Capítulo 20: Ele.

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Daniel nunca foi nada demais. Tinha 16 anos, quase indo para os 17. Era um adolescente comum, tirando o fato do autismo leve que dificultava sua relação com as outras pessoas e a forte depressão que enfrentava. Na infância, seu pai o espancava, o deixando com graves sequelas. Tinha seus remédios para tomar, mas sempre fora teimoso demais pra isso. Tinha uma namorada e alguns poucos amigos, o que verdadeiramente lhe mantinha vivo. Aliás, ele tentou se matar algumas vezes, mas nunca conseguiu de fato. Tinha medo demais de morrer, apesar de se questionar se estava realmente vivo. Sua mãe trabalhava duro para sustentar ele e seus irmãos, e sozinha, nunca teve condições psicológicas para saber lidar com família, trabalho e o resto. Ele nunca teve uma boa convivência com sua família. Era um adolescente comum, e nunca foi nada demais.

Ele ficava o dia todo com seu headphone, adquirindo alguns problemas auditivos irrelevantes. Após concluir o ensino médio, não conseguiu entrar numa faculdade ou arranjar um emprego, ou seja, vivia como um parasita. Mas para esquecer os problemas, se mantinha enfurnado em jogos, filmes, e outras inutilidades na internet. Mas de uns dias para cá, após a aparição de Gênesi, ele adquiriu um fanatismo pelo herói. Secretamente, tinha um sonho de infância que era ser um super-herói conhecido pelo mundo todo, mas como já dito, nunca foi nada demais.

O jovem vibrou internamente quando, há uma semana, recebeu a notícia criptografada da queda da VERO. Crawn não era a mesma com a presença dela, e mesmo não erradicando totalmente, era um vitória mórbida para ele.

Com o esforço da família inteira, eles conseguiram uma moradia digna no Paraíso, o qual Daniel se recusava em chamar assim, pois não importa como visse, era só o portão para o inferno.

Numa terça-feira, o jovem decidiu dar sua caminhada matinal, um hábito que construíra para manter o corpo ainda funcionando. Botou seu moletom mais quente para enfrentar o frio que fazia lá fora. Com o headphone em seus ouvidos, Daniel pôs seu All Star preto e bateu a porta de casa ao sair.

E essa caminhada durou o bastante até o parque que ficava literalmente do lado de sua casa. O parque não tinha nada atrativo. A única coisa que ele fazia ali era se sentar num balanço e escrever a história se super-heróis que ele escrevia por diversão, junto com um neorock o qual ninguém que ele conhecia gostava. E ali ele ficou. A caminhada era uma fachada para que ele pudesse ficar em ali, em paz. Só que não demorou até sua mãe mandar uma mensagem perguntando por ele. Ignorou. Colocou um vídeo para ver no celular. Era a única coisa que o fazia parar de ouvir música. Era um vídeo do herói de capa vermelha salvando as pessoas da agência de correio. Aquele vídeo – o qual não se sabe como foi feito – viralizou na internet, sendo visto por pessoas da América inteira. Era o vídeo que Daniel via todos os dias, se maravilhando com os movimentos esguios do herói. Reassistiu duas vezes antes de se levantar e ir embora.

Normalmente, Daniel já teria ido para casa, mas naquele dia em especial, decidiu andar um pouco mais. Afinal, ele estava no Paraíso, não é? E mesmo aquelas ruas movimentadas, arranha céus bem-feitos e maravilhas da engenharia, ele se sentia vazio em ver aquilo, ou aquilo tudo era verdadeiramente vazio.

Estava passando por baixo de uma rodovia quando ouviu o impacto acima de sua cabeça. E a única coisa que viu antes de fechar os olhos, assustado, foi um simples ônibus de transporte público caindo em cima dele. Seria morte na certa, mas não era a hora dele morrer. Após perceber que não havia sido esmagadora, Daniel abriu os olhos lentamente, e então viu o herói de cabelos brancos e capa vermelha o protegendo, segurando de maneira árdua. Daniel podia ver de perto cada cicatriz do corpo de Gênesi. E o mais perceptível era seu olhar, o genuíno olhar de sofrimento, adquirido pelo pesar não só do ônibus que continha.

Gênesi logo jogou o veículo no chão, e passou por Daniel.

— Aqui é perigoso. Volte o mais rápido que puder para casa! – Gênesi falou antes de avançar contra os soldados da VERO que se aproximavam.

GênesiOnde histórias criam vida. Descubra agora