CAPÍTULO 48-ALDIR x ALDIR

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____"O INFERNO SOMOS NÓS!"___Jean-Paul Sartre


Aldir não conseguiu conciliar o sono naquela noite.

Ele não podia avaliar o que doía mais em seu peito: a ausência de Neo, agora que a garota deixara o seu cheiro nos lençóis do agricultor...ou a ausência de Lucas, que parecia estar solidário a Neo e só mandara uma mensagem que não era para o pai se preocupar, pois dormiria na casa do senhor Tanaka.

O japonês, porém, talvez temendo que o amigo viesse a fazer alguma burrada (como ir atrás de Neo para implorar perdão), resolvera dormir por ali mesmo.

Aldir levantou-se no meio da noite...quase duas da madrugada e ele ainda não conseguira pregar os olhos.

O senhor Tanaka viera dizer a ele o quanto fora injusto com Neo...como se alguém precisasse jogar na cara dele o que já viera lhe esbofetear a consciência assim que as palavras malditas haviam abandonado a sua boca.

_Palavra mal dita é igual flecha lançada a esmo, Aldir: abandona o arco e a ele nunca mais poderá retornar. Amaldiçoada em sua constituição, essa palavra poderá, como a flecha errante, acertar qualquer pessoa!_dissera o sábio japonês.

Aldir queria ter chorado, mas as lágrimas pareciam tê-lo abandonado a fim de deixar que o peso em seu peito não lhe desse trégua!

O agricultor não pensou duas vezes antes de abrir a porta dos fundos com cuidado a fim de não acordar o idoso e foi para o quintal.

Sob a luz da lua, as verduras pareciam também compactuar com o silêncio de Neo.

Então era aquilo tudo de uma vez jogado em seu rosto: ela já fora casada com um homem que a abandonou após perceber que a esposa fizera a burrada de tentar se matar e, como consequência, provocara a morte do filho ainda no útero.

Ele não lhe cobrara sua vida pregressa relatada nos mínimos detalhes, pois ela também não lhe cobrara aquilo!

Fora até algo mágico, ele reconhecia: era como se os dois começassem a existir, virgens e puros...amputados de quaisquer ligações com o passado de cada um...no momento em que se conheceram.

_Neolinda...Neo...tão Linda..._sussurrou Aldir olhando a lua.

O astro solitário no céu também não iria aliviar pra ele e na imensidão escura da abóboda celeste,  encarou como a lhe perguntar que merda ele fora fazer naquele dia!

Como ele poderia imaginar que ela tentara suicídio um dia? A Neo de agora parecia uma eterna amante da vida! Ele não iria adivinhar que ela já fora o oposto algum dia!

O senhor Tanaka pareceu indignado pelo amigo ainda usar esta justificativa para poder se explicar, se redimir...

_Mesmo que ela nunca tivesse tentado suicídio, Aldir, não se trata apenas disso: você tem este preconceito horrível de achar que todos os suicidas agora possuem a sua marca de Caim e que deveriam, como o personagem bíblico, serem apontados e evitados. Ela sabe que você pensa isso do melhor amigo dela! Por isso o quer longe do Lucas!

Ele não podia dizer que o japonês estava errado! Talvez o texto que lera na época fosse o que agora chamavam de fake news...Talvez nem tantos suicidas voltassem a tentar tirar a própria vida...Neo voltaria? Heitor voltaria?

_Droga!_ele se repreendeu percebendo que o japonês fora sábio em impedir que ele fosse logo atrás da namorada.

Tivesse feito isso e agora aquela pergunta teria sido feita mais uma vez e, mais uma vez, ele teria magoado a negra com sua ignorância.

UMA QUESTÃO DE AMOR-Armando Scoth Lee-Romance gayOnde histórias criam vida. Descubra agora