Lucien estava no parapeito do segundo andar de sua casa. Sua... nova casa. Um cômodo e espaçoso bangalô de tijolos avermelhados nos limites de Velaris, perto do Sidra.
Não estava acostumado de forma alguma com a vida na cidade. Era estranho e exótico, extremamente incomum às suas impressões. Ele, que vivera enfeitiçado numa visão de belicismo, regimentos e hierarquias, tinha levado um choque brutal ao entrar em contato com a corte de Rhysand.Rhysand. Aquele que temera por tanto tempo e tantas coisas que já não sabia mais onde havia começado sua aversão. Aquele que o acolhera em seu lar por (falta de) opção, mas que confiara uma missão importante, que praticamente redefiniu o curso da guerra. Que confiara em Lucien. Que tivera piedade do filho de Beron.
Sempre que lembrava de Rhysand e da misericórdia que lhe concedera, a lembrança seguinte era Tamlin. Os tantos anos que passou na Primaveril. As tantas vezes que serviu Tamlin, obediente. Silencioso. Sua raposa, sua Lâmina. Seu subordinado. E agora era... independente. E isso era surpreeendentemente opressor.
Lembrava de Feyre também. Lembrava do brilho primeiro em seus olhos, das tantas vezes que ralhou com ela. Das outras tantas em que caçaram juntos, que riram juntos.
Lembrou-se de vê-lo apagar quando Feyre retornou daquele maldito inferno subterrâneo. Depois que ela foi dilacerada, fisica e mentalmente. Depois que Tamlin...Grã-Senhora. Sua amiga era uma Grã-Senhora. O mais alto ciclo de poder, a maior das estirpes. E ele temeu. Não ela, nunca a ela, mas os efeitos do poder. O que ele poderia fazer. O que o Caldeirão poderia fazer. O que outros poderiam.
Mas ela se virou muitíssimo bem, a maldita espertalhona. Domou toda a potência, toda a grandeza dentro e fora de si e a deixou fluir eternamente, como um canal. Ele havia se ajoelhado perante ela. Perante a rainha que coroava sua visão. A lembrança o aquecia.Mas não era mais tempo de lembrar. Não. Era tempo de agir, De exercitar. Não havia tempo para as memórias, ali. Um ano havia se passado e Lucien detestava estar parado.
Arrumou-se e pegou suas armas. Então atravessou.Seu poder havia aumentado a ponto de ele conseguir o fazer. Treinara arduamente com Morrigan e com o próprio Rhysand para ter a maestria necessária. Havia atravessado para uma floresta ao extremo leste de Velaris, um dos muitos pontos de treino de Azriel.
Não foi uma caminhada muito fácil. Mas era o necessário. Após alguns minutos, finalmente o desafio se iniciou. Um laço corrediço de espinhos de metal illyriano, que provavelmente faria um ótimo estrago em sua perna. Azriel. Seguiu, desmontando as armadilhas do encantador de sombras, das armas preparadas que Cassian cuidadosamente escondera. Das granadas de energia escura de Rhysand, das surpresas elementais de Feyre.
Desativara todas, sem exceção, Precisara de todo o seu potencial cerebral, mas as vencera, uma a uma. E estava perto, muito perto. A clareira era visível, e ele sentia a água que limparia o sangue, o barro e o suor de sua pele.
Até chegar à armadilha de Amren.Era um Sussurrador. Grandes cristais carregados de magia de cor escura, retirados de montanhas específicas em um antigo vale no extremo norte de Velaris. Reunia lembranças, vozes e cheiros. Os reunia e os distorcia, moldava como uma sinfonia psicótica. Usado para enlouquecer vítimas de interrogatório em tempos mais brutais. Amren sabia, a ardilosa Amren sabia disso quando o pegou. Lucien também, assim que o cristal despejou tudo sobre ela. Ela.
Elain.
Gritos desesperados. O nome de Lucien, repetidas vezes e em vários tons. Mentiras, falsas sensações, visões aterradoras e lascivas, tudo ao mesmo tempo. Sussurrando, murmurando, sem espaço para reações. Martelando e ecoando em seu íntimo o mal, a dor e o medo.
Lucien se abaixou, reatraindo todos os músculos em dor e ira equivalentes. Os olhos ardiam com as lágrimas, mas elas evaporaram quando ele os abriu. A torrente de fogo disparada pulverizou o cristal tanto quanto o grito, o rugido feral e amargo do feérico.
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Corte dos Sonhos e Outros Contos
Fiksi PenggemarInspirados no mundo ficcional criado por Sarah J. Maas na série Corte de Espinhos e Rosas, esta série de contos retrata momentos passados ou futuros relacionados aos acontecimentos da trilogia original. Certos elementos do quarto livro entrarão nos...