Aquela tinha de ser a situação mais triste em que qualquer pessoa poderia estar. Todas as noites pensava o que eu tinha feito para merecer aquilo? Por acaso era isso que chamavam de carma? Castigos que sofríamos por conta de nossos erros em outras vidas? Então eu deveria ser o diabo em pessoa na minha vida anterior para ter de passar por isso.
Era constrangedor ter de esperar a viatura da policia vir me escoltar até o médico, ou então fazer meus exames na presença da delegada que acompanhava meu caso, e que tomou minhas dores para si, sem nem me conhecer, e ainda sim, todo mês ela estava lá, aguardando-me na viatura para me levar ao médico.
Embora isso fosse um pouco desagradável, por conta de todos os olhares que recebia por onde passava, isso não era nada, comparado a acordar varias vezes na noite, com a sensação de que tinha alguém no quarto me observando; Ou então andar pelo pequeno corredor da casa, olhando para trás a cada dois passos, verificando se ninguém iria sair do quarto no final do corredor e me agarraria, arrastando-me para lá, abusando mais um vez do meu corpo.
Não importava quantas vezes eu gritasse, ou quantas vezes implorasse para que ele parasse, dizendo que estava me machucando, que doía mais do que eu podia suportar... Isso parecia ser musica para seus ouvidos insanos. Quantas vezes ele me estrangulou por puro prazer enquanto ejaculava dentro de mim, gozando ao ver minha debilidade, aproveitando para me jogar da cama, após divertir-se, como se eu fosse um trapo sujo.
Cada vez que me olhava no espelho, me via mais doente, mais magra, pálida, chegava até imaginar como eu conseguia levantar todos os dias, para tentar viver mais um dia, mantendo uma pequenina chama de esperança de um dia não sentir tanta dor.
Dor.
Não queria que a criança que estava dentro de mim, sentisse. Queria livrá-la de toda dor. Protegê-la desse mundo onde só há dor. Ninguém pode dizer que eu não tentei, pois sim, eu tentei.
Peguei todos os remédios que achei na casa, joguei dentro do copo do liquidificador com um pouco de água, bati todos eles e quando tudo virou apenas uma vitamina tóxica e possivelmente fatal, a tomei com vontade. Não satisfeita com a demora do efeito, tentei retalhar meu pulso, porém as dores me acometeram antes disso.
Parecia de fato que eu estava morrendo. Vomitei uma parte do que ingeri, e um pouco de suco gástrico, cai por cima do meu próprio vomito, enquanto convulsionava de dor. Uma dor que parecia não ter fim; E aquilo só podia ser algum tipo de piada infame, uma vez que tudo o que eu queria era me livrar da dor, e agora a sentia até a alma, era como se o tempo tivesse parado, apenas para eu sentir dor e mais dor.
Quando tudo finalmente pareceu escurecer e eu pensei ter tido o meu ultimo pensamento em vida, me vi acordando em um quarto de hospital. Entubada, e imobilizada na cama onde estava deitada. Era meio obvio que fariam isso, afinal, era uma suicida em potencial, com um trágico currículo de violência sexual, maus tratos e uma gravidez indesejada.
Por um momento senti um aperto no peito, e uma sensação desagradável, algo que só desapareceu quando um dos enfermeiros informou que meu bebê estava bem, que tinha sido por pouco, mas que ele tinha lutado para permanecer vivo. Era um guerreiro, um sobrevivente. Somente então, enquanto me afogava em lagrimas, percebi o quanto eu o queria perto de mim, para que eu não estivesse mais só. Para que não sentisse mais dor.
Os meses seguintes foram difíceis, apesar de ter feito um amigo, ele tinha viajado e com algum esforço mantínhamos contato. Meu bebê lutou dia após dia, durante uma gestação de risco, graças ao meu desespero. Quando ele veio ao mundo, eu só o queria em meus braços e subitamente estava tudo bem. Com ele ali, quentinho, pequenino e indefeso, tudo parecia certo e parecia fazer sentido.
Daquele momento em diante ele seria a razão da minha existência. Eu não viveria por mim... Viveria por ele. Dia após dia. Enfrentando o que viesse pela frente, conquistando o que fosse preciso para dar a ele tudo o que eu não tive.
