NOÊMIA
Washington― Vem, eu vou te mostrar o nosso quarto – Pia me puxou pelo braço para dentro do elevador, apertando o botão para o segundo andar.
― Então vocês moram aqui mesmo no prédio? ― perguntei – Por que?
― Nosso trabalho exige máxima descrição. Temos que ser quase fantasmas. Além disso, podemos ser chamados a qualquer hora do dia ou da noite. Não somos obrigados a ficar, mas a grande maioria acha conveniente, até porque quase ninguém é daqui da cidade. Aliás, quase ninguém é norte―americano, na verdade.
― Então você simplesmente corre o risco de acordar no meio da noite e dar de cara com o Presidente Mitchell?
― Até ano passado, com certeza – ela riu – Agora ele pouco aparece aqui na Agência.
― Pelo visto você se interessou pelo Nicholas, não é? Quem sabe? Até onde eu sei, ele está solteiro.
― Não ― refutei – Eu estava só brincando. Agora eu não tenho nem tempo para distrações. Tudo que eu quero é achar meu filho.
― Sinto muito pelo que aconteceu. Quantos anos ele tem?
― Cinco anos. Eu tenho foto dele no meu celular, que ver? – mostrei a ela a última foto que eu havia tirado do meu filho, um dia antes do sequestro, sorridente com sua nova miniatura de caminhão de bombeiros ― Ele é tudo para mim. Tenho até medo do que eu farei com Joseph quando colocar a mão naquele filho da mãe.
Com toda aquela adrenalina desde o sumiço de Joe, eu tinha tentado ocupar a cabeça com as questões práticas para encontrá―lo, negando a mim mesma o sofrimento. Era como se me entregar à dor me tirasse um tempo precioso que eu poderia gastar procurando por ele. Comecei a passar as imagens e encontrei a foto que eu havia feito do trabalhinho dele de escola, no último dia das mães. Ele havia nos desenhado no parque onde costumávamos ir e escreveu "mamãe eu te amo" dentro de um coração. Tal qual aquele dia, comecei a chorar.
― Eu vou te encontrar, meu filho – falei baixinho – custe o que custar.
...
O despertador do quarto tocou às 6h da manhã. Tomei um banho e vesti um trench coat para suportar os primeiros decréscimos de temperatura do outono de Washington. Antes mesmo das 7h eu já estava no refeitório da Agência, tomando café sob o olhar atento de todos, curiosos para conhecer a nova intrusa. Ansiosa pela reunião, mal consegui comer e me dirigi até à garagem, onde o motorista já estava pronto para me levar. A Mercedes preta parou em frente a uma casa em uma área nobre da cidade. Quando os porteiros autorizaram nossa entrada, imediatamente fui conduzida até o interior da residência. A casa era luxuosa, com uma decoração de extremo bom gosto. A sala, com o pé direito alto, trazia um conjunto estofado de couro negro em contraste com as paredes brancas. O piso de madeira era ornado por um suntuoso tapete lã de carneiro creme e uma lareira no canto esquerdo deixava o ambiente ainda mais aconchegante. Eu ainda estava admirando a decoração quando uma senhora, de cerca de sessenta anos, me levou até a primeira sala após o corredor, onde anunciou que o Sr. Mitchell estava pronto para me receber.
Mitchell estava vestindo uma roupa mais despojada, considerando que estava em casa, com um jeans de lavagem escura e uma camisa social branca dobrada até os cotovelos, destacando ainda mais sua excelente forma física. Ele foi até a porta e quando me viu me cumprimentou formalmente, trancando a porta quando a assistente saiu. Ele arrastou uma cadeira de frente para sua mesa para que eu sentasse.
― Senhorita Villa―Lobos ― começou.
― Noêmia ― corrigi― Pode me chamar de Noêmia. Lá no Brasil não costumamos chamar ninguém da minha idade pelo sobrenome. Eu me sinto meio velha – comecei a tagarelar, como sempre acontecia quando ficava nervosa.

VOCÊ ESTÁ LENDO
OS EXILADOS
Ciencia FicciónNoêmia viu sua vida mudar quando, após uma viagem misteriosa para os Estados Unidos, presenciou seu namorado morrer como um herói, para salvá-la, bem como o bebê dos dois, ainda na barriga da jovem. Anos mais tarde, após seu filho ser sequestrado, N...