AMEN

3 dias antes

Naquele momento, meu peito queimava de dor e angústia. Eu já não me sentia mais a mesma. Estava perdida em uma escuridão de problemas, sem enxergar as luzes que me mostrariam a solução.

Ninguém naquele lugar era mais o mesmo.

Meu pai já não existia mais, Jamie não existia, o meu querido e carinhoso irmão Harry não mais existia, nem a minha mãe com a mente sã existia. Eu também já não era mais a mesma, e nem sei se seria capaz de voltar a ser um dia. Nem sei se queria.

— Me ignorar não fará que eu suma de sua frente. — a voz rouca de Harry fez minha pele estremecer. Ele mantinha sua postura ríspida com os braços cruzados de f

Cada vez mais me sentia mais mergulhada em uma poça de desgraças, meu corpo submerso pela a água barrosa. Eu apontava meus braços para os céus, buscando e tendo fé de uma ajuda divina. Eu esperava um milagre para me resgatar daquela maldita poça, mas tudo que me acontecia era mais e mais água suja entrando em meus pulmões. Eu estava ficando corrompida, assim como todos estavam por um fio em minha volta, mas a única diferença era que eu estava prestes a me entregar para o meu caçador em especial.

Quando digo que todos estavam corrompidos, porque ninguém naquela maldita corte era mais o mesmo. Um encarava o outro com olhar desconfiado, todos cochichavam, todos eram suspeitos de ser o assassino ou assassina, do Rei Charlie e Príncipe Jamie.

Meu pai já não existia mais, Jamie não existia mais, o meu doce e carinhoso irmão Harry já não existia mais, nem a minha querida mãe com uma mente sã existia mais. Ninguém ali era mais o mesmo, nem aos meus olhos, nem aos olhos dos outros, nem aos olhos de si mesmo.

Eu sentada sobre a cadeira de madeira fria encarando todos a minha frente, imaginando que talvez um deles possa ter colocado veneno na refeição de meu pai, ou que tenha mirado uma flecha em mim no altar. Pensando que se o tal estivesse ali, poderia atirar em mim facilmente, eu era presa fácil. Era tanta coisa chicoteando os meus pensamentos que minha cabeça tombou involuntariamente sobre a mesa, me fazendo soltar um grito rouco frustrado, porque além de estar perdendo tudo aos poucos, até lágrimas eu não tinha mais para chorar. Era irônico de lembrar o tanto que meu pai me dissera que um dia eu iria morrer seca de tanto que eu chorava. Morrer poderia ser a qualquer momento, e seca eu já estava. Ah, era perfeito...

— O que foi, irmã? — a voz rouca de Harry não mais me acalentava, eu temia repreensão, mesmo sabendo que ele não o faria.

— Eu não deveria estar aqui. — levantei a cabeça para encarar seus olhos preocupados. Mesmo que eu não quisesse, mesmo que aquela não fosse eu, um sorriso irônico brotou em meus lábios acinzentados. — Eu sou uma fraude, era você irmão que deveria estar no meu lugar.

— Não deveria dizer isto somente para querer apagar todas as desgraças que vieram a acontecer, são coisas do destino irmã, é a sua sina e não algo que eu deveria tomar a frente. — ele parecia grosseiro, e talvez realmente estivesse sendo, mas eu não estava me importando muito. Grosseria não era nada quando dentro da corte tinha dois casos de assassinato e eu tinha grandes chances de ser a próxima.

— Não me leve a mal, se eu fosse um homem tudo seria mais fácil. Não seria obrigada a me casar com qualquer pessoa apenas por aliança. Ou até me casaria, mas teria total liberdade para ficar com quantas amantes eu quiser sem ser julgada ou até morta por isso. Ser homem é um privilégio.

— Eu entendo seu modo de pensar, mas Deus quis que a menina nascesse primeiro, era pra ser e agora, não posso fazer nada além de ti apoiar. — ele acariciou meus ombros. — Estarei aqui, independente de qualquer coisa, não se sinta sozinha.

Agradeci a Harry pela pequena tentativa de me reconfortar, me poupei apenas com um sorriso fechado de poucos segundos, dando de volta a expressão fechada em meu rosto.

Eu estava sim sozinha, caso tudo desse errado, ninguém iria morrer em meu lugar.

Ninguém além de Jamie, que já estava morto.

— Eu estou em catástrofes por tudo que está a acontecer em nossa volta, Alteza. — com uma leve tossi, o Conselheiro de meu falecido pai começou a falar. Mentiroso, era claro como água cristalina que ele não estava se importando, só queria continuar em sua posse. — A única solução que vejo é um novo pretendente. Um bom partido com boas alianças para a segurança que o nosso Reino está carente.

Essa era verdade que eu já sabia que iria ouvir, mas preferia tentar não me martirizar com esses pensamentos, não agora.

— Então é isto? — Harry perguntou. — Não é óbvio que esta não é a saída? Arrumamos um casamentos as pressas para ter segurança e sabe oque ganhamos? Ora, ganhamos duas pessoas assassinadas. Meu pai e a outra poderia ter sido minha irmã, mas mesmo assim perdi uma pessoa muito querida na corte.

— Tens toda razão, um casamento repentino outra vez traria mais sangue para manchar nossa corte, mas um casamento com o noivo certo trará paz novamente para as nossas terras. — a voz daquele homem me trazia náuseas.

— Não! — meu irmão se levantou rapidamente e bateu suas mãos na mesa. — Isso não vai acontecer, a não ser que aconteça mais uma morte neste lugar. A minha morte.

Me deitei em minha cama, a chama da vela ardia meus olhos. Minha cabeça pesava sobre o travesseiro macio, mas que parecia arranhar minha pele. Olhava tudo em volta, tentando descobrir aonde que eu estava situada. Certo de estar nos meus aposentos, mas aonde em todo o mundo? Quem eu era depois de tudo isso?

Eu não era ninguém.

Era apenas um pedaço de carne, uma presa que estava amarrada em um pedaço de madeira, sendo empurrada diretamente para a boca do leão.

Um leão com sangue italiano correndo em suas veias.