Capítulo 1

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Joguei o papel no lixo e sai andando do lugar que eu chamo de "inspiração", ou melhor, chamava, pois não importa para onde eu vá, eu não consigo escrever, e eu prometi um novo livro.
Talvez a mente de um poeta se esgota sim, eu pensei, E o seu dia chegou, Lois.
É, é, meu dia deve ter chegado, mas quem liga? Já publiquei mais de 100 livros para o mundo, desde dos meus 19 anos, e ninguém parece dar a mínima, nunca sou reconhecido por cada verso que eu escrevo. Poesia já deve ter saído de moda, porém, continua sendo a única coisa que eu sei fazer.

- Licença, Senhor?

Olhei por cima do meu ombro e vi uma garota loira, com vários cartazes nos braços. Eram tantos que eu pensei que alguma hora eles iriam simplesmente ser levados pelo vento.
Acho que eu posso escrever sobre ela mais tarde.
Não, ninguém quer ler sobre mulheres que entregam cartazes na rua, e eu muito menos quero escrever.

- Sim?

- O senhor não teria tempo para dar uma visitada no nosso show de balé? - ela me entregou um cartaz. - É de graça. Contamos com a sua presença.

Então, ela deu as costas e saiu, entrando justamente no parque aonde eu estava tentando escrever à alguns minutos atrás.
Observei o cartaz. Ele era todo rosa e tinha a sombra de uma bailarina. Ao lado, tinha letras brancas, dizendo o local e o horário que aconteceria o show. Já está quase para começar.
Olhei em minha volta e depois voltei para o cartaz.
Nunca fui à um show de balé, o máximo que já vi foi as meninas dançarem balé na escola quando eu estava no fundamental I.
Me pergunto se eu vou achar inspiração vendo pessoas dançarem um palco e, talvez sim, por que não? Picasso já pintou a maioria dos seus quadros vendo pessoas dançarem, então, eu posso escrever poesias vendo pessoas dançarem. Acho que vale a pena tentar.
Mudei meu rumo para o teatro aonde iria acontecer o show.


- Eu posso me sentar aqui? - o garoto com olhos verdes me encarou, encarou e encarou, mas não disse nada. - Bem, aceitarei isso como um não.

- Você é Lois Cruz?

Ergui minhas sobrancelhas, surpreso. Afinal, qual foi a última vez que isso aconteceu?

- Sim.

De repente, ele se levantou e tinha uma caneta em mãos.

- Pode me dar um autógrafo? - ergueu a manga da camiseta. - Eu não tenho um papel, então pode ser no meu braço.

- Relaxe, eu tenho um papel.

Ele abaixou a manga, envergonhado.

- Claro que tem, você é poeta.

Peguei meu caderno e minha própria caneta.

- Qual o seu nome?

- Larry.

Eu autografei o papel e em seguida, o entreguei.

- Cara, valeu - ele guardou o papel. - Vamos, pode se sentar do meu lado.

- Obrigado.

- Então, eu nunca imaginei que te encontraria em um show de balé.

- Nem eu - suspirei. - Estou tentando ter ideias para o meu novo livro.

- Legal.

De repente, todo o teatro ficou escuro e eu não consegui mais ver o rosto de Larry, meu fã.
Ajeitei-me na cadeira, pois eu sabia que o show iria começar.
As cortinas vermelhas se abriram, mostrando uma mulher que parecia ter em volta dos 30 e 40 anos. Todos aplaudiram e quando as palmas cessaram, ela levou o microfone à boca e começou a falar:

- Boa noite, eu sou a professora de balé de todos os dançarinos que entrarão agora nesse palco, e eu estou muito feliz que todos vocês estejam presentes. Muito obrigada mesmo. Vocês são incríveis. Agora, fiquem com o show!

Todos aplaudiram e alguns até chegaram a gritar.
As cortinas se fecharam mas em segundos elas se abriram de novo.
Eu admito, eu esperava por uma bailarina com um vestido rosa e bonito, mas me deparei com um dançarino, com um homem, e ele não usava um vestido rosa, mas seu figurino era bonito. Ele era bonito.
Uma música soou pelo palco, mas eu não a reconheci, era uma música melancólica, que combinava com as roupas pretas dele.
O garoto ergue-se do chão e foi aí que começou a dançar. Cada passo que ele dava, fazia meu coração pular, preenchendo meu peito com coisas estranhas e minha cabeça com versos que eu já estava esperando à muito tempo.

Todos os bailarinos fizeram um gesto de "obrigado" no palco, mas meus olhos estavam presos somente ao bailarino do começo.
As cortinas se fecharam e o show chegou ao fim. Todos aplaudiram, inclusive eu.

- Gostou, Lois?

- Você sabe quem é o dançarino que apareceu no começo?

- Ele se chama Ariel, somos amigos.

Abri meu caderno em uma página em branco e escrevi um tanto rápido.
Talvez seja a maior loucura da minha vida, dedicar meus versos à alguém, mas sabem todos aqueles artistas que faziam suas artes inspiradas nas suas donzelas? Donzelas que eles chamavam de "musas inspiradoras". Bem, parece que eu achei a minha musa, mesmo ela não sendo uma mulher. É um homem, e seu nome é Ariel.

- Pode entregar isso para ele?

- Claro.

- Obrigado, você me ajudou muito hoje.

- De nada.

Eu me levantei da cadeira e sai as pressas. Quando olhei para Larry de novo, ele estava abraçado à uma das bailarinas, que eu lembro muito bem que ela dançou uma dança com Ariel. Propus que aquela deveria ser a namorada de Larry, e por isso ele estava no show, porque ele não tem cara de quem curte balé.
Sai do teatro e voltei para minha casa, com a minha mente explodindo com ideias. Acho que meu próximo livro vai ser um sucesso. Obrigado, Ariel.

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