eu poderia fazer a partir dali, o meu cérebro parecia ranger como se todas as suas engrenagens estivessem enferrujando. A senhora me encarou e deu um sorriso torto.
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A Garota Impossível
Science-FictionRegina é uma viajante, não uma viajante qualquer. É a mulher que visitou eras, monarquias e ditaduras, presenciou guerras, grandes conflitos e quedas de impérios. A grande espiã de um futuro distante, acostumada a lidar e investigar o terror e fatos...