Capítulo I - Uma proposta incomum

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Era a primeira vez que Lawrence Knopp era chamado de fato para desvendar um assassinato.

Um método infalível de saber se está progredindo na carreira de detetive é perceber se parou de ir atrás de suas próprias investigações e começou a receber pedidos de outras pessoas. Caso a resposta seja positiva, parabéns, você é oficialmente um profissional agora! Os seus casos anteriores sempre se iniciaram com Lawrence convidando a si mesmo para solucioná-los ou então por meio de uma aposta com seu grande amigo Mini Dawil — salvo um único pedido que ele infelizmente teve de recusar. Mas não daquela vez.

Aqueles três sujeitos eram seus primeiros clientes de verdade.

Linda Barden era bonita. Não chegava a ser deslumbrante, mas era bonita. No auge de seus vinte e oito anos, a jovem certamente estava vivendo sua melhor fase. Seus cabelos loiros deslizavam pelos ombros e desciam até a altura dos seios. Os pequenos olhos castanho-escuros e o também pequeno nariz pontudo davam-lhe um aspecto um tanto infantil. No entanto, era aquela expressão séria em seu rosto que impedia que Lawrence tivesse essa impressão.

Linda estava acompanhada de sua irmã. Marie era alguns anos mais velha e parecia não ter aproveitado toda a beleza que poderia ter herdado da mãe, deixando boa parte dela para a irmã. Mesma cor dos olhos, tom de pele, formato do queixo… A única característica que as diferenciava — além da clara questão estética — era a forma como seus cabelos lhes caíam pelo corpo. Os de Linda eram enrolados e mais charmosos, enquanto os de Marie eram lisos e sem graça, fazendo com que a primogênita assumisse um ar de bibliotecária chata e sem vida. Não que aquilo lhe incomodasse tanto, era bibliotecária, afinal — se era chata e sem vida, ninguém nunca lhe havia dito nada.

Por fim, estavam acompanhadas do pai.

As duas garotas claramente haviam puxado à mãe. Carlos Barden não era loiro, nem bonito. Não tinha olhos e nariz pequenos, e nem aspecto infantil. Não tinha a mesma cor dos olhos — esses eram verdes — e nem o charme de Linda. Por outro lado, não tinha o ar de bibliotecária de Marie. Carlos não tinha nada a ver com as duas filhas. Com cabelos pretos curtos, feições duras e ombros largos, qualquer coronel do Exército teria inveja de seu porte físico.

Tudo o que Lawrence queria saber era o que havia levado aquela família até sua casa.

Aquele cômodo nem de longe se assemelhava a um escritório de detetive particular, e de fato não era. Os quatro se encontravam na sala de estar, Lawrence em uma cadeira no centro do cômodo e os demais em um sofá verde, de frente para ele. Ao redor deles, havia objetos espalhados por todos os cantos: papéis amontoados na mesa central, almofadas que deveriam estar no sofá jogadas no chão, um pacote de biscoitos pela metade ao lado de um prato com farelos… Em um dos cantos, um violão — que Lawrence não sabia tocar, talvez por não se esforçar muito para tal — se encontrava apoiado na aresta entre as paredes amarelas. Com certeza aquele lugar não estava preparado para ambientar uma conversa como a que eles estavam prestes a ter.

O próprio Lawrence não possuía características dignas de um detetive sério e respeitável. Talvez isso se devesse à sua aparência física: o homenzinho possuía cabelos ruivos encaracolados que chegavam aos ombros, mas seu bigode em forma de trapézio e seus minúsculos fios de barba eram de cor loira. Fios capilares de cores diferentes não eram aquilo que se espera ver em um detetive profissional.

Talvez fosse culpa também de seu peculiar senso de moda. Sobretudo marrom? Nada mal. Calça jeans azul? Até aí tudo bem. Boina verde e amarela? Bem… Mas eram seus calçados que lhe conferiam um tom ridículo. Pantufas cor-de-rosa no formato de patas de gato — sim! Era isso o que o homem calçava.

A soma de todos esses fatores poderia explicar o motivo pelo qual levara quase um ano para conseguir um cliente de verdade.

Linda Barden se ajeitou no sofá aconchegante de Lawrence, assumindo uma postura mais séria e condizente com a ocasião em que estava metida.

— Senhor Knopp… — iniciou. A sua voz era talvez fina demais para a idade, mas a rigidez com que era usada dava um tom cômico à situação.

Não era hora de rir, entretanto.

— Devo lhe dizer que o senhor não é como eu esperava — prosseguiu, provocando uma risadinha em sua irmã ao seu lado, que, ereta, não se aproveitava do conforto daquele sofá.

Lawrence não se incomodou com a observação.

— Nem eu mesmo esperava isso de mim, madame — brincou. — Mas garanto a você que, se confiar em minhas capacidades, poderei solucionar com maestria o que quer que a senhora queira que seja solucionado.

Linda levantou a sobrancelha ao dar uma melhor olhada no sujeito na cadeira à sua frente. O homem ruivo poderia ter mais a mostrar para dela além de uma sala desorganizada e uma péssima noção de ridículo.

— Antes de continuar… — Knopp interrompeu o que seria a próxima fala da mulher. — Preciso perguntar à senhorita: como soube da minha existência?

Linda Barden não respondeu de imediato. Nem poderia. Não esperava algo daquele tipo vindo de um detetive que se dizia profissional, portanto levou alguns segundos para processar a pergunta e respondê-la.

— Vi seu nome nos jornais — disse. — Aquele caso na floresta amaldiçoada alguns meses atrás, deve se recordar. Foi o senhor quem o resolveu, não?

Foi a vez de Lawrence levantar a sobrancelha.

— Ah sim, esse caso… — murmurou, sorrindo. — Não apenas eu, outros três detetives participaram da investigação. Eu quase morri, mas foi divertido. — Vendo que os demais não compartilhavam de sua nostalgia, prosseguiu. — Pois bem, srta. Barden. Por que está aqui, afinal de contas?

Linda inclinou-se para a frente. Deu uma olhada em seu pai por uma fração de segundo antes de falar.

— Creio que o senhor não tenha resolvido muitos casos em sua carreira…

Ela não falou aquilo com a intenção de ofender, fora apenas um comentário. Por sorte, Lawrence não levou aquela frase para o coração.

— Por isso — prosseguiu —, o que direi agora não terá tanto efeito quanto teria se o senhor fosse um detetive famoso. — Agora, sim, ele estava ofendido, mas ela não lhe deu tempo para expressar sua indignação. — Mas acredite. Estou lhe pedindo para solucionar algo que o senhor nunca deve ter visto antes. Peço que ao menos considere meu pedido.

O detetive estava intrigado.

— Pode falar, minha cara. O que quer que peça eu vou entender, e farei de tudo para solucionar o caso. Sou profissional, afinal.

Ela suspirou. Deu mais uma olhada para seu pai, que, em silêncio, assentiu.

Linda, então, falou:

— Quero que investigue a minha morte.

Morreu, mas Passa Bem - Série LawOnde histórias criam vida. Descubra agora