***
As lembranças eram sufocantes, e cada vez que eu fechava os olhos, revivia aquele passado horripilante e voltava a me sentir só, mesmo sentindo braços quentes me envolvendo e uma voz masculina cuidadosa me ninando, eu parecia cair num desespero sem fim. Não tinha minha razão de viver ali comigo, para eu abraçar e sentir seu cheirinho de talco e perfume de bebê.
Não tive consciência ao certo de quanto tempo tinha se passado quando levantei para ir ao banheiro, tentar me recompor para ligar para Hagnar. Enzo era um acompanhante dedicado e silencioso, mas eu queria mais do que braços quentes para me colocar de volta no eixo; Eu precisava de um porto seguro, para aportar minha consciência antes que eu imergisse no mar do desespero.
Felizmente os ventos sopravam ao meu favor, quando estava para pegar o telefone para ligar, a porta do apartamento se abriu, relevando algumas pessoas desconhecidas, outras que não me importavam, pois tudo que eu conseguia enxergar era a razão da minha existência nos braços de Cristian, que o trazia para mim.
Abraçá-lo e sentir seu cheirinho de bebê, era como renascer. A sensação se igualava a primeira vez que o peguei em meus braços, e o chamei de “meu bebê”. O resto passou-se como um furação e eu sequer me importava com as pessoas ao meu redor, policiais, paramédicos, detetives e alguns outros. Ninguém ousou tirar Lorenzo dos meus braços, bem como ninguém nos questionou quando fui para o quarto com ele, e os deixei resolvendo todos os problemas. Seria egoísta o suficiente para ficar com meu filho, e deixar que o resto se resolvesse de uma forma ou de outra.
O trauma de ter sido bruscamente afastada de meu filho, deixou-me paranóica por algumas semanas, fazendo-me levantar inúmeras vezes durante as noites para checar se ele estava realmente bem. Que ele estava ali, pertinho de mim.
Os tempos pareciam estar melhorando, fora preciso algumas semanas para as coisas tomarem um rumo diferente.
_vamos fazer uma festa! – Cristian chegou todo animado no apartamento, praticamente arrombando a porta.
_festa? – indaguei confusa.
_é claro! – Enzo surgiu atrás dele, com a mesma animação, e ainda não eram sete da manhã – é nosso aniversario! – disparou fazendo a razão iluminar meus pensamentos.
E tudo fez sentido.
_oh, eu nunca soube quando era meu aniversario de verdade! – falei completamente embasbacada pela idéia de realmente saber o dia em que eu nasci!
_pensamos a mesma coisa! – meu pai cantarolou feliz da vida – já acertei tudo com Hagnar!
_espere! O que? – como que por uma invocação, Hagnar apareceu no corredor com Lorenzo – você já estava combinando com ele fazer uma festa de aniversario para mim? – o acusei.
_você não consegue controlar sua língua, não é? – ele resmungou olhando feio para Cristian – era para ser uma surpresa, e pelo visto conjuguei a frase no tempo certo, “era”, não é mais!
_não seja tão rabugento, apenas estamos animados com o planejamento! Ela ria desconfiar que estaríamos armando alguma coisa! – Enzo tagarelou.
_ou não, já que vocês são esse poço de animal todos os dias da semana, inclusive aos domingos pela manhã! – Hagnar resmungou.
_você é tão exagerado! – meu pai rebateu.
Meu pai. Fazia pouco tempo que o chamava assim, que tinha assumido essa nova realidade de que agora sabia a que lugar eu pertencia, quem eram os meus familiares e que aquela era a recompensa por toda a dor que passei.
As lembranças ruins agora eram passado e ficariam esquecidas da memória, uma vez que estava vivenciando novos momentos, situações únicas, que no futuro seriam boas lembranças.Heye, Pandinhas, sei que o capitulo esta pequeno, mas era só pra deixar um gostinho de “estou voltando” para vocês, ainda sem data certa... Só não desistam de mim! Rsrs comentem e deixem uma estrelinha pra dar aquela moralzinha. Bjs de bambu.
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Laços de Sangue
General FictionSeparados por nada além do ódio e da ambição de alguém que vivia para seus própria interesses. O desejo obsessivo e destruidor por poder, causou assim uma ferida profunda na alma do empresário Cristian Castellamare. Com o sequestro de um dos filhos...