Capítulo 11 - Carl

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CARL
Westminster ― Inglaterra

― Carl... Carl... está me escutando?

― Claro, pai – menti.

Na verdade eu não tinha escutado uma só palavra. Minha cabeça estava latejando e a voz do meu pai soava estranhamente aguda, rasgando meus tímpanos. Apertei os olhos para enxergá―lo melhor. Eu não tinha ideia do que meu pai estava fazendo dentro do meu quarto tão cedo. Aliás, como é que eu fui parar no meu quarto mesmo? Fitei o relógio ao meu lado. 14:15. Talvez não fosse tão cedo assim, afinal de contas, mas considerando que até pouco antes das seis da manhã eu ainda estava consciente em uma boate em Inslington, eu calculava que precisaria de pelo menos mais umas oito horas de sono para me recuperar.

― Então agora vá se arrumar. Você não quer deixar o seu avô esperando – meu pai continuou tagarelando, interrompendo subitamente meus planos.

― Nem pensar. Sua Majestade, vovô, não pode esperar nuuuunca – respondi, talvez ainda um pouco ébrio e mais irônico do que eu pretendia soar – Que horas eu tenho que chegar mesmo?

Senti milhões de lanças perfurando meu corpo só com o olhar que meu pai me dirigiu.

― Que tal logo depois de você lavar todas as privadas do próximo Pub que você passar a noite enchendo a cara, mas que não vai ter dinheiro para pagar depois que descobrir que seu cartão foi bloqueado? Mas se você preferir me acompanhar, daqui a dez minutos meu motorista sairá – ele olhou para o relógio Rolex preso no pulso – Melhor se apressar.

Tomei um banho gelado para acordar e engoli um remédio para melhorar a ressaca. Eu sabia que a paciência do meu velho com meus frequentes excessos estava se esgotando e era melhor não vacilar. Vesti um terno para impressionar meu avô e peguei uma maçã na cozinha para comer no caminho. Durante todo o trajeto meu pai permaneceu em silêncio ao meu lado, no banco de trás do carro, exceto no breve instante em que engatou uma conversa sobre futebol com o Sr. Wilson, nosso motorista. Ao contrário do que eu pensava, contudo, não paramos na entrada do Palácio de Buckingham e seguimos direto para um dos anexos, onde fica a base britânica da Agência Internacional de Segurança. Apesar do meu pai e meu avô insistirem para eu tomar a frente de algumas questões de família, eu sempre preferi me manter distante de qualquer compromisso que começasse antes do meio dia e terminasse depois das cinco da tarde, razão pela qual eu nunca assumi nenhuma função dentro da I.S.A., apesar de ter passado pelo treinamento, obrigado é claro.

― Qual é, pai? Não podemos ir direto para o Palácio? – protestei – O senhor não disse que o vovô já está nos esperando?

― O seu avô está nos esperando na Agência – ele respondeu secamente, arremessando na minha direção um drops de menta extra forte – Toma, mastigue isso antes que eu e seu avô e eu fiquemos bêbados com o seu bafo de vodca barata.

Subimos pelo elevador privativo que ia direto para a sala do meu avô, que já estava nos esperando. Dei o meu melhor sorriso e me sentei, esperando o sermão, que não tardou.

― Carl, eu e seu pai conversamos muito e achamos que está na hora de você se comprometer com a Agência. Você sabe que temos algumas limitações e não podemos recrutar qualquer um. Agora mesmo a senhorita Brand viajou para cuidar do irmão que está doente e estamos sem ninguém para cuidar de uma operação.

― Vô, o senhor sabe que eu não quero isso – respondi – Isso é coisa para a Daphne, para o George, não para mim.

― Carl, você gostando ou não é parte da família, tem o treinamento, sabe da existência da Agência e não faz nada da vida, ao contrário dos seus primos – meu pai falou, com a voz alterada – Se você quer continuar tendo as regalias que tem, tem que fazer alguma coisa em troca.

― Meu filho – meu avô contemporizou – Nossa família tem que dar exemplo. Nós estamos te dando a chance de fazer a diferença, de cuidar do nosso povo, porque é isso que a Agência faz não só em nosso país, como em todos os países da Aliança.

― O que o seu avô não está tendo a coragem de dizer é que não toleraremos mais você saindo por aí e manchando a imagem da Família Real. Os jornalistas não sabem o que estão perdendo, você daria um prato cheio para eles nos atacarem.

― Ah, é isso? Relaxem que eles nem sabem que eu existo – comecei a rir – Eles perdem o precioso tempo só até a 5ª posição na linha sucessória e eu sou só o 8º. Espera, eu ainda sou o oitavo ou a tia Margareth já teve mais algum filho?

― Carl, sem ironias, por favor. Você já tem 28 anos, não me venha agir como um adolescente mimado. Respeite o seu avô.

― Tudo bem, Edward. Acalme―se – meu avô se manifestou ― Carl, eu sei que você quer distância do nosso mundo, mas nós temos responsabilidades para com o Reino Unido e não podemos desperdiçar o dinheiro que deveria ser aplicado para o bem do nosso povo em festas e bebidas. Se você quiser o nosso dinheiro, terá que trabalhar conosco ou então terá que encontrar um trabalho lá fora.

Meu avô, sempre tão paternal ― e mais amistoso até que meu próprio pai ― também havia perdido a paciência comigo. Então eu estava ali, encurralado pela minha própria família, sendo obrigado a desperdiçar a minha vida brincando de ser agente secreto de uma ameaça que ninguém nem tinha certeza se ainda existia. Pelo menos seria melhor do que encarar um emprego comum e se eles estavam me obrigando a agir como um deles, talvez eu ainda pudesse usar pela primeira vez o status de neto do Rei da Inglaterra para conseguir alguma regalia, como, por exemplo, poder chegar depois das dez da manhã. Não, depois das onze. Isso.

― Tudo bem, quando eu começo?

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